Não ao “CETA-cepticismo”
O CETA – Comprehensive Economic and Trade Agreement – é um acordo de livre comércio entre a UE e o Canadá. O CETA, pelo seu conteúdo e pela técnica normativa, é um marco na história das relações de comércio livre. O que não deve nem pode espantar: Canadá e UE são espaços em que vigora um modelo de “economia social e ambiental de mercado”. O padrão de respeito pelos direitos fundamentais, pela democracia, pelos direitos sociais, pelo ambiente e pela livre iniciativa não tem paralelo noutros espaços económicos do globo. De resto – e ao invés do que o preconceito ideológico para aí propala –, deixa-se na esfera de cada uma das partes a total autonomia para legislar em matéria de emprego e ambiente, garantida que seja a preservação dos padrões já atingidos! Mesmo o ponto crucial e sensível da competência para julgar diferendos, depois da tentação perversa de recorrer à velha “arbitragem selvagem”, culminou na criação de um tribunal permanente com juízes próprios nomeados antecipadamente (ICS – Investment Court System, no lugar do justamente mal-afamado ISDS). São já muitos os Estados que vêem no CETA o novo modelo de referência do comércio internacional.
Perante isto, que vemos? Vemos uma vaga nacionalista, protecionista e reacionária, na melhor linha de Trump, Le Pen e similares de esquerda. Ninguém ergue a voz contra o acordo recente da UE com o Vietname, onde padrões sociais e ambientais são fraquíssimos e a exploração de crianças e mulheres abunda; mas teme-se o acordo com o terrível Canadá, cujo grau de desenvolvimento humano pede meças à Escandinávia.
O livre comércio, tal como é compreendido no CETA, é a maior garantia de desenvolvimento sustentável no espaço global. O proteccionismo – que é a face “esquerda” do nacionalismo galopante à direita – está na moda. Mas ele fecha as sociedades, desincentiva a paz, condena centenas de milhões de humanos à pobreza endémica.
A demagogia proteccionista instou a Comissão a definir o CETA como um acordo misto, que assim tem de ser ratificado no nível europeu e no nível nacional. Eis a receita para o desastre, já anunciado pelo cada vez mais autocentrado Tribunal Constitucional alemão e pelo provinciano parlamento valão. Também faz caminho na Holanda, onde se quer bloquear o acordo com a Ucrânia, que será decerto mais eficaz politicamente do que qualquer avalanche de sanções à Rússia de Putin (também ela uma distinta nacional-proteccionista). Receio que atinja a lentíssima negociação com o Mercosul, de que o Brasil tanto carece, e que ganharia imenso em se antecipar ao TTIP. Esquece-se até que a paz na Colômbia deve algo à prosperidade que trouxe o acordo com a UE e o Perú de 2012. Percebo algumas reservas ao TTIP, mesmo que não as subscreva, dada a dimensão dos EUA e a baixa protecção social. Mas bloquear o CETA é matar a política comercial da UE, numa altura em que UE (vide Brexit ou baixo crescimento) e o mundo em geral mais precisam dela: económica… e politicamente!