A cor de Inverno, no segundo dia

No segundo dia de desfiles da ModaLisboa apresentaram criadores como Valentim Quaresma, Luís Carvalho e Nuno Gama.

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Sábado começou na Estufa Fria, mais concretamente, na sala da Estufa Quente, com a Awaytomars. Lançada em 2015, a marca funciona em regime de co-criação como uma comunidade de alguns milhares de criativos. A cada estação recebem ideias de 700 a mil pessoas, conta o fundador Alfredo Orobio. Nas últimas temporadas, têm apresentado em formatos alternativos, mas, desta vez, a marca lançou as modelos pelos caminhos da estufa, com uma colecção pautada pelas silhuetas longas, algumas com os padrões mais abstractos, típicos da marca, outras com metalizados. “Uma colecção orgânica”, resume Orobio. O cenário rodeado de plantas com um lago no centro, casava, assim, na perfeição.

Nos pés, os modelos levavam calçadas uma das novidades da marca, a colaboração com a marca brasileira Melissa. Das 3000 ideias submetidas, resultaram três modelos de sapatos: umas socas, umas sandálias com tiras cruzadas e uns slides. Vão estar à venda nas várias lojas Melissa e, indica Alfredo Orobia, esperam vender cerca de 300 mil pares. Mas esta nem é a única colaboração que têm em calha com uma marca de peso. A Awaytomars está também trabalhar com a Missoni — num projecto para já secreto, que deverá ser anunciado em Setembro —, e com os cereais Kellogg's. “São marcas grandes que conseguem dar suporte e visibilidade”, comenta Orobio.

A marca Imauve  (de Inês de Oliveira) e o criador Gonçalo Peixoto — que entra pela primeira vez na ModaLisboa — partilharam a passerelle e mantiveram a tónica colorida do dia.  No caso da primeira, foram “os 27 graus de temperatura média da cidade de Cartagena de Índias, na Colômbia” e a “vivacidade das fachadas e balaustradas” que deram o mote para a colecção. Mudada a música, o termómetro virou imediatamente para os graus negativos e Gonçalo Peixoto transportou o público para as paisagens gélidas onde ocorrem as auroras boreais. Apesar de nunca ter observado o fenómeno natural, o designer foi buscar inspiração a esse imaginário e às pessoas que percorrem quilómetros para conseguir um vislumbre das luzes do Norte. Resultado: uma colecção “sporty-chic contemporânea”, com casacos superprotectores, contrabalançados pelos vestidos e calças de malha mais finos, com os tons da aurora boreal.

Inspiração na década de 1970

A colecção de Patrick de Pádua foi mais uma viagem no tempo, para trás. Nesta estação, o criador de menswear — que abriu recentemente a sua primeira loja, em Lisboa — decidiu incluir oito coordenados femininos. “Surgiu, não tem nenhuma razão”, esclarece o criador, cuja primeira colecção foi vendida toda a mulheres, contou há meses à Culto. A colecção foi buscar referências aos anos 1970. Neste caso, num sentido prático, já que o criador correu várias fábricas em busca de tecidos mais antigos.  No geral uma colecção com tons mais sombrios — típicos da marca—, as peças ganhavam vida com os toques de cor-de-laranja que pautavam alguns dos coordenados. Da mesma forma, os materiais mais clássicos, como a fazenda, misturavam-se com neoprenos e pêlos.

Valentim Quaresma foi buscar inspiração a um poema de Gilda Nunes Barata e apresentou uma colecção em tons sóbrios, com algum azul e cobre à mistura. Destacaram-se algumas peças em brocados, e, claro, os extravagantes acessórios pelos quais já é conhecido, de materiais como o cobre, latão oxidado e pedras.

