Correia de Campos pede "especial atenção" às infecções nas unidades de cuidados a idosos
Panorama das infecções contraídas nos hospitais e outra unidades "está longe de ser aceitável" em Portugal, defendem autores de um estudo coordenado pelo ex-ministro da Saúde Correia de Campos.
É preciso reforçar o programa nacional de combate à infecção contraída nos hospitais e dedicar "especial atenção" ao que se passa nas unidades de cuidados continuados a idosos, recomendam os autores do estudo “Infecções Associadas aos Cuidados de Saúde: O Contributo dos Diagnósticos in Vitro”, que nesta terça-feira é apresentado no Porto pelo ex-ministro da Saúde, António Correia de Campos.
Apesar da significativa melhoria verificada nos últimos anos, o panorama das infecções associadas aos cuidados de saúde (IACS) em Portugal “está longe de ser aceitável, no contexto europeu”, defendem os especialistas responsáveis por este trabalho que foi encomendado pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica e é coordenado por Correia de Campos, através da empresa de consultoria com o seu nome.
O estudo é divulgado numa altura em que o problema das IACS tem estado na ordem do dia em Portugal, com a multiplicação de notícias de vários surtos de infecções com bactérias resistentes a antibióticos de largo espectro em hospitais do SNS.
Os especialistas recomendam “uma especial atenção” ao que se passa nas unidades de cuidados continuados a idosos e cidadãos em situação de dependência e defendem a integração do sector privado na recolha de informação e cumprimento das orientações nacionais. As “limitações” institucionais e estruturais das unidades de cuidados continuados, sobretudo as de longa duração e manutenção, condicionam “fortemente a dotação de profissionais de saúde, “gerando dificuldades acrescidas na implementação de programas de prevenção e controlo da infecção”, justificam.
Problema preocupante
Passando em revista o que tem sido feito no país e no estrangeiro para combater este que é um dos mais preocupantes problemas de saúde pública da actualidade, recordam que Portugal foi o país que apresentou a prevalência mais elevada de infecção hospitalar no estudo conduzido em 2012 pelo ECDC (European Centre for Disease Prevention and Control) — 10,6% dos doentes internados, quase o dobro da média dos países avaliados (29). Também o consumo de antibióticos, mesmo estando a baixar, era muito elevado (45,4% dos doentes em hospitais), levando a elevadas taxas de resistência, frisam.
Sem deixarem de destacar os avanços registados em Portugal — que tem projectos para controlo da infecção nos hospitais desde 1988, e, desde 2013, um programa que integra o controlo das IACS e a prevenção das resistências antimicrobianas —, os especialistas fazem referência aos resultados de um outro estudo já divulgado em congressos, mais ainda não publicado, que indica que as infecções associadas a cuidados de saúde representam 39% dos eventos adversos totais em hospitais, sendo mais frequentes do que os problemas surgidos após cirurgias, a toma de medicamentos ou as quedas.
Testes rápidos
Face a esta situação, aconselham que se analise a utilidade de “testes de diagnóstico rápido para reduzir o uso desnecessário de antibióticos”. Estes testes são mais caros do que os convencionais, mas podem reduzir o tempo de internamento e o recurso a antibióticos de mais largo espectro, sustentam, sublinhando que à indústria “caberá introduzir os seus produtos no mercado com preços não desencorajadores do seu uso generalizado”.
“É sobretudo necessário colher mais informação que habilite os decisores à escolha das melhores soluções. Nenhum Estado moderno pode travar a inovação. Se o tentar fazer numa visão míope de curto prazo, a inovação descontrolada invade-o”, consideram, acentuando que "em vez de repousar quase exclusivamente em estudos apoiados pela indústria, [o SNS] deveria congregar universidades e serviços de saúde, investigadores, clínicos, economistas”, especificam.
Tendo em conta a "escassa informação" sobre as consequências e custos do problema das IACS em Portugal, recomendam, além do reforço do programa de combate à infecção, a divulgação de casos de sucesso nacionais e internacionais e a promoção de estudos que permitam conhecer melhor a dimensão do problema.
A nível mundial, as projecções são assustadoras: se nada for feito entretanto, em 2050 morrerão por ano 390 mil pessoas na Europa e 10 milhões no mundo vítimas de infecções associadas aos cuidados de saúde.
O exemplo da Finlândia
A experiência do hospital da segunda cidade mais populosa da Finlândia é invocada pelos autores do estudo para demonstrar que é possível reduzir substancialmente a taxa de infecção, concretamente no que se refere à transmitida pelo microorganismo Staphylococcus aureus resistente à meticilina, que é um grande problema em Portugal.
No Hospital Universitário de Tampere, que em 2009 apresentava uma taxa de infecção de 15% com esta bactéria resistente à meticilina, conseguiu-se em poucos anos (2014) reduzir a percentagem para 2,5%. Como? Graças ao rastreio alargado dos doentes e a outras medidas de prevenção, nomeadamente o aumento da utilização de desinfectante das mãos.
O hospital finlandês tem ainda três médicos e três enfermeiros em dedicação exclusiva ao controlo da infecção e os serviços clínicos estão articulados com o laboratório de microbiologia. Todos os doentes em risco são internados em quartos de isolamento até que o laboratório envie o resultado das análises.