No país onde eu vivo, vivem comigo mais de um milhão de portugueses! A maioria, filhos e netos da emigração de 60, tinham uma ligação a Portugal que se cingia ao amor por um clube de futebol e aos dias dourados de Agosto. Cresci a vê-los chegar nos seus carros grandes, com a carteira cheia de francos, que na altura pesavam ouro, a instalarem-se em casas que ficavam fechadas o resto do ano e claro, a falar francês! Chamávamos-lhes “avecs” porque “avec” era a palavra que mais diziam e o facto de só falarem francês entre eles fazia com que as pessoas olhassem para eles como a classe “menor” que já não queria falar a língua mãe.
Moro em França há três anos e uma das coisas que aprendi é que ser português no estrangeiro pode ser difícil. À força de não haver pastéis de nata, vinho verde e couves, começamos a gostar mais de "eclairs", vinho rosé e alho francês. Com o tempo, começamos a trocar pequenas palavras: lixo passa a “poubelle”, guardanapo é “sopalin” e cartões são “cartas”! Dou por mim a não saber se uma palavra se escreve com dois “ss” ou com “ç”, e a perguntar como se diz em português determinada coisa.
Imaginemos isto há 50 anos… Num ambiente estranho, onde as noticias mal chegavam e se ia a casa uma vez por ano, falar francês começava a ser o mais natural, o mais fácil … Hoje é diferente, os emigrantes franceses chegam a casa, ligam a televisão num canal português, telefonam à mãe e lêem o jornal no computador. A comunidade portuguesa evoluiu, Portugal começa a deixar de ser só jogos de futebol e dias quentes, e iludidas pela nova proximidade ao país, as crianças já gostam e sabem falar português! Nunca até hoje tinha parado para pensar, no que seria a vida dos portugueses emigrados em outro país, poderia ela ser assim tão diferente da vida que temos aqui?
Li com tristeza uma notícia no semanário "Sol" que dizia que no Luxemburgo, com a aprovação da ministra luxemburguesa da família, castigam-se crianças portuguesas por falarem português entre elas na escola. Funcionários portugueses de escolas públicas não podem falar português entre eles, nem com as crianças. Punir uma criança por falar a sua língua é inconcebível e neste caso um enorme passo atrás em relação a todo o progresso que a comunidade emigrante vem fazendo ao longo dos anos.
Agora, ridiculamente, a proibição pode vir a ser o novo motivo pelo qual as crianças emigradas não falam português. Cerca de 16% da população que vive no Luxemburgo é portuguesa! Poderia erroneamente pensar-se que eles, sendo um número tão importante num país tão pequeno, tivessem mais facilidade em “ser portugueses” do que nós aqui, um milhão entre os milhões. Mas não! Sem conhecimento da minha parte de que outros países tenham também este tipo sanções, resta-me esperar que o Luxemburgo seja a “excepção à regra” e que no resto do mundo onde se fala português, medidas destas não tenham lugar. Caso contrário, infelizmente, temos ainda muito por que lutar!