O MAAT não é da EDP
A Fundação recebe da eléctrica praticamente as mesmas doações de 13 milhões de euros por ano.
O MAAT, o Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia que a Fundação EDP acaba de inaugurar, resgatou do abandono uma zona ribeirinha de Lisboa de condições excepcionais de enquadramento. Desafia diferentes disciplinas a entenderem-se e é uma oferta cultural e de lazer que excede as melhores expectativas de procura, quer dos portugueses, quer até dos turistas da geração tuc-tuc que andam como formigas à procura do carreiro.
À volta deste museu há um ponto que o distingue de muitos outros equipamentos. A Fundação EDP arrancou entre 2004 e 2005, nesse período áureo de subsídios e decisões políticas favoráveis ao sector da energia, que geraram o bolo de “rendas da energia”, odiado pelos consumidores e perscrutado pela troika. Hoje é a grande obra de responsabilidade social da EDP, a empresa que já foi monopolista e continua a ser a maior do sector da energia. Os tempos de então aconselharam a empresa a apostar numa nova imagem, face à percepção social de que os lucros que anunciava anualmente eram excessivos sem que houvesse contrapartidas óbvias para os consumidores. Fossem elas através da conta de electricidade ou por via de uma redistribuição para a comunidade.
A Fundação vive de três fontes de subsídios, que na verdade são uma mesma (o grupo EDP), e os valores não têm variado muito ao longo dos últimos tempos. Recebeu no ano passado. 13,7 milhões de euros, dos quais 7,2 milhões decididos pelos accionistas na assembleia geral, 3,6 milhões de euros da EDP Produção e os restantes 2,9 milhões da EDP Distribuição.
A receita da EDP que lhe permite alimentar a Fundação tem em grande parte origem num mesmo ponto, mesmo que pareça distante, ou seja, nas tarifas que cada consumidor paga, directa ou indirectamente. Olhando para o circuito do dinheiro será justo dizer que o MAAT não é da EDP. É dos seus clientes directos, que nas suas facturas mensais de electricidade contribuíram para ele. É dos 5,4 milhões de consumidores actuais de electricidade e dos mais de meio milhão no gás em Portugal; é do milhão na electricidade e dos mais 800 mil no gás em Espanha; é ainda dos 3,2 milhões de electricidade no Brasil. E por fim é um bocadinho dos clientes da EDP de países onde esta só na produção. França, Bélgica, Itália, Polónia, Roménia, EUA e Canadá. De uma forma ou de outra, no final deste enredo, está a casa do consumidor, qualquer que seja a fórmula de definição das tarifas que pagam as actividades necessárias até os electrões chegarem ao destino. Deste ponto de vista, o MAAT será de todos nós e a EDP, sua administradora.
Devolver parte dos ganhos, das referidas rendas à comunidade, pode ser construir um museu para os portugueses. Pode ser “levá-lo” a outros países, colocando-o “no mapa do circuito internacional da arte contemporânea”, como prometeu António Mexia, que chegou à presidência da EDP no ano em que a Fundação foi autorizada e, por isso, leva a sua marca.
Na estratégia de imagem, a Fundação é uma face importante da EDP. O relatório de 2015, calculava que a sua presença noticiosa na imprensa equivaleu, nesse ano, a 5,5 milhões de euros de valor publicitário. Agora junta-se o museu, prenunciando que esse valor vai saltar, de forma rentável. O novo equipamento à beira-rio equivale apenas a 0,6% de todo o investimento que a EDP fez nos três anos da sua construção, mas chamou 60 mil pessoas no primeiro dia, obrigou a encerrar uma ponte pedonal por riscos de segurança, a serem assumidos compromissos de construção de uma nova e a ser desenterrada a história mal contada de uma outra que está para nascer desde 2013.
Com estas obras a terminarem em Março de 2017, o MAAT promete que vai manter as entradas gratuitas nos próximos cinco meses. Cabe perguntar se a comunidade não terá direito a dele usufruir livremente para lá dessa data. Sempre.