Governo lança repto ao Porto para seguir Lisboa com descontos nos passes

Em ano de autárquicas, Carris e Metro de Lisboa vão passar a ser gratuitos para as crianças e mais baratos para os seniores. O objectivo é compensar a perda de receitas com mais passageiros.

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Transferência da gestão da Carris acontecerá em Janeiro e os descontos e isenções a partir de Fevereiro DR
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No dia em que Fernando Medina decorou a passagem da Carris para a Câmara de Lisboa com anúncios de isenções e descontos nos passes, uma pergunta impôs-se: e o resto do país? O ministro do Ambiente respondeu ao PÚBLICO que faz tudo parte da “política comercial das empresas”, já que também a Metro de Lisboa e a CP (nos percursos urbanos) passarão, em Fevereiro, a dar viagens grátis a crianças até 12 anos e a fazer descontos de 40% para passageiros com mais de 65 anos. Para o Porto, Matos Fernandes lançou um repto: medidas como estas, que atraiam mais passageiros, são “bem-vindas”.

“Não se trata de política social, mas sim de política comercial das empresas. Se a STCP quiser, pode avançar com medidas parecidas. Essas hão-de ser propostas dos seus gestores, que serão bem-vindas”, afirmou o governante. O caso da STCP, que gere a rede de autocarros no Porto, é muito diferente do da Carris, a começar pelo número de municípios envolvidos. Se, em Lisboa, está em causa a transferência para uma única autarquia em Janeiro, no Porto serão seis as câmaras a dividir os comandos da transportadora pública. Além disso, o processo está atrasado. Será em 2017, mas não há ainda uma data fechada para que assumam a gestão.

Além disso, os municípios do Grande Porto não vão ter autonomia para decidir descontos ou isenções no custo dos passes como os que Lisboa anunciou na segunda-feira. Como lembra o autarca de Gaia, na sociedade que vai passar a gerir a STCP, as câmaras estão em maioria mas caberá ao Estado nomear o administrador financeiro – e este terá um “poder de veto” sobre decisões que aumentem os prejuízos da transportadora.

O socialista Eduardo Vítor Rodrigues e o seu o homólogo da Maia, o social-democrata Bragança Fernandes, concordam que, sendo possível, seria positivo alargar o acesso de mais franjas da população ao transporte público, mas lembram que essa questão terá de ser consensualizada pois na transportadora do Grande Porto há seis municípios envolvidos.

E Eduardo Vítor Rodrigues nota ainda que, tirando o caso do Porto, onde a STCP tem monopólio de operação, qualquer medida de desconto no preçário Andante teria de envolver as empresas privadas que operam nos restantes cinco concelhos e o próprio Metro do Porto, onde o Estado é maioritário. E, neste quadro, qualquer solução teria de ser trabalhada com o Governo, insistiu o autarca de Gaia. Na Câmara do Porto, o assessor de Rui Moreira, Nuno Santos, considera que nesta fase “é prematuro” estar a discutir as políticas comerciais da futura STCP de gestão municipal, invocando precisamente os condicionalismos expressos pelos restantes autarcas contactados pelo PÚBLICO.

Quem paga a factura?

Com a transferência da Carris, depois da anulação das concessões a privados que afectou também a Metro de Lisboa, STCP e Metro do Porto, passa a ser da autarquia a responsabilidade de gerir a operação. Ou seja será o município a responder pelos prejuízos operacionais (a diferença entre as receitas e os custos).

As isenções e os descontos anunciados na segunda-feira para o passe Navegante Urbano vão gerar perda de receitas, mas o ministro do Ambiente está convicto de que o saldo será positivo. “A ausência de receitas será compensada por um aumento da procura”, sobretudo de passageiros que deixaram de usar transportes colectivos por causa dos sucessivos aumentos tarifários. Matos Fernandes admite, ainda assim, que essa compensação poderá não ser total, mas defende que “o transporte público existe para movimentar pessoas e não para gerar ebitda” – isto é, resultados positivos.

No caso da Metro de Lisboa ou da CP, se houver perda de receita que fique por compensar, será o Estado a assumir a diferença, mas o governante esclarece que o impacto nesta empresa será muito residual. “É na Carris que o impacto é mais significativo, sobretudo nos descontos para as pessoas com mais de 65 anos”, explicou, acrescentando que, só nesta franja, espera-se que os descontos possam trazer um acréscimo do tráfego na ordem dos 40%. As isenções para crianças têm “pouca expressão”, garantiu, lembrando que, neste ponto, o objectivo de aumento da procura é mais a longo prazo. A intenção é criar desde cedo uma ligação com os transportes públicos que evite que a utilização de automóvel se torne um hábito difícil de mudar.

Questionada pelo PÚBLICO sobre o impacto financeiro da medida, a assessoria de imprensa da Câmara Municipal de Lisboa respondeu com a criação do fundo de mobilidade, com uma dotação de 15 milhões de euros, que será alimentado com receitas da EMEL, parte do Imposto Único de Circulação e parte das multas de estacionamento para “suportar a melhoria do serviço a prestar pela Carris”.

A “política comercial” é diferente da “política social”, a que Matos Fernandes fez referência, já que, a este nível, existe o Passe Social +. Trata-se de um passe com descontos para grupos mais carenciados, que foi alargado a todo o país em 2016 pelo actual Governo, mas que ainda não chegou ao terreno, aguardando por luz verde das Finanças. A medida vai manter-se no próximo ano. Mas com o anúncio da Câmara de Lisboa, a esquerda ganha agora outra margem para medir um esforço adicional ao executivo de António Costa. com Inês Boaventura

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