Políticos: prematuros e cesarianos

A propósito da licenciatura de Miguel Relvas: o verdadeiro problema é acharmos que um político tem de ter um título. E não compreendermos que o que mais lhe devíamos exigir não é disciplina optativa em nenhuma universidade: ética

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Daniel Rocha

O debate em torno do currículo de Miguel Relvas é a solução mais confortável para a irmandade que profissionalizou o exercício de cargos de representação. Assim como está — descentrado —, evita que questionemos dois aspectos fundacionais. Quem são estas figuras políticas das quais frequentemente se levantam dúvidas sobre o passado? Qual é a estrutura que permite tantas rotas duvidosas?

Não me preocupa o curso de Relvas, que é com todo o folclore debatido. Preocupa-me mais a sua política, porque esta tem mais influência na vida dos portugueses. O verdadeiro problema é acharmos que um político tem de ter um título e não compreendermos que o que mais lhe devíamos exigir não é disciplina optativa em nenhuma universidade: ética.

"Profissão: Politico" é o desígnio de uma nova tribo de gestação pós-25 de Abril que só agora começa a atingir posições de visibilidade e publicidade e que nunca compreendeu a ideia de transitoriedade implícita no seu desempenho, fazem da política um modo de vida e nunca conheceram outro, ascendem pelos órgãos locais e nacionais das juventudes partidárias e são desprovidos de qualquer pensamento crítico ou base ideológica real. São liberais, conservadores, socialistas, neo-realistas, surrealistas: surreais.

Esta classe — é assim que gosta de ser chamada — é salivante e descontrolada pela conquista de cargos e posições de poder, "custe o que custar’", constrói sobre si uma imagem irreal de responsabilidade e maturidade quando, na verdade, teve uma gestação precocemente interrompida pela irremediável ganância. Uma cadeira para sentar, dinheiro, poder e pouco mais são as suas aspirações.

Portugal vinculou, há muito, o seu ensino superior à ideia sebastianista de qualidade de vida autónoma e integração social. O problema reside no facto de um grau académico ser, ainda, a única via de legitimação da vida pública. A tribo também o acha, mas, para além da universidade pública ainda não ser conhecida pelo comércio de diplomas, o tempo que se perde com o estudo durante uns anos é incompatível com a ininterrupta ascensão na hierarquia da estrutura de dominação.

Mas se grande parte do Ensino Superior Particular e Cooperativo não servia rigorosamente para nada — sendo que não alarga a oferta curricular, que o país não necessita de um número de vagas tão absurdamente elevado, que a formação nessas instituições é tendencialmente pior — passou agora a desempenhar uma função: a de garantir um currículo académico e um título profissional à tribo salivante e obcecada por construir uma imagem adulterada sobre si própria.

As pessoas têm de os aprovar e ninguém os aprovará como operários, acham eles. As instituições corrompidas que se prostituem para este efeito ficam com a sua imagem destroçada e perdem as migalhas de credibilidade que religiosamente ainda podiam guardar, conseguem surpreender com tamanha indecência e descaramento.

Mas não há problema, porque nem credibilidade nem qualidade científica foram algum dia o seu negócio. Negócio esse que é suportado pelos olhos vendados dos que não compreendem que a quantidade de vagas no Ensino Superior Particular e Cooperativo é uma garantia de colapso do emprego jovem, que são os mesmo olhos vendados que há uns anos foram buscar, em apressadas passagens, um diploma. Sempre os mesmos.

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