A invenção de Tatiana pode revolucionar os carros eléctricos
Novo condensador tem impacto no preço dos carros eléctricos (mas não só). Cientista portuguesa, que trabalha no Laboratório Nacional de Física Britânico, criou ainda uma organização que promove ciência em Inglaterra, a Native Scientist
O trabalho desenvolvido por uma jovem cientista portuguesa a viver em Londres pode vir a revolucionar o mercado dos carros eléctricos e híbridos. Tatiana Correia trabalha no Laboratório Nacional de Física (NPL) do Reino Unido, onde a equipa que lidera inventou um condensador que terá implicações no peso, na autonomia, na longevidade e no preço deste tipo de veículos. Tatiana foi a primeira portuguesa a ingressar nesta instituição.
Há sete anos a viver em Inglaterra, esta doutorada em Física de 31 anos criou o condensador HITECA, a partir de um material capaz de resistir a temperaturas muito mais elevadas do que o normal. Actualmente, estes elementos — responsáveis pelo arrefecimento do sistema eléctrico dos carros — “não toleram temperaturas superiores a 70 ou 100 graus Celsius”, explica Tatiana, em entrevista ao P3 via Skype. Quando as temperaturas ultrapassam estes valores, os condensadores “começam a secar e perdem a sua longevidade”, pelo que precisam de ser trocados. “A nossa missão é substituir esses condensadores, à base de electrólitos, por este que eu inventei, à base de cerâmicos”, resume. “Os carros têm sistemas complexos de arrefecimento à volta do sistema eléctrico, o que adiciona peso e custos ao carro (...) Porque tem mais peso, o carro vai durar menos quilómetros.”
As implicações da invenção de Tatiana, natural de Bragança, são “várias e em vários sectores”, como “energias renováveis, indústria de petróleo e aero-espacial” — “basicamente, onde existe electrónica que trabalha a temperaturas superiores a 100 graus Celsius”. Tatiana está, agora, a trabalhar na “parte da aplicação e exploração comercial” da invenção — que foi patenteada em 2012 e que ainda não tem data para chegar ao mercado —, ao mesmo tempo que regressa a materiais com os quais trabalhou durante o doutoramento para o desenvolvimento do “primeiro protótipo refrigerador com materiais electro-calóricos”. À partida, diz, terão uma maior eficiência, além de não possuírem “nenhum elemento tóxico”. “Tudo parece indicar que é uma óptima tecnologia, mas agora é preciso confirmar se isto se vai concretizar ou não.”
Native Scientist
Tatiana, que dava explicações a crianças da comunidade portuguesa em Londres depois do trabalho, apercebeu-se que muitas delas “não têm acompanhamento porque os pais trabalham muito, alguns não falam a língua e não conseguem ir à escola e acompanhar o desenvolvimento dos filhos”. Em 2012, durante uma conferência promovida pela associação de investigadores portugueses no Reino Unido, a PARSUK, a jovem conheceu Joana Moscoso, com quem fundou a Native Scientist.
Esta organização sem fins lucrativos, criada graças a um concurso de financiamento para empresas sociais promovido pelo Imperial College de Londres, tem como missão “promover a ciência e as raízes e culturas a partir da língua materna”, explica Tatiana. As duas investigadores reúnem cientistas voluntários, que se deslocam às aulas de língua portuguesa do Instituto Camões para uma espécie de “speed dating” com os alunos, numa média de uma visita por mês. O sucesso destas iniciativas junto da comunidade portuguesa fez com que o modelo fosse, também, aplicado a outras comunidades, como a espanhola.
“Estas crianças têm um conflito de identidade (...), o que leva a problemas sociais e baixa auto-estima, traduzidos num pior desenvolvimento académico. Queremos levar ‘role models’ aos estudantes, na mesma língua, com as mesmas raízes”, sublinha Tatiana, para quem alargar o alcance da Native Scientist a mais comunidades — francesa, polaca, chinesa — é um objectivo.
Em Inglaterra, reflecte a cientista, os profissionais são estimulados para desenvolverem outros projectos, nomeadamente de cariz social. “As pessoas têm o tempo e o suporte, inclusive financeiro, para criar estes projectos. Há até uma abertura das próprias instituições e universidades, no sentido de aceitar e apoiar os funcionários”, explica. Muito diferente do que acontece em Portugal, onde o contrato de bolseiro, por exemplo, “exige exclusividade e não permite e outra actividade profissional”.