Com 33 anos, Susana Abreu Ribeiro saiu de Portugal em 2006. Passou por Edimburgo e seguiu-se São Francisco, nos Estados Unidos, onde está a fazer um pós-doutoramento em biologia celular. “Saí daqui com a sensação de voltar e agora mudou. Não está fora de questão, mas está cada vez mais distante.” A verdade é que não acredita que vá encontrar uma “situação estável em nenhum lado”, mas também aprendeu a “ter flexibilidade”. “Daqui a alguns anos não sei como estará a minha vida.” E depois?
Chegou há menos de 72 horas a Guimarães para passar o Natal. Já percebeu que “todas as conversas vão dar à crise”, que “todas as pessoas estão muito cinzentas”. Confessa que apoia os amigos a partirem. Aliás, na bagagem trouxe duas garrafas de vinho californiano para uma amiga que trabalha no sector em Portugal. É um presente, mas também um estímulo.
“Eu sempre incentivei as pessoas a sair. Não quer dizer que não se volte. Acho que se houver gente a sair e a experimentar coisas lá fora, talvez tragam coisas novas para o país.” Não é nada fácil partir, admite, mas é uma “experiência”. Para o Natal, Susana regressa com a “vontade de mostrar às pessoas uma mensagem positiva”. Tenta “abanar” os amigos: “Fico muito triste quando vejo os meus amigos encostados a um canto, cinzentos, acomodados a viver. Os americanos vêem a vida de uma forma diferente da nossa.”
Depois de dois anos a trabalhar em Washington, Zélia Ferreira, estudante de doutoramento na área de biodiversidade, genética e evolução, concorda. “Os portugueses queixam-se muito mais. Nos EUA toda a gente sente a crise, mas não reagem assim. Eles pensam ‘o que é que eu posso fazer para estar melhor?’ e fazem.”
Redescobrir o Porto
Zélia chegou em Julho a pensar que iria voltar ao NHGRI pouco tempo depois, o que acabou por não acontecer. O laboratório onde estava dissolveu-se e assim regressou mais cedo ao Ipatimup, instituto com que partilha o projecto. Não se despediu dos amigos que acumulou durante dois anos, nem da comida instantânea tailandesa. Cá, o primeiro mês foi difícil, mas hoje sente-se bem em Portugal. “Agora já não me sinto preparada para voltar para os Estados Unidos.”
Descobriu uma qualidade de vida no Porto de que antes não se apercebia. “Consigo andar para todo o lado. Não tenho de conduzir 5 horas para ir à praia.”
Concorreu a uma bolsa mista porque sempre fora um “sonho” sair de Portugal. Queria “expandir horizontes e conhecimentos” e a “grande investigação” está nos EUA. Confessa que os primeiros tempos de emigração foram difíceis. “Vi-me a fazer algo que nunca tinha precisado de fazer: ir para a ‘net’ fazer amigos.” Sentiu a crise lá e voltou a encontrá-la cá, mas, diz, “nos EUA há sempre dinheiro para a Ciência”.
Sente que não é justo ouvir “de quem governa o país” que a emigração é uma possibilidade - “é mau, estão a tirar toda a esperança para quem procura trabalho cá” – mas acredita que “abrir os horizontes nunca fez mal a ninguém”. Foi o conselho que deu à irmã que agora vai para os EUA fazer um estágio em fotografia.
Aos 27 anos, não sabe onde estará a dois anos. Procura uma vida estável, mas aprendeu a “viver o dia-a-dia”, tal como Ana Rita Alves, arquitecta, com uma viagem marcada para 7 de Janeiro. Destino? México. “Não há um grande plano para a vida. É mais uma coisa que vai acontecer, que pode correr bem ou mal.”
“Somos cidadãos do mundo”
Com 29 anos, Ana Rita trabalhou durante quatro anos no gabinete de Souto Moura. Foi uma “grande oportunidade” que terminou em Outubro de 2010. Desde aí, viveu como “freelancer”, DJ, multiplicou-se em contactos para encontrar um novo emprego.
Tentou no Porto e Lisboa, mas também em Londres e Paris. Em Nova Iorque, foi a 11 entrevistas de trabalho e foi dessa jornada que surgiu esta proposta, por parte de um arquitecto que tem um outro escritório no México. Foi a primeira resposta positiva que teve.
Aceitou, pensando que iria atravessar o Atlântico sozinha, mas, graceja, “as pessoas devem estar mesmo com vontade de sair de Portugal”. Parte agora acompanhada por duas pessoas: uma vai trabalhar para o mesmo gabinete de arquitectura, outra é uma amiga, maquilhadora, que, aproveitando a boleia, vai tentar a sua sorte.
Não se vê como uma inspiração, mas admite que a amiga referiu a sua “força de vontade” e “despreocupação” como uma referência. Há também uma vontade muito grande de partir. “Quando digo que vou sair do país, 90% das pessoas dizem que também querem ir.”
Está a pensar levar os seus discos para continuar a passar música. Quer continuar a fazer o que lhe dá “prazer”, afinal “não é só um emprego”, é uma "experiência". Parte, mas não de costas voltadas para Portugal. “Não é uma desistência. Se calhar volto ainda com mais bagagem para criar coisas com outras pessoas. Isto é importante. Temos de trabalhar em conjunto porque não vão existir mais ‘Sizas’ ou ‘Souto Mouras’. Se calhar é mais chato estar aqui por um ano numa situação instável do que partir e voltar com ânimo! É um cliché, mas hoje somos cidadãos do mundo.”