Exército sírio acusado de novos ataques químicos em Alepo
Bombas de cloro terão feito perto de uma centena de feridos em bairro controlado pelas forças rebeldes. Governo nega acusações.
O Governo sírio foi acusado de ter lançado um novo ataque de bombas de cloro sobre um bairro controlado pelos rebeldes nos arredores de Alepo. Pelo menos uma pessoa morreu e 70 ficaram feridas. As acusações são divulgadas a poucas horas do início de um encontro entre grupos da oposição em Londres, reunidos para discutir um projecto de transição política para a Síria.
Um vídeo divulgado pelos grupos rebeldes mostra crianças a tossir e a respirarem apenas com recurso a botijas de oxigénio, na sequência de um ataque no bairro de Sukkari. O cloro pode ter efeitos destrutivos para o organismo humano. No estado líquido, pode queimar a pele; quando é inalado, transforma-se em ácido clorídrico e queima os pulmões, provocando a morte (por afogamento) pela acumulação de líquidos.
Mais de 70 pessoas terão sufocado na sequência do mais recente ataque, esta terça-feira, de acordo com o Observatório Sírio para os Direitos Humanos — uma organização com sede em Londres que possui uma rede de informadores no terreno. Membros dos grupos oposicionistas dizem que as forças governamentais usaram um helicóptero para deixarem cair duas bombas de cloro, matando pelo menos uma pessoa e ferindo quase uma centena, segundo a Al-Jazira.
O Governo do Presidente Bashar al-Assad, que no passado já foi acusado de ataques semelhantes, negou ter levado a cabo os bombardeamentos. Uma fonte do exército sírio disse à Reuters que as forças sírias não usam "este tipo de armas". Os rebeldes que combatem o exército sírio são igualmente acusados por Damasco e pela Rússia de terem anteriormente usado gases tóxicos em ataques.
As denúncias do recurso a armas químicas pelas forças sírias contra a própria população não são novas. Em Agosto, uma investigação conjunta da ONU e da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ) concluiu que Damasco usou gás de cloro em ataques na província de Idlib em várias ocasiões, entre 2014 e 2015.
Há três anos, o regime de Assad comprometeu-se a destruir o seu arsenal químico, no âmbito de um acordo negociado com os Estados Unidos e a Rússia. Em causa estava a acusação de que o Governo teria ordenado uma série de ataques com gás sarin em Ghoutta, nos arredores de Damasco, em que terão morrido cerca de 14 mil pessoas. O Governo sírio negou sempre as acusações, mas aceitou abrir mão do uso e produção de armas químicas, evitando uma intervenção militar externa prometida antes por Washington.
O cloro não integra a lista de substâncias sujeitas a destruição — tem uma ampla aplicação industrial —, mas o seu uso com fins militares viola a Convenção para a Proibição das Armas Químicas, que a Síria ratificou na sequência do acordo com os EUA e a Rússia.
Oposição projecta futuro
Os combates pelo controlo de Alepo continuaram nos últimos dias, com uma nova ofensiva lançada pelas forças rebeldes para tentar reocupar território entretanto perdido. Aquela que era a maior cidade da Síria e centro comercial vibrante está totalmente devastada por vários anos de confrontos. A cidade encontra-se dividida há anos entre uma zona controlada pelo Governo, a oeste, e bairros rebeldes a leste. A ONU estima que 300 mil pessoas vivam em zonas cercadas de Alepo pelas forças sírias.
Londres recebeu esta quarta-feira um encontro que tenta sentar à mesma mesa os vários grupos de oposição ao regime de Assad, para tentar traçar um plano de transição política para a Síria. O chefe da diplomacia britânica, Boris Johnson, recebeu representantes do chamado Alto Comité de Negociações, uma organização que reúne mais de 30 grupos políticos e militares cujo único fim partilhado é a saída de Assad.
O projecto para o futuro político da Síria inclui um período de negociações de seis meses com o actual regime que irá culminar com a formação de um governo interino — sem Assad ou elementos do seu círculo próximo — para levar a cabo um processo de descentralização e a elaboração de uma nova Constituição. As eleições presidenciais e municipais seriam marcadas para daí a 18 meses.
Apesar de contarem com vários apoios internacionais, os planos de transição das forças oposicionistas parecem frágeis perante a realidade. A Rússia deverá bloquear qualquer tentativa de solução política que afaste Assad, um dos seus principais aliados na região. Para além disso, é incerto até que ponto o plano do ACN congrega o apoio efectivo de algumas das forças mais influentes que combatem o regime sírio, como por exemplo as Unidades de Protecção Popular curdas.
Pouco tempo depois do encontro, o governo sírio derrubou os planos traçados pela oposição, classificando-os de "loucos" e "inacreditáveis". "Deixem o povo sírio decidir o seu próprio destino (...). Não coloquem pré-condições sobre quem irá governar a Síria", afirmou o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Faisal Mekdad, citado pela BBC.
Entretanto, os EUA e a Turquia anunciaram um reforço na cooperação na Síria, que pode passar por uma ofensiva para tirar o controlo de Raqqa ao autoproclamado Estado Islâmico. "[O Presidente dos EUA, Barack] Obama quer fazer algumas coisas em conjunto em relação a Raqqa", disse o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, na sequência de conversações da cimeira do G-20, na China. Não houve qualquer confirmação por parte da Casa Branca. A Turquia iniciou recentemente a sua intervenção na guerra civil síria, depois de ter conseguido expulsar o grupo terrorista da cidade de Jarablus, muito próxima da sua fronteira. Porém, Ancara tem o objectivo de cortar os avanços das milícias curdas, que Washington tem apoiado.