A extrema-direita vai falar ao ouvido de Trump na Casa Branca
Tentativa de equilíbrio entre o Partido Republicano tradicional e o movimento populista nas primeiras nomeações do Presidente eleito dos EUA gera fortes críticas.
Quem terá a última palavra no círculo mais próximo do poder na Casa Branca do Presidente Donald Trump? O discreto e conciliador Reince Priebus, nomeado chefe de gabinete, ou Steve Bannon, o radical obcecado pela ideia de destruir a esquerda, escolhido como principal estratega e conselheiro presidencial? É ainda cedo para ter uma resposta, mas se o anúncio do nome de Priebus sossegou o Partido Republicano tradicional, o de Bannon, reconhecido como “racista, misógino e anti-semita” lançou o alarme.
Outro nome para a Administração Trump, ainda não confirmado, mas avançado pela agência Bloomberg e outros media como o recomendado pela equipa de transição para ocupar o posto de ministro das Finanças, é o de Steve Mnuchin, um banqueiro de investimento, ex-Goldman Sachs, e tesoureiro da campanha do Presidente-eleito.
Quanto a Steve Bannon, tornou-se director-geral da campanha de Trump em Agosto, e nessa altura deixou a direcção do site de extrema-direita Breibart, que dá voz a um noticiário tendencioso. Exemplo de alguns conteúdos: um artigo a defender que as mulheres assediadas online devem simplesmente sair da Internet, outro apelando a trazer a bandeira dos Confederados para a rua depois de um homicida ter morto nove pessoas numa igreja de uma congregação de negros em Charleston (Carolina do Sul). Publicou frases como “Ruas de Paris transformadas numa zona de guerra por imigrantes violentos”, em artigos onde usou frequentemente expressões como “inimigo interno”, “escória dos migrantes” e “media controlados pelos judeus”.
A nomeação de Bannon para a Casa Branca foi vista como uma legitimação deste tipo de ideias marginais e conspirativas e fez soar um coro de críticas. “A extrema-direita fascista e racista está a ser representada a poucos passos da Sala Oval”, comentou John Weaver, um estratega republicano que geriu a campanha do governador John Kasich do Ohio e do senador John McCain.
O Conselho de Relações Americano-Islâmicas considerou que a selecção de Bannon para um cargo de tão grande influência sobre o próximo Presidente dos EUA “envia a perturbadora mensagem de que as teorias da conspiração contra os muçulmanos e a ideologia nacionalista branca serão bem-vindas na Casa Branca”.
Há mesmo apelos a que o Presidente-eleito volte atrás na sua primeira decisão: “Trump devia rescindir esta contratação. No seu discurso de vitória, disse que queria ser o ‘Presidente de todos os americanos’. Bannon devia ir-se embora”, disse o Southern Poverty Law Center, um observatório que segue a actividade de grupos de extrema-direita.
A extrema-direita americana, a alt-right, por seu lado, encheu o Twitter de saudações de 140 carácteres pela nomeação de Bannon. “Estratega é a melhor solução possível para Steve Bannon na Casa Branca deTrump”, escreveu Richard Spencer, que dirige a organização National Policy Institute.
Priebus, que até agora dirigia o Comité Nacional Republicano (órgão que organiza a campanha eleitoral), viu-se obrigado a defender a escolha feita pelo chefe comum: “Não sei de onde vêm as críticas. Esse não é o Steve Bannon que eu conheço. Ele é uma pessoa muito, muito inteligente”, disse numa entrevista à televisão ABC.
Kelly Conway, a directora de campanha de Trump, veio também defender Bannon: “Ele é formado em gestão por Harvard. Foi oficial da Marinha. Tem tido sucesso como empresário na indústria do entretenimento.” Chamou-lhe “brilhante a conceber tácticas”, descreve o New York Times. Já Newt Gingrich disse que Bannon não poderia ser anti-semita, “porque trabalhou tanto num banco como em Hollywood, duas indústrias associadas com os judeus.”
Equilíbrio difícil
Estas primeiras nomeações – se Trump aguentar a pressão e mantiver Bannon – deixam antever uma Casa Branca que tentará fazer um equilíbrio entre a base populista, dos que querem mudar tudo e não deixar pedra sobre pedra, e a direita tradicional, habituada aos compromissos da governação. “O Presidente-eleito tem a reputação de lançar assessores uns contra os outros, às vezes com consequências desastrosas”, escreveu o Politico. E o comunicado de imprensa que anunciou os novos cargos de Priebus e Bannon sublinhava que seriam “parceiros em igualdade de circunstâncias”, embora o nome de Bannon viesse em primeiro lugar.
No entanto, a escolha de Priebus, amigo do speaker da Câmara dos Representantes Paul Ryan, como quem Trump nunca conseguiu relacionar-se, indica que Trump quer fazer pontes com Washington e com o Congresso – agora dominado, nas duas câmaras pelo Partido Republicano.
O Congresso volta ao trabalho esta segunda e terça-feira, com uma agenda que tinha como ponto mais urgente passar legislação para impedir uma nova paralisação da Administração federal a partir de 9 de Dezembro, por falta de Orçamento. Mas agora, a ambição será muito maior. Os republicanos estão a preparar propostas para cortar impostos, repudiar o Obamacare e acabar com regulações impostas durante os mandatos de Obama – por exemplo, na área do Ambiente.
Planear as alterações na lei dos cuidados de saúde acessíveis para todos (Obamacare), “controlar a política externa” e analisar a reforma tributária são as coisas mais importantes da agência do Presidente Trump para os primeiros 100 dias, disse Reince Priebus à ABC. “Temos a oportunidade de fazer tudo isto, dado que temos [os republicanos] a Câmara dos Representantes e o Senado, um Congresso com pressa de fazer este trabalho”, afirmou.