Há mais 38 projectos a espevitar os bairros lisboetas
Câmara de Lisboa vai financiar 38 projectos de iniciativa de juntas de freguesia, associações e organizações não-governamentais, ao abrigo do Programa BIP/ZIP. Ao todo, serão investidos cerca de 1,6 milhões de euros.
A “Avó veio trabalhar”. Agora vem “o Avô também". Há três anos, Susana António e Ângelo Campota concretizaram uma "ideia antiga": a de juntar os lavores domésticos das pessoas mais velhas ao design, às novas tendências, para mostrar que “a idade é uma coisa a ser valorizada e celebrada”. Hoje, depois de trabalharem regularmente com mais de 70 avós, Susana e Tiago quiseram pôr também o “Avô” a trabalhar. Deixam o crochet de lado, para dar lugar às madeiras. O projecto mereceu a confiança da câmara de Lisboa que lhes vai atribuir 50 mil euros para porem o projecto a andar.
Este é um dos 38 projectos vencedores da sétima edição do programa BIP/ZIP, que foram anunciados esta sexta-feira na Câmara de Lisboa. No total, o município vai investir cerca de 1,6 milhões de euros neste programa - aos quais acrescem 612 mil euros assegurados por outras fontes de financiamento -, que é apresentado como “um instrumento de política municipal de desenvolvimento local” e que convida a população a “desenvolver projectos e intervenções na melhoria da qualidade de vida na cidade".
“O programa BIP/ZIP está cá para ficar, para durar”. As palavras são da vereadora com o pelouro da Habitação e Desenvolvimento Local, Paula Marques, perante uma sala cheia de quem teve e tem uma ideia para mudar o seu bairro. Candidataram-se 107, só 38 foram aprovados, mas este é um processo que se quer como a “ignição, o espevitar de alguns territórios que estejam mais adormecidos em relação à organização da comunidade", diz a vereadora ao PÚBLICO.
Agora, o desafio é pô-los de pé num ano e desenhar uma estratégia para que se mantenham mais um. É este o compromisso feito com a autarquia que, em troca, lhes dá a verba de que necessitam para que os ponham a andar.
No total, serão desenvolvidas “mais de 217 actividades”, envolvendo mais de 152 entidades, em 66 dos 67 bairros e zonas de intervenção prioritária que estão definidos pela autarquia.
No fundo, o que o BIP/ZIP faz é pôr os habitantes a pensar o seu bairro e a sua cidade: “é a maneira como nós entendemos o que é governar uma cidade, de forma partilhada e participada e dando voz, mas acima de tudo meios, para que as organizações locais, com a população, possam desenvolver aquilo que entendem para o seu bairro”, admite Paula Marques.
O projecto foi lançado em 2011 quando Helena Roseta, hoje presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, era, vereadora responsável pela Habitação. Desde então, segundo as contas da câmara, já foram apoiados um total "de 270 projectos, 1015 entidades e quase 1700 actividades", o que significa um “investimento público de mais de 12 milhões de euros nestes anos”, detalhou a vereadora.
E Helena Roseta foi mais longe ao admitir que programa deveria tomar outra escala, comprometendo-se a "convencer o Governo a fazer um programa como o BIP/ZIP a nível nacional".
Há projectos com diferentes temáticas e objectivos: uns estão focados na melhoria da vida no bairro, outros em trabalhar competências e o empreendedorismo, outros em reabilitar espaços e promover a inclusão e a prevenção. E com públicos igualmente distintos: a maioria dirige-se à comunidade, mas há projectos especialmente desenhados para crianças, jovens, idosos, ou para toda a família.
O projecto Alkantara, por exemplo, quer preservar as "Memórias do Casal Ventoso", para que não percam aquilo que de mais "valioso" há: a memória. Quem o diz é Carlos Santos, promotor do projecto, que quer pôr miúdos e graúdos a conversar em grupo sobre as outras vidas do Casal Ventoso, para que fique “na memória dos mais novos as lembranças que os mais velhos têm do bairro”. O objectivo é criar o "núcleo interpretativo do Casal Ventoso”, com a ajuda de investigadores da Universidade Nova de Lisboa para celebrar os 180 anos do bairro do Casal Ventoso.
"Nós passamos na cidade e nos sítios mais improváveis e encontramos a marca BIP/ZIP", notou Paula Marques, admitindo que os projectos vão além dos tais bairros e zonas de intervenção prioritária. Dos projectos apoiados, alguns têm sobrevivido ao tempo.
É o caso da Cozinha Popular da Mouraria. do quiosque da saúde ou das tais criações da Avó veio Trabalhar. "O BIP/ZIP foi a oportunidade para arrancar, diz Susana, quando receberam o primeiro financiamento há três anos. O objectivo era “criar uma hub criativa” – tão em voga - para pessoas com mais de 60 anos. E o projecto, "muito rapidamente, cresceu exponencialmente".
Começaram com 12 pessoas, hoje são 70. Lançam colecções, bordados, crochet, serigrafias. Tudo produtos para a casa. Há workshops para quem quer também aprender. Mas agora, dizem, “fez sentido” dar também a oportunidade aos homens para criarem uma oficina onde possam "trabalhar técnicas como a pintura, a tecelagem ou as madeiras".
Enquanto dupla, ela designer e ele engenheiro, pensam na "capacitação, no empoderamento, no crescimento das pessoas”, para que percebam qual é o papel que têm na sociedade. E não escondem que a ambição é, agora, que "o Avô" consiga ganhar as proporções que "a Avó" ganhou ao fim de três anos.
A responsabilidade está agora nas mãos das entidades promotoras e das associações locais envolvidas que têm como missão gerir as obras na sua totalidade. Passa “pela comunidade se ir responsabilizando pelos seus equipamentos”, diz a vereadora. À câmara compete acompanhar a execução financeira de cada projecto e dar “acompanhamento técnico” no caso da construção de novas infra-estruturas.
Paras as próximas edições, Paula Marques já pensa num “BIP/ZIP 2.0". Mas antes é preciso aumentar o orçamento para conseguir apoiar mais projectos e começar a pensar em candidaturas inter-bips: que os inúmeros bairros da capital começem a cruzar as suas "diferentes realidades, mas que têm por base as mesmas questões".