PCP surpreende PS ao chamar municipalização da Carris ao Parlamento
Depois do “chumbo” da TSU, uma nova apreciação parlamentar pode fazer cair uma política do Governo socialista. Resta saber que posição vai assumir o PSD.
De surpresa e sem aviso prévio ao PS e ao Governo, o PCP apresentou sexta-feira na Assembleia da República um pedido de apreciação parlamentar do decreto-lei que transferiu a Carris para a Câmara de Lisboa, por discordar da “municipalização” do serviço público de transporte colectivo de superfície de passageiros na capital. Depois do “chumbo” da redução da Taxa Social Única no Parlamento, uma nova maioria negativa ameaça outra decisão do Governo numa matéria sensível em ano de eleições autárquicas.
A medida, decidida pelo Governo a 22 de Dezembro e promulgada com avisos pelo Presidente da República entra em vigor na quarta-feira, 1 de Fevereiro. Nesse mesmo dia reúne-se a conferência de líderes onde pode ser marcada a data para esta nova apreciação parlamentar. Resta saber se o PCP vai pedir urgência no agendamento e se vai propor a cessação da vigência do decreto-lei, como fez com a TSU, ou apresentar propostas de alteração.
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A nova crise na maioria de apoio ao governo do PS, dois dias depois do chumbo da TSU, apanhou desprevenido tanto o primeiro-ministro como o presidente da Câmara, sabe o PÚBLICO. António Costa tem agora mais este foco de instabilidade para resolver, e Fernando Medina mantém-se em silêncio enquanto o Governo não perceber junto dos comunistas até onde estes estão dispostos a ir na contestação à medida. "É uma política que consta do Programa de Governo, era uma área onde o PCP tinha grande convergência estratégica, apesar dessa divergência pontual", critica um dirigente socialista.
A grande dúvida reside agora no PSD, que se dividiu no processo autárquico (e continua sem candidato) votando contra no executivo municipal e a favor na assembleia municipal. O CDS está assumidamente contra a decisão do Governo. Assunção Cristas, líder centrista e candidata a Lisboa já tinha prometido questionar no Parlamento os responsáveis do Governo por esta escolha, apontando uma discrepância de cinco milhões de euros entre o plano de investimento e o valor do fundo que vai financiar a Carris.
Helder Amaral, deputado centrista, espera para ver de que forma o PCP vai concretizar o seu pedido de apreciação parlamentar, mas não tem dúvidas que o CDS votará a favor da cessação da vigência, se for essa a solução comunista. Embora divirja do PCP quanto ao modelo de gestão – os comunistas querem que a Carris se mantenha no Estado e os centristas preferem as concessões a privados -, os dois partidos estão contra a entrega da empresa a uma única câmara, quando o seu raio de acção se estende por seis municípios. “Lisboa não é uma ilha, a mobilidade da capital tem de ser vista na área metropolitana”, afirmou ao PÚBLICO.
Se PSD e CDS se juntarem ao PCP, a entrega da Carris à autarquia liderada por Fernando Medina terá de ser revertida. Juntas, estas bancadas somam 122 votos (e possivelmente mais dois d’Os Verdes), mais de metade dos deputados em funções.
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O Bloco de Esquerda deverá ficar ao lado do PS, tendo em conta o que escreveu o deputado municipal Ricardo Robles no site do partido, o Esquerda.net: “O Bloco de Esquerda defendeu desde a primeira hora que a gestão dos transportes públicos na cidade de Lisboa teria de ser realizada pelo município, a transferência da Carris para a Câmara é por isso uma boa notícia”.
No pedido de apreciação parlamentar, o PCP manifesta-se contra “a municipalização” da Carris por três razões: por considerar que “é o Estado Central que tem a capacidade e a responsabilidade de assegurar o financiamento deste serviço público”. Por defender que “nas áreas metropolitanas os transportes devem ter uma resposta metropolitana” e não municipal – tanto mais que a Carris serve directamente outros concelhos (Almada e Loures, de maioria comunista, Amadora, Odivelas e Oeiras). E ainda porque considera que os direitos dos trabalhadores da Carris melhor estão garantidos no Sector Empresarial do Estado.
Além disso, o PCP considera que as excepções que o decreto-lei faz à Lei do Regime do Sector Empresarial Local "são de muito duvidosa legalidade e constitucionalidade".