Os partidos também se reformam
Os barões do PSD acham que é tempo de voltar atrás e eleger de novo o líder do partido em congresso. É provavelmente uma boa ideia.
Foi em 1999 que António Guterres, então líder do PS, decidiu que era hora de abrir o partido. E propôs que a escolha do líder — que seria outra vez ele — devia ser entregue a todos os militantes, substituindo o modelo tradicional da escolha em congresso. Na época, percebia-se a intenção — a democracia portuguesa entrara numa certa normalidade e os partidos acusavam o cansaço: má imagem perante os eleitores, demasiado fechados sobre si próprios, acusados de caciquismo e cumplicidades. Deixar o modelo de eleição indirecta (em que os militantes votam em congressistas que, depois, escolhiam o líder) parecia razoável. Logo lhe seguiram os passos o PSD e CDS.
Passaram entretanto 18 anos. Cá em Portugal, nada melhorou: a qualificação dos quadros e dirigentes dos partidos é curta, há suspeitas de corrupção em julgamento, o caciquismo mostra-se perante as câmaras (mesmo em directas, como revelou o Observador). De resto, todos sabem que é tão fácil controlar uma eleição de um líder no aparelho como era antes, nos congressos.
O PS, talvez por isso, deu um passo em frente: quando António Costa desafiou Seguro, há dois anos, o então secretário-geral socialista abriu a eleição a simpatizantes do partido (para além dos militantes). Na altura escreveu-se que essas primárias tinham sido um sucesso, um reforço de legitimidade. E até que tinha sido um empurrão para o vencedor, António Costa, ganhar as legislativas seguintes. Resultado: perdeu-as. E só chegou ao Governo usando a maioria de esquerda, num passo democraticamente previsto, mas nunca antes usado.
Lá por fora foi até pior: em França, François Hollande foi eleito em primárias também, chegou ao Governo — e acabou com a mais baixa popularidade da história. O seu sucessor? Eleito em primárias, teve o pior resultado da história dos socialistas franceses. À direita, igual: François Fillon foi simplesmente uma catástrofe. Já em Espanha, as primárias deram a Pedro Sanchéz o PSOE e uma derrota contra Rajoy. E na América, já agora recordo-o, as primárias republicanas elegeram... Donald Trump.
Tudo isto para dizer que se percebe bem que, no PSD, os “barões”, figuras importantes do partido, sugiram agora um regresso aos congressos que elegiam o líder. Aqueles que deixavam meio país preso aos argumentos do púlpito, mesmo sabendo que havia muitas manobras atrás do pano. Hoje, como sabemos que as directas não resolveram nada e que as primárias também não, esta é provavelmente uma boa ideia — se isso nos devolver mais peso aos argumentos, aos projectos e à renovação dos partidos. O CDS já o fez, discreta mas tranquilamente. Terão os restantes líderes a confiança para as discutir?