Um estágio em Portugal, e no mundo com Álvaro Siza

Tudo é desenhado até ao mais pequeno pormenor. — Quem disse "God is in the details"?! — murmura Siza tantas vezes

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Adriano Miranda

Mudei-me para o Porto.

No dia 1 de Outubro — o meu primeiro dia de trabalho — enquanto caminhava para o escritório, sentia uma euforia tímida e silenciosa e continuava a achar que tudo aquilo não passava de um sonho. Senti o mesmo todos os dias durante os primeiros meses.

Cheguei.

— Bem-vinda — diz Siza.

Nessa altura trabalhavam ali cerca de trinta pessoas, num ambiente estimulante e simpático, num espaço magnífico com uma vista deslumbrante sobre o Rio Douro e a Ponte da Arrábida. Foi-me então dado a conhecer o trabalho que me viria a ocupar durante os três anos seguintes. Integrado no conjunto de projectos a desenvolver, no âmbito da recuperação dos Parques de Vidago e Pedras Salgadas, o Vidago Palace Hotel constituía-se como o edifício mais emblemático. Foi-me incumbida a tarefa de apoiar na recuperação deste Hotel e sua ampliação em dois edifícios: as Cozinhas e o Spa.

A obra iniciara. Estava pela primeira vez perante um projecto de execução daquelas dimensões. Tudo tinha regras. E por indefinição, o que não tinha, viria a ter. Nos primeiros tempos elaborei várias maquetes a todas as escalas, que permitiam a Siza estudar partes do projecto.

— A seguir há-de vir qualquer coisa mais interessante — dizia Siza.

Passei depois para a produção de desenhos de execução. Senti-me completamente perdida. Eram demasiadas camadas abaixo da de acabamento.

Recordo que, numa dessas vezes elaborei a seu pedido, uma maquete à escala 1/2, da parte superior de um caixilho exterior de correr/fixo, de forma a facilitar a resolução dos problemas que apresentava. Tinha aí as respostas a alguns porquês. Tudo é desenhado até ao mais pequeno pormenor. As regras nascem de princípios estéticos e/ou de pressupostos inerentes à boa construção.

— Quem disse "God is in the details"?! — murmura Siza tantas vezes.

Trata-se claramente de uma obsessão. E é contagiante.

Chegou finalmente o dia em que ia à obra. E com Siza. Bem disposto, de caneta ou lápis numa mão e cigarro na outra, Siza pedia desenhos específicos. Pensativo, tranquilo e simultaneamente entusiasmado, ia caminhando e ditando os princípios, que iriam originar futuras alterações e ajustes ao projecto. Eu registava e fotografava. 

No regresso ao Porto dormiu, cantou como sempre canta quando está feliz, fumou.

Boa noite e obrigada pela aula.

Foram longos os meses de trabalho.

Era gratificante ver a obra crescer a cada visita.

Senti a estranheza do que é, pela primeira vez, ver construído algo em que trabalhamos. 

Quase a terminar o dia trabalho, dirijo-me a Siza.

— Siza, o meu estágio termina daqui um mês. Queria perguntar-lhe se posso continuar...

— Se puderes continuar, eu gostava que continuasses — responde tranquilamente.

Voltei a sentar-me, e continuei a trabalhar ainda mais motivada. Actualmente, continuo a colaborar com Siza e a aprender todos os dias.

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