Trump interveio em auxílio de Israel e Egipto desistiu de resolução
Rumores sobre a possibilidade de Obama decidir abster-se na votação no Conselho de Segurança levou Governo israelita a recorrer ao Presidente eleito. Tomada de posição antecipa viragem da posição americana sobre conflito israelo-palestiniano.
Donald Trump já tinha mostrado que não vai esperar pelo dia 20 de Janeiro para tomar posições sobre a política externa americana, como demonstra a sua conversa com a Presidente de Taiwan. Mas desta vez o Presidente eleito norte-americano foi mais longe, indo em auxílio de Israel para travar a votação no Conselho de Segurança das Nações Unidas de uma resolução que condenava a colonização nos territórios palestinianos – um diploma que, segundo algumas fontes, a Administração de Barack Obama poderia deixar passar.
Quinta-feira à noite, poucas horas antes da votação, o Egipto anunciou que iria retirar, temporariamente, o projecto de resolução que tinha apresentado e que exigia “a cessão imediata e completa de toda a actividade de colonização”, sublinhando que ao apropriar-se de terras e construir casas nos territórios ocupados Israel “põe perigosamente em risco a viabilidade” de um futuro Estado palestiniano.
Um texto idêntico a muitos discutidos nos últimos anos na ONU – em 2011, os EUA vetaram um texto idêntico –, mas desta vez especulava-se que Obama não iria blindar a posição de Israel, deixando passar a resolução com a abstenção americana. Seria uma decisão que abalaria um dos pilares da política externa dos EUA, materializando a frustração do Presidente norte-americano com o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, a quem atribuiu boa parte das responsabilidades pelo fracasso das duas tentativas que fez para negociar a paz na região.
Ninguém na Administração confirmou qual seria o sentido de voto americano, mas a dúvida bastou para colocar o Governo israelita em modo de crise e a contactar directamente a equipa de transição “para pedir a ajuda do Presidente eleito”, confirmou à AFP uma fonte oficial, a coberto de anonimato. E o Presidente eleito, que durante a campanha prometeu instalar a embaixada norte-americana em Jerusalém – reconhecendo implicitamente a cidade como capital de Israel – pôs de imediato em campo. Através do Twitter, o seu meio de comunicação favorito, e num comunicado oficial pressionou a actual Administração a vetar a resolução, alegando que o texto “coloca Israel numa difícil posição negocial e é extremamente injusta para todos os israelitas”.
Abdul Fattah al-Sisi, o Presidente egípcio que se confessa admirador de Trump e que foi um dos primeiros a cumprimentá-lo pela vitória eleitoral, confirmou depois ter falado ao telefone com o Presidente eleito norte-americano sobre a resolução. “Os dois líderes chegaram a acordo sobre a importância de dar à Administração norte-americana a hipótese de lidar de gerir todos os aspectos relacionados com a causa palestiniana”, lê-se num comunicado do líder egípcio, para justificar a retirada do documento, que o Cairo diz ser apenas temporária.
Além da ultrapassagem ao Presidente em funções, a intervenção de Trump antecipa a mudança radical que a sua chegada à Casa Branca trará à posição norte-americana para o conflito israelo-palestiniano, depois de oito anos de relações frias (por vezes geladas) entre Netanyahu e Obama em que Washington não se coibiu de criticar abertamente a expansão dos colonatos na Cisjordânia e Jerusalém oriental. Uma viragem já anunciada pela nomeação para o cargo de embaixador em Israel de David Friedman, um advogado especializado em falências que não só apoia a expansão dos colonatos, como vai além das posições assumidas pelo próprio primeiro-ministro israelita: rejeita a solução de dois Estados que há décadas é apresentada como o caminho para a paz, e defende que Israel deve anexar a Cisjordânia.
Em comunicados separados, mas com o mesmo tom, Trump e Netanyahu afirmam que “a paz entre israelitas e palestinianos só pode resultar de negociações directas entre as partes e não através de condições impostas pela ONU”. O recuo egípcio representa uma nova derrota para a Autoridade Palestiniana, que à falta de progressos nas negociações tem recorrido às instituições internacionais como caminho para forçar o reconhecimento do Estado da Palestina. Visivelmente desiludido, o embaixador palestiniano nas Nações Unidas, Riyad Mansour, acusou Trump de “agir em nome de Netanyahu”. “Um veto significa o abandono da solução de dois Estados e dos esforços de paz”, lamentou o negociador palestiniano Saeb Erakat.