Autárquicas motivaram quase 200 queixas de cidadãos e partidos
Autárquicas já motivaram perto de duas centenas de queixas e mais de mil pedidos de informação. A preparação de umas eleições autárquicas no país significa sempre muito trabalho para a Comissão Nacional de Eleições.
Quando em Julho de 2013, João Tiago Machado chegou à Comissão Nacional de Eleições (CNE) houve quem lhe dissesse, em tom de brincadeira, que tinha entrado directamente para a corrida sem ter feito o aquecimento. É que o agora porta-voz daquele órgão independente aterrou na fase em que as últimas eleições autárquicas preparavam caminho no país, o que significa que há um aumento de dúvidas e de protestos de cidadãos e partidos aos quais é preciso dar resposta. Quatro anos depois, o cenário repete-se: até 2 de Agosto, quem ali trabalha já teve de responder a 1014 pedidos de informação e tomar decisões sobre 187 queixas.
Os motivos são os mais variados, mas aquele que surge no topo das reclamações prende-se com falta de “neutralidade e imparcialidade das entidades públicas”. A seguir às 60 queixas contra a falta de neutralidade e imparcialidade de entidades públicas, os registos contam, em segundo e terceiros lugares, 39 protestos relacionados com propaganda e 35 problemas encontrados em publicidade institucional. Logo depois surge a publicidade comercial, com 30 reclamações.
Menos denúncias mereceram casos relacionados com o “tratamento jornalístico das candidaturas” (oito queixas) e com questões ligadas a “inelegibilidades/ incompatibilidades” (sete). Por fim, até àquele dia, houve duas reclamações que punham em causa a “igualdade de tratamento das candidaturas” e outras duas sobre o processo de candidatura em si. Até ao início de Agosto, o “tratamento jornalístico discriminatório” e a limitação de mandatos tinham motivado uma queixa cada um, bem como reclamações sobre o processo de “apuramento” de resultados.
Em resposta ao PÚBLICO, a CNE precisou ainda que, ao todo e até 2 de Agosto, foram remetidos “1014 pedidos de informação por escrito (não inclui pedidos de informação por telefone)”. Os dados continuam a ser recolhidos pela CNE até à data do sufrágio e, por isso, não foi facultada ao PÚBLICO toda a informação actualizada este mês. Alguns dos números disponibilizados ainda só dizem respeito a 30 de Junho.
Nesse primeiro relatório síntese de Junho, haviam sido enviados 586 pedidos de informação por escrito, a grande maioria (407) tinha partido de cidadãos – e as queixas também. A seguir surgiam as candidaturas de grupos de cidadãos eleitores (65 pedidos). Os órgãos das autarquias locais somavam, à data, 39 pedidos, a comunicação social 19, ainda havia 18 pedidos de “outras entidades” e, finalmente, aparecia na tabela o primeiro partido: o PSD com 10 pedidos de informação. O tema principal prendia-se com o processo de candidatura de grupos de cidadãos eleitores.
Os picos de Setembro
Exemplos concretos das queixas que chegam à CNE? Há muitos e têm vindo a ser relatados na imprensa. Hoje em dia, há vários casos de propaganda eleitoral no Facebook que também são analisados pela comissão e há os que se passam nos municípios, muitos dos quais estão relacionados com processos de recandidaturas, nos quais os adversários políticos consideram haver aproveitamento de quem já está nos órgãos locais de determinados meios à disposição para fins eleitorais.
No final de Julho, a concelhia Bloco de Esquerda de Condeixa-a-Nova apresentava queixa à CNE contra a autarquia por alegadamente usar a folha informativa do município para promover o presidente que se recandidata. O BE sublinhava que as entidades públicas, entre as quais estão as autarquias e titulares dos órgãos, “estão sujeitas a especiais deveres de neutralidade e de imparcialidade desde a data da publicação do decreto que marca o dia das eleições”.
Mas o contrário também já aconteceu: movimento independente Rui Moreira: Porto, o Nosso Partido apresentou queixa na CNE contra o BE por considerar que aquele partido está a usar indevidamente a nova imagem gráfica da Câmara do Porto nos cartazes.
Os casos sucedem-se neste período que precede a campanha eleitoral, marcada para as duas semanas antes do dia de ir às urnas – 1 de Outubro. E a CNE tem agido, em função das suas competências e dos protestos que lhe chegam. No relatório de final de Junho, num toral de 48 deliberações, 20 eram esclarecimentos (pareceres), mas a seguir surgiam 19 recomendações ou advertências.
Em 2013, o relatório final dava conta da existência de 3047 pedidos de informação por escrito – este número abrange todo o ano, mas só em Setembro (foi no final do mês que aconteceram as autárquicas) houve 1220. A maioria dos pedidos de informação partiu de cidadãos e, no balanço final, foram questões relacionadas com a votação as que mais pesaram. Por telefone, houve 4971 pedidos de informação – contabilizados apenas entre 24 de Julho e 29 de Setembro.
Nessas eleições autárquicas, a CNE registou um total de 681 processos, o que representa um aumento “significativo” face a 2009, quando foram instaurados 439 processos. No documento, pode ler-se ainda que, neste ponto, os temas mais recorrentes foram propaganda, neutralidade e imparcialidade das entidades públicas, e tratamento jornalístico discriminatório.
2013 foi também o ano em muita tinta correu por causa dos chamados “dinossauros”, os autarcas apanhados pela lei da limitação de mandatos autárquicos. No meio do furacão estiveram na altura autarcas que já tinham cumprido pelo menos três mandatos num município e que queriam candidatar-se noutro concelho: Fernando Seara (na altura a concorrer pelo PSD/CDS, em Lisboa), Luís Filipe Menezes (PSD-Porto) e Fernando Costa (PSD-Loures) são apenas três entre vários outros exemplos.