Próximo presidente enfrenta pedidos de mais transparência

Já se conhecem os candidatos à sucessão de Jeröen Dijsselbloem no Eurogrupo e Mário Centeno está na dianteira. Em Bruxelas, alguns dos principais actores do teatro europeu pedem transparência e responsabilização.

Centeno e Moscovici
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Centeno e Moscovici Enric Vives-Rubio
Centeno, Dijsslembloem e Mourinho Félix
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Centeno, Dijsselbloeme Mourinho Félix LUSA/OLIVIER HOSLET

O ministro das Finanças que vai suceder ao holandês Jeröen Dijsselbloem à frente do Eurogrupo deverá ser eleito pelos seus pares esta segunda-feira, iniciando mandato em meados de Janeiro. Um dos principais desafios que o próximo presidente enfrenta, a par da reforma da zona euro, é a necessidade de reforçar a transparência e a responsabilização em torno do funcionamento deste fórum informal que junta os ministros das Finanças dos 19 países do euro, o comissário europeu e o presidente do BCE.

Vários especialistas, organizações não governamentais (ONG), eurodeputados e instituições, como a Provedora de Justiça Europeia, ouvidos pelo PÚBLICO, coincidem na urgência de o futuro presidente - seja Mário Centeno ou outro ministro - tornar mais transparentes os procedimentos em torno dos debates no seio do Eurogrupo.

Foi em Junho de 1998 que os ministros das Finanças da moeda única se reuniram pela primeira vez neste formato. O que começou por ser uma espécie de “clube de cavalheiros”, que juntava os ministros das Finanças dos países do euro em jantares informais, tornou-se com o tempo e as circunstâncias num fórum influente de discussão sobre questões decisivas para a zona euro.

Os ministros reúnem-se assim uma vez por mês, em geral na véspera do Conselho de Ministros a 28. As reuniões são informais e confidenciais. Versam sobre questões específicas ao euro mas também podem abranger políticas orçamentais, reformas estruturais, estabilidade financeira ou o alargamento da zona euro.

Muitas vezes, o Eurogrupo acorda previamente posições sobre matérias relativas ao euro que depois são votadas no Conselho – o órgão formal, ainda que nestas matérias os países não-membros do euro não votem. No final de cada reunião do Eurogrupo, o presidente dá uma conferência de imprensa e pode publicar declarações com os principais resultados.

Um programa em dois artigos

O papel do Eurogrupo foi estipulado num Protocolo do Tratado de Lisboa mas resume-se a dois artigos, sete linhas, a indicar apenas que os ministros debatem “questões relacionadas com as responsabilidades específicas” dos países que partilham a moeda única e que o presidente é eleito por dois anos e meio.

Enquanto órgão informal o Eurogrupo não está submetido às mesmas obrigações em matéria de funcionamento e de transparência do que as outras formações do Conselho da UE que devem proceder a deliberações e votos formais ou sessões públicas quando se debatem ou votam actos legislativos.

“De facto, é o centro de governação da zona euro, que foi integrado informalmente, sem criar as estruturas legais adequadas que são necessárias para permitir a responsabilização democrática”, explica ao PÚBLICO Leo Hoffmann-Axthelm, da ONG Transparency International.

A questão da transparência e da responsabilização assume particular relevo porque o Eurogrupo acaba por ser fundamental na coordenação das políticas económicas da zona euro, tendo papel predominante na discussão de questões com grande impacto na vida dos cidadãos. Um dos exemplos recorrente é o dos programas que resgataram vários países da zona euro na sequência da crise financeira, como Portugal, a Irlanda ou mais recentemente a Grécia.

Foi no Eurogrupo, juntamente com outras instituições como o FMI e o BCE, onde se discutiram modalidades de assistência financeira e recomendações aos países resgatados, num figurino que em alguns casos foi interpretado pelos críticos como um exercício punitivo de imposição de duras condições dos credores ao país em dificuldades. Todo o processo de negociações do programa grego foi vivido por Atenas como particularmente vexatório numa altura em que o país estava em grande aflição e sem alternativa, e deixou marcas. Na altura, várias vozes reclamaram mais transparência e informação sobre os debates no Eurogrupo, e métodos mais equilibrados que permitissem ter mais em conta as posições do país resgatado.

“Desde a crise financeira, há uma pressão popular para aumentar a visibilidade do Eurogrupo em termos de maior transparência e de responsabilização” das decisões tomadas, diz Robin Huguenot-Noël, do think tank Centro de Política Europeia, em Bruxelas.

Também o comissário dos Assuntos Económicos e Financeiros, Pierre Moscovici, criticou numa intervenção no seu blogue as decisões tomadas pelo Eurogrupo, “à porta fechada, muitas vezes depois de discussões muito limitadas, sem regras formais”. Neste cenário, a Comissão não pode exercer as suas prerrogativas de defesa do interesse geral. O comissário considerou que “esta falha na governação da união económica e monetária é um défice de democracia” e, em relação à Grécia, “esteve perto de ser um escândalo democrático”.

Outra questão que Leo Hoffmann-Axthelm suscita prende-se com o acesso aos documentos das reuniões. “O Eurogrupo não se sente vinculado às regras sobre documentos, tendo em conta as suas deliberações informais”.

Várias fontes reconhecem que houve um caminho feito durante os mandatos do ainda presidente Jeröen Dijsselbloem, graças à publicação das agendas das reuniões e à publicação de declarações finais com os principais resultados.

A Provedora de Justiça Europeia admite que Dijsselbloem “deu passos bem-vindos em matéria de transparência”. Mas é possível ir mais longe, garante Emilly O’Reilly ao PÚBLICO. “Outras melhorias podiam ser feitas, incluindo permitir ao público obter um retrato mais pormenorizado sobre o que está em discussão e quem contribuiu para as discussões”. O’Reilly destaca ainda a necessidade de maior transparência em torno do Euro Working Group - o grupo de altos representantes dos Estados-membros que prepara os trabalhos dos ministros das Finanças – que deveria pelo menos tornar públicas as agendas dos encontros.

É possível que a situação possa evoluir no médio prazo com mudanças na arquitectura institucional da zona euro. Bruxelas deverá propor aos Estados-membros a criação de um ministro europeu da Economia e Finanças que acumulará os cargos de vice-presidente do executivo comunitário e de presidente do Eurogrupo. “O presidente do Eurogrupo deve responder perante o Parlamento Europeu”, afirma o eurodeputado do PSD José Manuel Fernandes. Com o futuro figurino, “se o vice-presidente da Comissão chefiar também o Eurogrupo, deverá passar numa audição no Parlamento Europeu, podendo ou não ser rejeitado, e será depois escrutinado pelos eurodeputados”.

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