“O Destino Bate à Porta” (“The Postman Always Rings Twice”), de Tay Garnett (1946)
“Filme negro digno de figurar em listas dos melhores filmes do género e frequentemente figurando, deve essa reputação ao argumento, à direcção dos actores, ao seu desempenho, mas também a uma estética apurada”
Voltemos a James M. Cain. Eram dele os romances policiais “Mildred Pierce” e “Double Indemnity, que Michael Curtiz e Billy Wilder, respectivamente, transformaram em famosos filmes negros com os títulos, em Portugal, de “Alma em Suplício” (1945) e “Pagos a Dobrar” (1944), ambos abordados em anteriores crónicas. Do mesmo autor era também “The Postman Always Rings Twice”, que, após tratamento de Harry Ruskin e Niven Busch, serviu de argumento a “O Destino Bate à Porta”, longa-metragem realizada por Tay Garnett e estreada em 1946, de que nos ocuparemos hoje.
Filme negro digno de figurar em listas dos melhores filmes do género e frequentemente figurando, deve essa reputação ao argumento, à direcção dos actores, ao seu desempenho, mas também a uma estética apurada, em que intervieram o director de fotografia Sidney Wagner e os directores artísticos Randall Duell e Cedric Gibbons. Tay Garnett, um nome pouco conhecido mesmo entre apreciadores de filmes clássicos, é o responsável pela fusão de todos esses saberes e pela gestão de uma tensão crescente cuja competência lhe garante aqui o seu melhor trabalho.
Relativamente a “Pagos a Dobrar”, notemos uma semelhança e uma diferença: a semelhança está no argumento, na ideia da sedução feminina como telecomando da acção masculina tendo em vista o cometimento de um crime, e não de um crime qualquer. A diferença está no facto de a plausibilidade de se atingir um tal grau de convencimento ter sido entregue, em “Pagos a Dobrar”, a Barbara Stanwick e, em “O Destino Bate à Porta”, a Lana Turner.
Dando cuidadosamente o seu a seu dono, não será inevitável pender para a plausibilidade de Lana Turner?... É uma dúvida que, por certo, os leitores poderão dissipar por si próprios, querendo. Pode ajudar ver também “Cass Timberlane”, de George Sidney, “A Life of Her Own, de George Cukor, “The Bad and the Beautiful”, de Vincente Minnelli, ou “Peyton Place”, de Mark Robson.
O actor que com ela contracena em “O Destino Bate à Porta” é John Garfield, de quem imediatamente recordamos “Body and Soul”, de Robert Rossen, “Gentleman’s Agreement”, de Elia Kazan, e “Force of Evil”, de Abraham Polonsky, como demonstrativos das suas qualidades de representação, numa carreira tragicamente encurtada pela sua morte aos 39 anos.
No papel de astuto e frio advogado de defesa, merece menção Hume Cronyn, que, além de ter participado em “Shadow of a Doubt” e “Lifeboat”, de Alfred Hitchcock (para quem também adaptou as peças de teatro que estiveram na origem de The Rope” e “Under Capricorn”), foi nomeado para o Óscar de melhor actor secundário pela sua interpretação em “A Sétima Cruz”, de Fred Zinneman, de 1944.