Navio que inspirou diálogo memorável de Tubarão foi encontrado 72 anos depois
O naufrágio da embarcação USS Indianapolis foi considerada uma das maiores perdas na história da Marinha dos EUA. Dos 1196 tripulantes a bordo, sobreviveram 316.
Estávamos na manhã de 30 de Julho de 1945, com o fim da Segunda Guerra Mundial à vista, quando o navio Indianapolis, da Marinha dos Estados Unidos, foi bombardeado pelas forças militares japonesas. Acabado de chegar de uma missão secreta – em que transportou de São Francisco até à ilha de Tinian (no oceano Pacífico) partes da Little Boy, a bomba atómica que atingiu Hiroxima – o navio foi bombardeado por dois torpedos, vindos de um submarino japonês, acabando por se afundar. Agora, 72 anos depois, uma equipa de expedição liderada por Paul Allen, o co-fundador da Microsoft, encontrou-o.
Segundo um comunicado da Marinha norte-americana, os restos do navio de 9800 toneladas – peso equivalente a 27 aviões Boeing 747 – foram encontrados a 18 de Agosto, no mar das Filipinas, no Pacífico Norte, a 5500 metros de profundidade. No Twitter, Paul Allen escreveu que a descoberta dos destroços encerrou "um importante capítulo da história da Segunda Guerra Mundial".
We've located wreckage of USS Indianapolis in Philippine Sea at 5500m below the sea. '35' on hull 1st confirmation: https://t.co/V29TLj1Ba4 pic.twitter.com/y5S7AU6OEl
— Paul Allen (@PaulGAllen) 19 de agosto de 2017
Important chapter of WWII history concludes--I hope survivors/families gain some closure. Anchor and ship's bell seen here. #USSIndianapolis pic.twitter.com/Kk1YrcaeN1
— Paul Allen (@PaulGAllen) 19 de agosto de 2017
O co-fundador da Microsoft caracteriza a descoberta como uma experiência de “humildade”. “Poder homenagear os bravos homens do USS Indianapolis e as suas famílias, através da descoberta do navio que desempenhou um papel importante durante a Segunda Guerra Mundial, é verdadeiramente uma experiência de humildade”, lê-se numa nota divulgada no site de Paul Allen.
“Enquanto americanos, todos temos uma dívida para com a equipa pela sua coragem, persistência e sacrifício, face às terríveis circunstâncias”, referiu o filantropo, na esperança de que “todas as pessoas relacionadas com este navio histórico” possam continuar o seu luto em tranquilidade.
A bordo da embarcação seguiam 1196 tripulantes da Marinha norte-americana, sendo que 800 dos tripulantes sobreviveram ao bombardeamento (que acabou por afundar o navio). Porém, de acordo com a missiva do Comando de História e Património Naval norte-americana, após cinco dias à deriva no mar das Filipinas, expostos ao sol, desidratados e após vários ataques de tubarões, apenas 316 tripulantes conseguiram sobreviver.
De acordo com os relatos históricos do acidente, o navio submergiu em apenas 12 minutos, tornando impossível que a tripulação pedisse ajuda ou utilizasse equipamentos salva-vidas.
“Mesmo nas piores derrotas e desastres existe valor e sacrifício que merecem nunca ser esquecidos”, declarou o director do Comando de História e Património Naval, Sam Cox. “Eles [os tripulantes] podem servir de inspiração para os actuais e os futuros marinheiros em permanentes situações de risco”, acrescentou.
O factor-chave para a descoberta
Um dos factores mais importantes para a descoberta dos destroços do USS Indianapolis surgiu em 2016. De acordo com a Marinha norte-americana, o historiador Richard Hulver realizou buscas no local que se pensava ser a zona do naufrágio. Essas buscas acabaram por conduzir ao local exacto do acidente.
Nas suas investigações, o historiador identificou um porta-aviões, que tinha avistado o Indianapolis antes de este ser atingido. Com base nesses dados, a equipa de investigação criou uma nova área de buscas para encontrar o navio. A equipa da expedição, composta por 13 elementos, está agora responsável por fazer o levantamento topográfico. Esta expedição levou ainda à descoberta do navio de guerra japonês Musashi e do contratorpedeiro italiano Artigliere.
Na missiva, a Marinha dos EUA esclarece ainda que os trabalhos de investigação da equipa liderada por Paul Allen estão a ser realizados em conformidade com a lei, “respeitando o navio afundado como uma sepultura de guerra e não um local sujeito a qualquer tipo de trastorno”. Os destroços encontrados vão ficar na posse da Marinha norte-americana e a sua localização exacta vai permanecer confidencial.
O naufrágio do USS Indianapolis ficou marcado na história, com vários livros – e até mesmo um filme – a retratarem o incidente. Realizado por Steven Spielberg, o filme Jaws (em português, Tubarão), inspirado no livro de Peter Benchley, retrata, numa das cenas, os momentos vividos por um dos tripulantes do navio.
“Às vezes o tubarão olha-nos directamente. Mesmo nos nossos olhos. E o que se passa com os tubarões é que eles têm olhos inertes. Olhos pretos, como os das bonecas. Quando vêm na nossa direcção, nem parecem estar vivos, até nos morderem. O oceano fica vermelho, e apesar das palpitações e dos gritos, os tubarões aparecem e deixam-nos em pedaços”, conta Quint, um dos tripulantes da embarcação, retratado no filme pelo actor britânico Robert Shaw. “Na quinta-feira de manhã, cruzei-me com um amigo, Herbie Robinson. Um jogador de basquetebol de Cleveland. Pensei que ele estava a dormir. Aproximei-me para o acordar mas ele afundou-se na água”, diz ainda a personagem.
O naufrágio da manhã de 30 de Julho de 1945 foi também retratado na obra A Viagem Mortal: O naufrágio do USS Indianapolis, de Dan Kurzman, e no livro In Harm’s Way (Na Direcção do Mal, em português), de Doug Stanton, que conta a história dos tripulantes que sobreviveram ao bombardeamento. Passados 72 anos, 22 membros da tripulação do USS Indianapolis ainda estão vivos.