Para terminar o dia, o Pavilhão Carlos Lopes recebeu os designers Ricardo Preto, Luis Carvalho e Nuno Gama. O primeiro inspirou-se numa “mulher forte , decidida e simultaneamente romântica” para a criação as suas propostas para o próximo Outono/Inverno. Escolheu cores como o azul, vermelho e verde para desenhar silhuetas clássicas, formas “extremamente geométricas” e reinventadas. Há 12 anos a desfilar pela ModaLisboa, mantém o mesmo objectivo: “Criar peças sofisticadas, mas simultaneamente descontraídas”, neste caso, através da utilização de sedas e caxemiras.

“O facto de ter estendido o meu trabalho ao mercado asiático, há cerca de dois anos, também me fez inspirar nas novas clientes. Apesar de a mulher ter as mesmas medidas e do mundo se ter aproximado com a globalização, acabo por ver pessoas novas todos os dias e aumentei o meu volume de vendas para 14 toneladas”, declara Ricardo Preto ao PÚBLICO, acrescentando que a Ásia é rica em tecidos e materiais para a indústria da moda.

Caretos na passerelle

Já Luís Carvalho criou uma nova pele para homem e mulher e chamou-lhe “under your skin", inspirada nas fachadas dos prédios das grandes cidades, cujas texturas que “lembram as peles dos animais”. Foram os anos 1960 que definiram a silhueta reta, longa e oversized desta colecção onde foi trabalhada, sobretudo, a “sobreposição de peças, vestidos em linha A e micro-vestidos”. Esta década, bem como as texturas das peles de animais, também  ajudaram o designer a escolher os materiais e tecidos como o jacquard, a pele e pêlo sintéticos, o vinil, o tule e o veludo.

Na sua décima participação consecutiva na ModaLisboa, o “preto, o azul eléctrico, os roxos, o vermelho e o dourado” de  “under your skin" distinguiram-se das cores neutras da colecção anterior. “Eu acho sempre que a minha última colecção é a mais especial, porque é sempre uma melhoria de tudo o que temos vindo a fazer ao longo destes anos”, explica o designer ao PÚBLICO.

Para comemorar os 25 anos da marca e a sua 42.ª participação na Moda Lisboa, Nuno Gama fez uma retrospectiva de todas as suas colecções desde 1987/88. Para o Outono/Inverno 2018/2019, o designer apresenta também a mistura de detalhes contemporâneos que se adaptam “ao guarda-roupa de um homem sofisticado, elegante, urbano e internacional”. Inspirado por uma playlist de Jóhann Jóhannsson, Nuno Gama encontrou “o desejado” poucos dias antes de lançar a colecção de Primavera/Verão 2017/2018.

“A escolha do preto e do azul devem-se ao facto de olhar para o corvo como elemento nacional”, revela. Já os apontamentos coloridos ficaram à responsabilidade de artesões de Miranda do Douro, tal como a reinterpretação da capa de honras transmontana. “Foi engraçado descobrir que outras peças que já desenhei, em colecções anteriores, também se identificavam com a cultura mirandesa. Na minha primeira colecção, por exemplo, havia camisas com as golas recortadas que eu readaptei porque se enquadravam por completo nesta colecção”.

Segundo o designer, esta colecção apresenta “muitos elementos que se contrapõe”, por exemplo, silhuetas com grande volume com outras com ausência de volume, ou silhuetas longas e silhuetas curtas, bem como a desconstrução do vestuário – “formal através do informal e do casual através do sportswear”. Dos tecidos, destaca a caxemira e, das peças, um blazer com capuz e com um apontamento em forma de bacalhau.

“O título “o desejado” acaba por ser uma crítica à inacção de muitas pessoas, com capacidades, que não aproveitam o nosso país, os apoios e a nossa cultura”, explica, acrescentando que “Portugal nunca teve tanta visibilidade” como actualmente. “Aproveito sempre as minhas colecções para espalhar a tradição e cultura portuguesa”, lembra.

Além do alvorecer transmontano, houve ainda espaço para os caretos que invadiram a passerelle no início e no final do desfile, ao som de Homem do Leme, Xutos & Pontapés.

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