Fabricante da “cadeira portuguesa” quer sentá-la perto do luxo
A Adico, fundada em 1920, vai levar o seu principal produto a Londres e quer dar-lhe mais valor.
Quando esta segunda-feira os utilizadores se aproximarem dos cerca de 4000 mil terminais da rede Multibanco que existem vão ler um agradecimento especial da Adico, a fábrica de móveis de ferro fundada por Adelino Dias da Costa em 1920. A campanha lançada pela empresa visa agradecer a todos os que tem vindo a usar a “cadeira portuguesa”, o seu mais importante ícone, e que integra um vasto repertório de referências da fábrica localizada em Avanca.
Poucos em Portugal terão ouvido falar da Adico, mas serão menos ainda os que não reconhecem o objecto em si, ou não tenham recordações de se sentar numa esplanada composta por estas cadeiras -- a Adico tem uma quota de mercado de 82% no segmento de mobiliário de ferro para o sector da restauração. A sua cadeira tem uma estrutura tubular, feita em aço curvado, com as duas pernas de trás a prolongarem-se para servir de apoio aos braços e à estrutura de encosto; depois, outros dois tubos de aço fazem as pernas dianteiras, e o tampo pode ser feito em aço, em madeira ou em ripas de madeira.
O principal produto da empresa não leva o nome de “cadeira portuguesa” há muito tempo. Até há duas décadas limitava-se a ser a 5008, a referência que era usada nos catálogos da Adico. Agora, o presidente executivo desta empresa familiar (ainda nas mãos dos descendentes do fundador), Miguel Costa Rodrigues, quer assumidamente vê-la reconhecida como um objecto de quase luxo.
A estratégia de Adico tem passado por reduzir o número de referências e por relançar alguns produtos do portfólio, melhorando-os. A última aposta passou pela colecção “Os clássicos da Adico”, adaptando-os às novas exigências da ergonomia (estamos mais altos, em média, dez centímetros, e há mercados com especificidades: na Dinamarca, as pernas têm de quatro centímetros mais altas) e, sobretudo, dando-lhes “o acabamento de qualidade e a embalagem que acredita que merecem”, diz Miguel Costa Rodrigues.
Uma certeza é a de que vão continuar a recusar produzir “marca branca”: “Não abdicamos de utilizar a nossa marca - já tivemos contactos nesse sentido, mas optamos por sacrificar o volume de negócios ao invés de ocultar a nossa marca. Queremos é acrescentar-lhe valor”, sublinha este responsável.
A empresa começou por produzir mobiliário hospitalar (camas e lavatórios em ferro, passando logo de seguida para mesas de operações hidráulicas e material de cirurgia), e já era uma referência nacional nos anos 30 quando desenvolveu uma linha de mesas e cadeiras para esplanadas de onde veio a surgir a “cadeira portuguesa”. Hoje, as exportações, que significam quase 20% na facturação da empresa, são quase integralmente referentes ao segmento do mobiliário metálico para restauração.
De olho no futuro
O gestor diz que há perspectivas de crescimento – embora poderão não ser imediatas, até porque espera fechar este ano com um volume de negócios de três milhões de euros, inferior aos 3,5 milhões de 2015. Mas acredita que está a reunir as condições para fazer uma aposta mais sustentada no mercado externo, onde só agora começa a ter uma estrutura de vendas.
“Quando todos apostaram nos mercados emergentes, nós apostámos sempre no mercado da primeira linha, aquele que pode melhor absorver o nosso produto, que queremos ver posicionado nos segmentos superiores”, explicar o gestor. Todos os meses envia produtos para Dinamarca, França, Itália ou Estados Unidos. Mas os mercados mais importantes são a Grã- Bretanha, a Holanda e a Alemanha: “Para estes já enviamos dois contentores por mês”, refere.
Parte do futuro passa por um novo investimento, de quase meio milhão de euros, destinado a melhorar o layout da fábrica da empresa e ampliar a área de produção.
No meio da nave principal da fábrica de Avanca - vai perder esse estatuto quando avançarem as obras para praticamente duplicar a capacidade de produção da fábrica - ainda cheira a tinta. O odor é do tanque com cor azul forte onde estiveram ser mergulhadas as cadeiras que vão ser enviadas para Londres e equipar a esplanada do bar que vai servir de apoio principal a uma das mais reputadas mostras de design da capital britânica, a TENT Londres.
Miguel Rodrigues mostra o produto, de ergonomia retocada (“quisemos redesenhar o clássico, mas respeitando-o, apenas o adaptando às novas realidades”, explica) para logo a seguir mostrar a embalagem com que vai expedir cada uma daquelas cadeiras: de marroquinaria, costurada individualmente, e com a marca Adico gravada a prata. Num bolso externo, um folheto vai a contar a história da empresa.
A participação em mostras de design é uma estratégia aplicada também no mercado nacional: no final de 2015 decorreu em Cascais a exposição de “homenagem à cadeira portuguesa”, com peças saídas da intervenção de meia centena de nomes, entre eles designers como Nini Andrade Silva, ou arquitectos como Siza Vieira. No final deste mês, a mesma exposição estará no Porto, na Casa Museu Guerra Junqueiro.
“Senti que tenho de devolver a cadeira portuguesa à Adico. Que toda a gente, em Portugal e no mundo, deve saber qual é a sua história verdadeira. Somos a empresa mais antiga em Portugal neste sector da actividade. E na Europa também só conheço a Thonet, alemã, que tem quase 200 anos”, diz Miguel Rodrigues. Para o gestor, a “cadeira portuguesa” já é “um ícone”, embora não saiba dizer quem foi o autor que a desenhou. “Não podemos atribui-la a ninguém. O autor é a Adico”, remata.