É preciso investir nos territórios!
A reforma florestal anunciada pelo Governo contempla iniciativas importantes, mas não chega.
A violência e a devastação humana dos incêndios deste verão tem que nos interpelar fundo e para além de um inexorável destino. Temos que ser capazes de promover uma mudança efetiva, e assumir um compromisso sólido pelo ordenamento e pela conversão progressiva de um território consumido por décadas de abandono e desordenamento. O momento impõe uma atuação decisiva sobre a fragilidade económica e social dos territórios, e exige a edificação de uma outra floresta, que restitua um equilíbrio entre a função económica de produtividade silvícola e a conservação de recursos múltiplos que a floresta deve garantir, numa relação cúmplice e harmoniosa com as comunidades.
Precisamos de uma outra floresta, apoiada em novos modelos de silvicultura e na conversão em paisagens diversificadas, com destaque para as espécies autóctones, valorizando os matos e incultos; uma mudança ancorada em modelos cientificamente sólidos, dirigidos ao ecossistema florestal, e envolvendo não apenas eucalipto e pinheiro-bravo, mas incluindo uma maior diversidade de espécies relevantes para o equilíbrio ecológico da floresta. É indispensável uma maior valorização ambiental dos territórios, que não pode esquecer a promoção da biodiversidade e a prevenção de espécies infestantes.
A reforma florestal anunciada pelo Governo contempla iniciativas importantes, mas uma apreciação positiva desta ação política impõe o reconhecimento de propostas complementares, que passam — imperiosamente — pelo investimento na valorização ambiental e económica dos territórios, cuja viabilidade depende do apoio direto às comunidades residentes, e da afirmação e apoio a redes locais colaborativas como as que podem configurar as associações de desenvolvimento local e as associações de produtores florestais. É urgente um programa integrado de apoio às aldeias e às suas comunidades, sustentado em novos modelos de governança, formal e informal, que aproximem a decisão do terreno, e que propiciem soluções articuladas e conformadas aos problemas específicos destes espaços territoriais.
Qualquer estratégia, quaisquer medidas, têm que ter em conta a nova realidade imposta pelas alterações climáticas e pela condição sociodemográfica dos territórios atingidos! E os territórios carecem de técnicos especializados, com competências específicas nas diversas áreas de intervenção, e os quais podem apoiar as populações, incentivando as parcerias locais, organizadas em rede, na montagem técnica, institucional e financeira dos projetos e iniciativas. Apoiar as dinâmicas locais, garantindo, por um lado, a articulação política ao nível interministerial, intersectorial e entre os diferentes níveis territoriais da administração e, por outro lado, disponibilizar as competências e os recursos técnicos e tecnológicos indispensáveis à conformação de projetos estruturantes. As instituições de ensino superior devem assumir um papel ativo e determinante, em particular no desenho e apoio a iniciativas formuladas pelas equipas técnicas multidisciplinares para apoio das populações, gestão e uso do solo, floresta e agricultura.
É preciso investir nos territórios. Na capacitação institucional, quer do ponto de vista técnico, quer no fomento e apoio às lideranças, sem o que não se pode esperar capacidade para implementar políticas e projetos, e muito menos dinamizar a mudança num quadro de absoluta desesperança; na articulação de políticas e de programas, evitando a sobreposição de intervenções e a dispersão de apoios; na adaptação urgente dos instrumentos às especificidades dos territórios, bem como à introdução de fatores de discriminação positiva nos contextos necessariamente mais frágeis; na promoção de plataformas de diálogo e de inovação nos processos de governança, adequado para a identificação e operacionalização de soluções ajustadas a problemáticas específicas dos territórios.
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico