“O Defunto Protesta” (“Here Comes Mr. Jordan”), de Alexander Hall (1954)

James Gleason e Edward Everett Horton são as verdadeiras estrelas desta comédia que pode ajudar a definir o género, desfazendo equívocos de que são aquelas coisas americanas que nos servem hoje em dia, românticas ou não

Poster do filme “Here Comes Mr. Jordan”DR
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Here Comes Mr. Jordan
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Here Comes Mr. Jordan

Evoquemos o não muito longínquo “Quando a Cidade Dorme” (“The Asphalt Jungle”) para estabelecermos uma comparação simples com o filme de hoje: também este vive do que lhe dão alguns dos mais famosos “actores secundários” ou, na actual versão corrigida da designação dada pela Academia das Artes e Ciências do Cinema de Hollywood, actores em papéis de apoio (aos actores principais, supõe-se).

Claude Rains (“Casablanca”) é a terceira figura deste elenco, mas é ele o Mr. Jordan do título original, que infelizmente se perdeu na versão portuguesa. As duas primeiras são Robert Montgomery e Evelyn Keyes. Claude Rains foi, entre outros, o Capitão Louis Renault, com quem Rick (Humphrey Bogart) estabelece o famoso “início de uma bela amizade” na cena final de “Casablanca”, de Michael Curtiz; o senador Paine com quem um muito jovem e magro James Stewart tem de se confrontar em “Peço a Palavra”, de Frank Capra; o Mr. Skeffington — que também caiu no título português — que é “fisgado” por Bette Davis; o Alexander Sebastian do “Difamação”, de Alfred Hitchcock, que na semana passada vimos, com um sério concorrente à lista dos mais assustadores penteados fotografados em movimento para o grande ecrã.

Mas quem se lembra de Robert Montgomery ou de Evelyn Keyes? Bem, quanto a Robert Montgomery não há muito que eu possa fazer, por muito que quisesse e não digo que queira, mas, quanto a Evelyn Keyes, devo alertar os mais distraídos para o facto de ter sido a mulher de Tom Ewell em “O Pecado Mora ao Lado” e isso bastaria para lhe garantir um lugar imortal no panteão internacional dos cinéfilos, já existem tais coisas como “filmes sagrados” (nós aqui chamamos-lhes “filmes sem idade”, para maior objectividade). “O Pecado Mora ao Lado” é um deles. “O Defunto Protesta”, apesar do título em português e de muita gente não saber que o é (para isso é que nós aqui estamos), é outro. Quem tiver dúvidas que veja a cena, a poucos minutos do início, em que o pugilista Joe Pendleton (sim, é o Robert Montgomery, mas calma...), acompanhado de um notabilíssimo Edward Everett Horton (não conhecem? E dizem-se cinéfilos?...), se encontra com o lendário Mr. Jordan. Vejam a névoa a ser afastada pelos passos dos dois, vejam o enquadramento do avião (pilotado por um novíssimo Lloyd Bridges) e das três figuras humanas. Vejam a iluminação, vejam os cenários, vejam a elegância e a sofisticação daquilo tudo, até do penteado de Claude Rains...

E depois vejam o filme desenrolar-se num tom mais popular, mas nunca vulgar, guiado por outro actor conhecido, mas de que ninguém sabe o nome (James Gleason), no brilhante papel de Max Corkle, o agente do pugilista Joe Pendleton, que lhe rendeu a sua única nomeação para o Óscar. James Gleason e Edward Everett Horton são as verdadeiras estrelas desta comédia que pode ajudar a definir o género, desfazendo equívocos de que são aquelas coisas americanas que nos servem hoje em dia, românticas ou não.

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Os dois apareceram em “O Mundo É um Manicómio” (que é como quem diz “Arsenic and Old Lace”), de Frank Capra, e apareceram muito bem, fazendo o que sabiam fazer. Edward Everett Horton, além de uma habilidade em aparecer em tudo o que é comédia dos anos 40, é a matriz das expressões e maneirismos que celebrizaram o robot C3-PO de “Guerra das Estrelas” e partes correlativas (Ninguém sabe disto. Trata-se de uma revelação que não lerão em parte alguma, incluindo Wikipedia e WikiLeaks. É o chamado exclusivo mundial). Por estas e por outras é que vale a pena ver estas obras e ler estas crónicas. 

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