Será que Cuba usou uma "arma sónica secreta" contra embaixada dos EUA?

Departamento de Estado confirmou investigação às origens de casos inexplicáveis de perda de audição de diplomatas em Cuba. As primeiras conclusões apontam para a exposição a um sinal acústico fora da gama audível. Governo de Havana rejeita qualquer responsabilidade.

A embaixada dos Estados Unidos em Havana reabriu a 20 de Julho de 2015
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A embaixada dos Estados Unidos em Havana reabriu a 20 de Julho de 2015 Reuters/ALEXANDRE MENEGHINI
Festa para a reabertura da embaixada de Cuba em Washington
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Festa para a reabertura da embaixada de Cuba em Washington Reuters/CARLOS BARRIA

Já se tinha percebido que a muito propalada nova era de amizade e abertura entre os Estados Unidos e Cuba estava condenada a prazo, depois de a Administração Trump ter anunciado a intenção de desfazer a política de reaproximação diplomática e económica dos dois países inaugurada pelo seu antecessor Barack Obama. Só não se sabia ainda em que termos iam ficar os dois inimigos históricos, até que a expulsão de dois diplomatas cubanos de Washington, em retaliação por um alegado – e inusitado – ataque acústico contra os funcionários da embaixada dos EUA em Havana mostrou que a velha hostilidade dos tempos da Guerra Fria aparentemente está de volta.

Numa semana pródiga em acontecimentos na área diplomática, a notícia do regresso a casa de dois diplomatas cubanos, discretamente expulsos de Washington em Maio passado, até poderia passar desapercebida, não fosse a enigmática razão invocada para a decisão do Departamento do Estado. Segundo a porta-voz, Heather Nauert, tratou-se da resposta da Administração a “certos incidentes” ocorridos em Havana e que obrigaram ao retorno de pessoal diplomático norte-americano “por razões de saúde”.

“Algum do nosso pessoal, que apresentava uma variedade de sintomas físicos, teve a opção de deixar Cuba e ser repatriado por razões de saúde. Em resultado dessa situação, convidámos dois funcionários cubanos a abandonar os EUA, coisa que fizeram”, confirmou a porta-voz do Departamento de Estado, sem fornecer outros pormenores. “Não temos respostas definitivas sobre a fonte ou a causa destes incidentes, mas estamos a tratar a situação com toda a seriedade”

Quando o caso já começava a assumir contornos de mistério policial, acabou por se descobrir que tinha sido aberta uma investigação, conduzida pelos serviços de segurança diplomáticos e o FBI, depois de vários funcionários norte-americanos a trabalhar em Havana terem começado a exibir sintomas inexplicáveis de contusão e acelerada perda de audição, no final de 2016. As primeiras conclusões foram surpreendentes: os casos clínicos (por enquanto foram reportados cinco, um dos quais bastante grave) foram atribuídos à exposição a um sinal acústico fora da gama audível do espectro sonoro, alegadamente emitido por um aparelho que teria sido colocado no exterior ou no interior das suas residências.

Ou seja, os Estados Unidos admitem a possibilidade de que os seus diplomatas tenham sido submetidos a um ataque continuado, com recurso a um qualquer mecanismo ou dispositivo sónico que só os serviços secretos cubanos teriam condições de esconder nas instalações da embaixada norte-americana ou nas residências dos diplomatas – e de operar sem detecção durante um período prolongado. Os investigadores estarão agora a tentar perceber que tipo de aparelho (ou, segundo a imprensa americana, “arma sónica secreta”) foi utilizado, e qual o objectivo da campanha.

Para alguns comentadores, o episódio parece pôr em causa a boa-fé de Havana quando se comprometeu a reatar os laços diplomáticos com os EUA. Em comunicado, o ministério dos Negócios Estrangeiros de Cuba desmentiu categoricamente que tivesse alguma coisa a ver com as situações relatadas e negou que qualquer serviço do Governo tivesse encetado “acções contra diplomatas ou oficiais acreditados e as suas famílias sem excepção”.  

Segundo o jornal The Washington Post, o Governo de Havana terá dado garantias a Washington de que iria lançar a sua própria investigação ao caso e “tomar as medidas apropriadas” mediante as conclusões. Mas o diário recordava que a espionagem, o assédio e a perseguição de oficiais norte-americanos em território cubano não era nenhuma novidade – essa era a prática corrente durante os anos mais tensos da Guerra Fria.

O “degelo” entre os EUA e Cuba, anunciado por Barack Obama e Raúl Castro no final de 2014 e concretizado com a abertura das embaixadas em Washington e Havana, em Julho de 2015, alimentou esperanças (de um lado e do outro do estreito da Florida) de mudanças no regime castrista. No entanto, a recente reversão de algumas das medidas promovidas por Obama, como o fim das restrições às viagens de cidadãos norte-americanos para Cuba ou das ligações comerciais entre empresas dos dois países, levou o Governo cubano a travar algumas das suas iniciativas para liberalizar a economia.

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