André Pintado, o maior provador de cervejas português
Engenheiro informático de 31 anos já provou mais de 1300 cervejas artesanais e as críticas que fez sobre cada uma delas vão-lhe valendo o lugar de maior provador de cervejas português do Ratebeer, o principal site sobre cerveja artesanal do mundo
Já não se lembra da primeira cerveja artesanal que provou, mas a norte-americana que bebeu na Suécia terá sido certamente uma das inaugurais e aquela que mais o marcou. Foi em 2011, numa viagem de trabalho. Como sabia de antemão que ia para um país tradicionalmente cervejeiro, André Pintado procurou bares especializados e acabou num sítio com dezenas de torneiras e centenas de garrafas, onde a escolha ficava complicada para um leigo como (ainda) era.
Pediu sugestões ao barman, serviram-lhe aquela, sentiu de imediato as diferenças. “As cervejas comuns praticamente não têm aroma e aquela tinha um cheiro incrível a maracujá e ananás, apesar de não ter nenhum dos frutos”, recorda André Pintado. Descobriu depois que o aroma vinha de um dos ingredientes base da cerveja, o lúpulo, cujas centenas de variedades assumem uma panóplia de fragrâncias, desde frutadas, herbáceas ou madeiras. “Foi uma fantástica cerveja de transição para agarrar quem não estava habituado e conseguiu ter esse impacto.”
Três anos depois, o jovem lisboeta já provou mais de 1300 cervejas artesanais — o equivalente a mais de uma por dia — e as reviews que fez sobre cada uma delas vão-lhe valendo há mais de um ano o lugar de maior provador de cervejas português do Ratebeer, o principal site sobre cerveja artesanal do mundo.
Um hobby que leva muito a sério e que raramente termina placidamente numa esplanada enquanto saboreia o pôr do sol de copo na mão. “A prova implica estar com um computador à frente, a tomar notas e a ler sobre a cerveja, os ingredientes, os produtores, como é feita e onde”, enumera.
Já experimentou bebidas de muitos países (elege as belgas Westvleteren e as suecas Närke como as cervejeiras preferidas), vai a festivais nacionais e estrangeiros dedicados ao néctar maltado e troca frequentemente garrafas pelo correio. O Ratebeer permite ver o que cada pessoa tem na “despensa” e acordar transacções entre utilizadores.
“Nos últimos tempos enviei a um senhor alemão cervejas de Angola e Moçambique que consegui arranjar cá e, de repente, tinha mensagens de vários alemães a pedi-las”, conta. “Já troquei com cerca de 15 pessoas, num total de mais de 100 cervejas.” Só uma correu mal. “Com a viagem cedeu um bocado na carica, infectou e quando dei um golo sabia totalmente a vinagre, quase me fez vomitar e nem com muita água o sabor desapareceu”, recorda o engenheiro informático de 31 anos.
André sempre se interessou “por sabores e experiências gastronómicas” e, por isso, a paixão pela cerveja artesanal “surgiu naturalmente”. Hoje, ainda é a “multitude de paladares e experiências” que o surpreende. “Nos Estados Unidos, por exemplo, houve quem chegasse a utilizar a levedura que estava na barba de um dos cervejeiros [para produzir a bebida] e também há pessoas que tomam banho na cerveja antes de a ferver... acho que tudo isso faz mexer este mundo e automaticamente me faz ter interesse em experimentar essas coisas estranhas”, defende.
Cerveja com algas? Sim, existe
Nunca provou a “cerveja de barba”, mas já bebeu uma “espanhola que era totalmente opaca e branca, parecia leite, mas sabia a uma cerveja bastante normal, feita com morangos”; provou uma com yuzu (citrino japonês) que era “frutada e ao mesmo tempo salgada, com sabor a coentros e a trigo”; uma russa kvass, que encontrou numa loja ucraniana em Lisboa e que “sabia a pão e manteiga, muito oleosa”; e uma escocesa feita de algas e com sabor a mar. Acredita que no seio destes paladares inusitados se encontram pistas sobre a história e a cultura de cada povo, tal como na culinária, seja a utilização de métodos centenários obsoletos ao olhar do século XXI ou de ingredientes locais. “O que é que leva alguém a fazer cerveja com algas? Só pode ser a experiência e vivência do povo dessa zona”, exemplifica.
Na primeira vez que experimentou produzir cerveja em casa, há dois anos, não utilizou propriamente produtos portugueses mas uma especiaria muito usada na doçaria, a canela. “Ficou longe de 90% das cervejas artesanais comercializadas em Portugal, mas surpreendeu pela positiva, nunca pensei que fosse tão fácil fazer algo bem longe de ser perfeito mas não intragável”, conta.
As constantes experiências na cozinha e o tempo que gasta em provas, pesquisas e viagens levam-no a sonhar chamar profissão à cerveja artesanal, seja “como provador ou fabricante”. “Já me passou pela cabeça e é algo que continua a passar, ainda não descartei totalmente.”