Edward Garry foi libertado depois de estar 22 anos preso por um crime que não cometeu

O novo veredicto foi conseguido com o testemunho de um dos homens que o tinha detido inicialmente, apontando falhas no processo que considerou culpado este norte-americano de ascendência porto-riquenha. “Perdi a minha vida por uma coisa com a qual nada tive a ver”, lamenta Garry.

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Há duas décadas que Edward Garry era considerado culpado de ter alvejado um antigo polícia de Nova Iorque Shannon Stapleton/REUTERS

Edward Garry passou a maior parte da sua vida adulta na prisão: foi detido quando tinha 20 anos, acusado do homicídio de um antigo detective da polícia, em Nova Iorque, corria o ano de 1995. Nesta segunda-feira, mais de 20 anos depois, o júri do tribunal do Bronx, em Nova Iorque, declarou que Edward Garry estava inocente. A história foi contada pela revista New Yorker, que foi acompanhando o caso.

“Ainda parece um sonho”, disse Garry à revista norte-americana. No final do novo veredicto – que corrigiu, após cinco pedidos formais para reverter a sentença, o erro judicial que lhe custou mais de 20 anos de liberdade – um dos jurados correu para o homem a chorar e pediu-lhe desculpa, contou um dos advogados do acusado. 

O detective Peter Forcelli foi um dos agentes que prendeu Edward Garry e reconheceu o seu erro, tendo sido agora uma das testemunhas de defesa do acusado. Garry tinha 20 anos quando foi declarado culpado do crime que, afinal, não cometera; na próxima semana, faz 43 anos. E só há um ano, altura em que um juiz ordenou que houvesse novo julgamento para debater o caso, é que o deixaram sair sob fiança. 

Mas como é que tudo isto aconteceu? Comecemos pelo crime. O assassínio aconteceu em 1995, numa mercearia do Bronx, durante um assalto à mão armada feito por dois homens. A vítima foi o detective reformado Oswald Potter (com 62 anos), que tinha feito parte do departamento de polícia de Nova Iorque (NYPD). Potter tentou impedir o assalto, mas acabou por morrer no hospital depois de ter sido alvejado no peito.

Edward Garry (na fotografia abaixo, à direita) tinha registo criminal na altura em que foi detido: deixou a escola aos 16 anos e começou a vender droga, chegando a passar algumas noites na esquadra. Como a sua fotografia estava nos registos da polícia, foi uma das que foram apresentadas às duas testemunhas para ver se conseguiam identificar os suspeitos: uma das testemunhas apontou Edward Garry como o atirador; o outro disse que pensava tratar-se dele, mas não tinha a certeza. Garry foi logo detido, à espera de julgamento, ainda que não tivessem uma confissão ou provas físicas que o associassem ao crime.

Edward Garry (à direita)

A inocência e as provas insuficientes

Há alguns anos que o detective Forcelli (que depôs agora) se tem dedicado a investigar casos que foram dados como concluídos e arquivados, expondo novas provas que possam ilibar pessoas que estão presas por crimes que não cometeram. Garry não é caso único: em 2015, segundo a New Yorker, 157 cidadãos dos Estados Unidos foram ilibados de crimes que não cometeram. A condenação de Garry (que sempre defendeu a sua inocência) tinha sido feita sobretudo com base no testemunho de duas pessoas que assistiram ao episódio e que pareciam dar uma versão coincidente com as provas de que a justiça dispunha. Segundo Forcelli, na altura era dado muito peso à identificação dos suspeitos e aos relatos das testemunhas. Mas, diz, hoje continuam a existir indícios negligenciados e uma falta de cuidado da parte de alguns polícias.

O julgamento de Garry aconteceu em 1997. Apesar de o seu advogado ter mencionado as incongruências em torno dos testemunhos, o júri do julgamento duvidou do álibi de Garry, que disse estar em casa com os seus pais na altura do crime. O jovem de 20 anos foi então considerado culpado do homicídio e condenado a uma pena de prisão que iria dos 25 anos à prisão perpétua.

Só em 2006 é que a verdade começou a vir ao de cima. Um homem interrogado disse que tinha participado no assalto e descreveu o que tinha acontecido, identificando um outro assaltante, que seria o responsável pelos disparos — e não era Garry. Em 2009, o júri negou a moção do advogado de Garry, dizendo que não era provável que estas novas provas o ilibassem.

Mais tarde, em 2015 e em 2016, o próprio Forcelli acabou por testemunhar também em tribunal, justificando que acreditava que tinham incriminado a pessoa errada. À New Yorker, em 2016, Forcelli disse que, apesar de ter uma carreira de combate às injustiças, acabou por causá-las também: “Privei-o dos anos que para mim foram os melhores da vida, os anos em que me casei, os anos em que tive filhos”.

Na semana passada, Forcelli voltou a testemunhar, mas desta vez como parte da defesa de Garry. “No final, ele [Garry] deu-me um aperto de mão e agradeceu-me por ser honesto”, disse o detective, aliviado por ter sido finalmente feita justiça. Agora, Garry procura dar um novo rumo à sua vida, em liberdade. Mas não esquece o passado: “Perdi a minha vida por uma coisa com a qual nada tive a ver”.

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