Irene tem marido britânico e vivia no Reino Unido há 27 anos. Mesmo assim foi deportada
Foi levada para o aeroporto e metida num avião com destino a Singapura. Família não conseguiu contactar um advogado para tentar travar o processo de deportação porque tudo isto se passou a um domingo. Ministério do Interior diz que a lei é para cumprir.
Não lhe bastou viver no Reino Unido há quase 30 anos, nem ser casada com um britânico. O facto de os seus dois filhos e a neta serem súbditos de sua majestade a rainha Isabel II também não foi suficiente. Irene Clennell, 53 anos, acabou por ser forçada a regressar ao país onde nasceu, Singapura, com apenas 12 libras no bolso (14 euros).
De acordo com a BBC, esta mulher que chegou ao Reino Unido em 1988 esteve confinada desde o início de Fevereiro a um centro de detenção na Escócia antes de ser deportada. Terão sido os longos períodos que passou no estrangeiro a cuidar dos seus pais a invalidar o seu visto de residência, avança a imprensa britânica, procurando explicar o que terá levado a este regresso forçado. Não há qualquer esclarecimento oficial porque é política do Ministério do Interior não comentar casos individuais.
É dado como certo, no entanto, que Irene Clennell passou a maior parte da sua vida, e até da sua vida de casada, a morar em Singapura, embora lhe tivesse sido concedida uma licença de residência por tempo indefinido logo após o seu casamento com um cidadão britânico, em 1990. Terá sido essa licença que agora perdeu.
À BBC, Clennell terá dito que foi transportada de carrinha do Centro de Detenção de Dungavel para o aeroporto sem que lhe permitissem, sequer, ir a casa fazer uma mala com roupa e outros objectos pessoais.
A deportação para Singapura, que segundo o diário The Guardian aconteceu no domingo, dá-se num momento em que o seu marido, John, está gravemente doente e em que Irene Clennell é o seu principal apoio.
“Todos os pedidos de licença para permanecer no Reino Unido são avaliados de acordo com os seus méritos individuais e as regras da imigração”, disse um porta-voz do Interior citado pela BBC. “Esperamos que aqueles que não têm direito a ficar no país saiam.”
Através do seu director, Nazek Ramadan, a organização de protecção aos imigrantes Migrant Voice, anunciou já que vai dar início a uma campanha para que Clennell possa voltar ao Reino Unido, definindo o seu caso como “mais um exemplo da arbitrariedade de políticas [do Ministério do Interior] que destroem famílias e arruinam vidas”.
“É escandaloso o que aconteceu hoje”, disse Angela, a cunhada de Clennell, ao jornal britânico. “Estou chocada com o facto de isto ter sido feito a um domingo para que não pudéssemos contactar ninguém e tentar impedir que isto acontecesse.” Angela foi uma das pessoas que garantiram que a mulher do irmão tem apenas 12 libras no bolso.
Entretanto, uma página criada para ajudar a pagar as custas legais do processo que vai tentar levá-la de volta ao Reino Unido reuniu já mais de 8000 libras (quase 9500 euros). Nessa página, Angela explica por que razão considera tão injusta a deportação, garante que Irene e John têm uma vida feliz, que a cunhada é um membro estimado da sua comunidade e que, sem ela, o irmão terá muito mais dificuldade em enfrentar a doença. “A Irene nunca usufruiu de benefícios no Reino Unido. O John trabalhou durante toda a sua vida. Precisamos de lutar para os manter juntos, para que John tenha quem cuide dele e para que Irene possa ficar com a sua família, que é onde é a sua casa”, escreve Angela, precisando que a cunhada já não tem os pais à sua espera em Singapura, uma vez que ambos morreram.
De acordo com o Guardian, o visto de residência concedido pela via do casamento exige que o cônjuge do cidadão britânico dê provas de que ganha pelo menos 18.600 libras por ano (quase 22 mil euros) e de que o casal viveu longos períodos sem interrupções no Reino Unido.
Prevendo que as grandes temporadas que passou em Singapura para acompanhar os pais viessem a trazer-lhe problemas, Irene Clennell fez várias tentativas para se recandidatar a uma autorização para viver com o seu marido, garantiu à BBC. Esta mãe e avó de 53 anos foi enviada para um centro de detenção assim que, numa reunião de rotina em meados de Janeiro, os serviços de imigração se aperceberam de que o seu último visto expirou em 2016.
John Clennell, que visitou a mulher na sexta-feira, disse ao site de notícias Buzzfeed que não fazia qualquer ideia de que ela ia ser deportada. “Penso que isto foi feito de forma deliberada para que não contactássemos um advogado ou fossemos aos tribunais […] Preciso que as pessoas vejam o que esta gente fez.”
John e a irmã, Angela, fizeram vários telefonemas para advogados no domingo, sem que conseguissem entrar em contacto com um que pudesse representá-la e, eventualmente, travar a deportação.
Ao mesmo site, Irene tinha dito já: “Eles vieram buscar-me esta manhã e disseram que já me tinham dado uma oportunidade. Agora estou no avião. Quatro pessoas estão a levar-me para Singapura.”
Esta deportação está a agitar o debate, pelas circunstâncias em que é feita, mas também pelo contexto em que acontece - o "Brexit" torna todos os temas relacionados com imigração cada vez mais quentes.