Juízes admitem desconvocar greve

Deputados do PS terão prometido nesta terça-feira que questões salariais não ficarão fora do debate sobre o estatuto, ao contrário do que disse a tutela. "Vamos ponderar um voto de confiança", diz associação de juízes.

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Enric Vives-Rubio

Depois de ter sido recebida esta terça-feira à tarde pelo grupo parlamentar do PS, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses já admite a possibilidade de desconvocar a greve que tinha marcado para os dias 3 e 4 de Outubro, que, a realizar-se, comprometeria a validação dos resultados eleitorais autárquicos no prazo previsto.

Recebidos pelos deputados socialistas Filipe Neto Brandão e Fernando Anastácio, os juízes dizem ter-lhes sido prometido que quando o seu estatuto profissional for discutido na Assembleia da República as questões salariais não ficarão fora desse debate - ao contrário do que sucedeu nas recentes negociações com a ministra da Justiça, que sempre lhes disse não ter orçamento para mexer nos ordenados dos magistrados, ainda que a médio prazo.

"Os deputados dos partidos com que reunimos manifestaram abertura para discutir o nosso estatuto profissional na íntegra, sem tabus", explicou a presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Manuela Paupério. "Não temos razões para duvidar da seriedade desta afirmação. Por isso, vamos ponderar um voto de confiança" à Assembleia da República, acrescentou. Antes de terem estado com o PS, os juízes tinham sido ouvidos pelos grupos parlamentares do PSD e do CDS. Não conseguiram ser recebidos nem por comunistas nem por bloquistas. 

"Não querem ir para a greve"

Seja como for, não existe ainda uma posição definitiva sobre a desistência da greve. "Podemos cancelá-la, adiá-la ou mantê-la", equaciona Manuela Paupério. A direcção da associação sindical irá agora reunir-se - nem todos os seus membros estiveram no Parlamento - para decidir se as garantias dos deputados se mostram suficientes para desconvocarem o protesto, tendo em conta os danos que uma greve poderá trazer à imagem da classe. "Os juízes não querem ir para a greve. Não se sentem confortáveis com essa solução", reconhece Manuela Paupério. 

Os dirigentes sindicais estão cientes de que não verão o estatuto profissional discutido na Assembleia da República nos próximos dias, uma vez que os trabalhos parlamentares serão interrompidos já esta semana por causa da campanha autárquica. Mas negam que um cancelamento da greve lhes tire a principal arma que têm na mão, a ameaça de adiamento da validação dos resultados das autárquicas - uma vez que tão cedo não se voltarão a realizar eleições. Dizem que podem sempre lançar mão de uma paralisação de uma semana seguida mais tarde, fora do período eleitoral, caso o diploma que saia do Parlamento não seja do seu agrado. O que, a acontecer, comprometeria o funcionamento dos tribunais.

"A greve pode suceder noutra altura", vai avisando a dirigente sindical, recordando que o Governo se mostrou "intransigente", ao negar-se a discutir a parte remuneratória do estatuto, mesmo quando os juízes lhe afiançaram não estarem a exigir aumentos logo em 2018. 

Fonte parlamentar estranha que juízes e ministra da Justiça tenham em Julho dado por concluídas - e sem sucesso, no entender dos magistrados - negociações sobre uma matéria que é por lei da competência legislativa exclusiva da Assembleia da República, uma vez que se trata do estatuto profissional dos titulares do órgão de soberania constituído pelos tribunais.

Já o deputado Filipe Neto Brandão assegura que na reunião que teve com a associação sindical não lhe foram colocadas questões remuneratórias directas, "mas sim de reposicionamento na carreira" dos juízes. "Não colocaram directamente a questão dos salários. Nem apresentaram nenhuma proposta concreta a nível remuneratório", relata. O grupo parlamentar socialista terá "toda a abertura para considerar a reestruturação da carreira" em causa. 

Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça disse que “o Governo fez o trabalho que lhe competia e o processo legislativo continua em curso”. 

Antes de ter marcado paralisação para a altura em que lhes cabe a validação dos resultados das autárquicas, a associação sindical tinha anunciado greve para o início de Agosto, para os dias reservados à validação das listas de candidatos eleitorais por parte dos juízes. Algo que poderia causar sérias perturbações ao processo eleitoral. Já uma eventual greve em Outubro terá consequências menos pesadas, uma vez que o processo eleitoral estará a terminar. 

"Não podemos ficar indiferentes à boa vontade dos deputados", declara Manuela Paupério, "Não estamos aqui para medir forças", sublinha. 

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