O independente que dobrou os partidos

Neste caso da lei eleitoral autárquica, é caso para dizer que o independente mudou a lei. O que falta ainda é mudar os partidos e abrir mais a democracia.

Bem reclama o presidente da Câmara do Porto: como é que é possível os partidos políticos estarem isentos de IVA e os movimentos de cidadãos terem de pagar uma taxa de 23%? Como é que os partidos recebem subvenção pós-eleitoral e os cidadãos eleitos apartidários não terem direito a nada? Por alma de quem é que os independentes são representados, no boletim de voto, por um número romano? Ou, já agora, porque é que estes candidatos não podem mexer na sua lista de candidatos, mesmo que um desses candidatos (por azar terrível) possa falecer em plena campanha? 

Quando a Assembleia da República aprovou uma alteração à lei eleitoral autárquica e disse ao país que queria abrir a política aos independentes, deixou todos estes alçapões na legislação. Tão subtis que ninguém, até há poucos meses, os tinha identificado. Tão grandes que só cidadãos muito corajosos (ou poderosos) conseguiam desafiar. Quando, há três anos, vimos aparecer nas eleições autárquicas várias candidaturas destas, mas sair delas poucos presidentes sem cor política, nunca imaginámos que a luta fosse tão desigual.

É por isso que Rui Moreira tem toda a razão quando pede aos partidos, agora, que mudem a lei e abram espaço a quem vier. É por isso que faz todo o sentido que a Assembleia da República lhe dê ouvidos, a tempo de as próximas eleições autárquicas se disputarem em igualdade de circunstâncias.

O que também parece evidente é que nada aconteceria se a proposta não viesse do actual presidente da Câmara do Porto. Rui Moreira não é, como sabemos, um autarca qualquer. Por mérito próprio, embora com boa herança, Moreira conquistou aquela presidência, construiu uma coligação, ganhou popularidade e recolheu já o apoio de dois partidos para a corrida de 2017. Não será por acaso, de resto, que PS e CDS se disponibilizaram, agora, a mudar a legislação. Como não será por acaso que o PSD - o único partido que irá a jogo contra ele - ainda nada disse sobre o assunto.

A lei mudará - é pelo menos o mais provável nesta altura. Mas, a avaliar pelo processo, a lógica dos partidos ainda não se alterou. Assustados com a influência que as candidaturas independentes tiveram em 2013, os líderes partidários não tiraram a lição completa: para quem vota, o que conta é a confiança, a transparência e a ética. 

Neste caso da lei eleitoral autárquica, é caso para dizer que o independente mudou a lei. O que falta ainda é mudar os partidos e abrir mais a democracia.

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