Siza Vieira: a culpa é sua

Por este mundo fora a arquitectura portuguesa é Siza, o Porto é Siza e o Siza é a nossa casa

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Jonatas Luzia

Há uns tempos li um artigo sobre a eventual demolição do Pavilhão de Portugal em que o seu arquitecto, questionado sobre o assunto, dizia que a solução mais lógica seria demoli-lo para “poupar trabalho ao tempo”, e que talvez a culpa fosse sua.

Ora o arquitecto em causa é Álvaro Siza Vieira que, apesar de todas as distinções e louvores, ou talvez por isso mesmo, continua a merecer por parte de todos nós, um obrigado; hoje ouso acrescentar algo mais: a culpa é sua.

A culpa é sua, foi a minha e suponho de muitos, primeira paixão.

Começou pelas piscinas das Marés, passou pela casa de chá da Boa Nova, foi-se encaminhando para a Lapa, Serralves e nunca mais parou. Essa paixão pelo belo foi-se transformando em amor à medida que entendia a mestria com que trabalha. Os seus edifícios não são espaços belos para a fotografia e desprovidos de gente, são espaços que ficam impressos na alma.

A culpa é toda sua, por tantos de nós não nos sentirmos desamparados cá fora, longe de tudo e de todos. Por este mundo fora a arquitectura portuguesa é Siza, o Porto é Siza e o Siza é a nossa casa. Qualquer gabinete que se preze tem um Siza na estante e mais tarde ou mais cedo, acaba por nos vir parar a mesa e vai ficando. Fica porque nos dias sombrios faz falta o branco das suas paredes, fica porque depois de horas a fio ao computador sentimos falta dos esquissos e da simplicidade dos seus desenhos. Fica porque tê-lo ao lado é como ter um amigo, um amparo de lembranças, um motivo de orgulho e de esperança.

Estas são as culpas que lhe posso atribuir, agora o mau estado das suas obras, eventuais demolições isso são frutos de outros ventos, os mesmos que por ventura levaram tantos arquitectos para fora do país. Ventos que nos tornam frágeis, menos creditados e com caminhos ainda mais árduos de trilhar.

Dia após dia crescem as tempestades de tristeza de um povo que não sabe para onde caminha. Vandalizam-se obras icónicas, vende-se ao desbarato a cultura e a memória da nação, sacode-se para amanhã a urgência do hoje. Oscar Wilde bem podia ter pensado nos portugueses quando escreveu esta frase: "As pessoas hoje conhecem o preço de tudo e o valor de nada."

Por isso espero que agora mais que nunca, continue a ser culpado por dar valor à arquitectura, por ser o nosso cartão de visita, para quando repetirem a tal pergunta — “De onde vem tanta inspiração?” — eu possa continuar a sorrir por dentro e dizer: “ Vem da terra, onde há espaços humanizados e cheios de luz.”

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