Provedor de Justiça recomenda ao Governo a revisão do Programa Especial de Realojamento

Programa foi criado em 1993 para ajudar os municípios na demolição das barracas existentes e no realojamento dos respectivos moradores.

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Não parece, mas aqui mora gente. Há mais de 30 barracas de cartão sob um viaduto de Sete Rios Daniel Rocha

O provedor de Justiça, José de Faria Costa, recomendou ao ministro do Ambiente a revisão do Programa Especial de Realojamento (PER), "em prazo não superior a cento e oitenta dias", considerando que se trata de "um instrumento manifestamente desactualizado".

A recomendação do provedor de Justiça surge na sequência de "averiguação oficiosa de factos transmitidos pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos" e foi posteriormente secundada por uma queixa colectiva da Habita - Associação pelos Direitos à Habitação e à Cidade.

A Lusa questionou o Ministério do Ambiente, a quem foi dirigida esta recomendação, sobre o futuro do programa PER, mas até ao momento não obteve resposta.

"O assunto assume um cariz eminentemente social e a resposta não pode ser encontrada apenas pelos municípios, que não têm capacidade para suprir todas as situações em que se verifica a carência de habitação", defendeu o provedor de Justiça, na recomendação de 17 de Agosto. José de Faria Costa tem acompanhado desde 2012 as operações de despejo e de demolição de algumas habitações precárias executadas pela Câmara da Amadora nos bairros de Santa Filomena e 6 de Maio.

Para a presidente da associação Habita, Rita Silva, "esta recomendação ao Governo é histórica", uma vez que "nunca houve uma recomendação a pedir a alteração ao PER". 

Ainda assim, a Habita lamentou que, "ao longo dos últimos anos, milhares de pessoas" tenham sido "despejadas sem qualquer alternativa por vários municípios, com o município da Amadora à cabeça, com grande violência e atropelos aos direitos humanos", esperando que esta recomendação "provoque uma tomada de consciência junto da Câmara da Amadora". Em declarações à Lusa, Rita Silva sublinhou ainda que esta realidade não afecta apenas os bairros de Santa Filomena e 6 de Maio, ambos no município da Amadora.

Neste sentido, o provedor de Justiça disse estar "ciente de que o assunto em causa assume um cariz eminentemente social e que o problema ultrapassa largamente as fronteiras do município da Amadora e, bem assim, a sua capacidade de resposta a todas as situações de carência de habitação".

Além do provedor de Justiça, o Bloco de Esquerda (BE) também recomendou ao Governo medidas de actualização do programa PER, através de um projecto de resolução, entregue à Assembleia da República em Julho. "Passados vinte e três anos da sua criação, o PER já não corresponde ao seu objectivo: demolir para realojar com dignidade. Tende a transformar-se num programa que privilegia o despejo", advogou o BE, acrescentando que, "em alguns concelhos, cerca de 40% da população que habita há mais de uma década nestes bairros está a ser despejada sem que nenhuma alternativa lhe seja apresentada".

Criado através de um decreto-lei de 1993, o programa PER visa proporcionar aos municípios condições para procederem à erradicação das barracas existentes e ao, consequente, realojamento dos seus ocupantes em habitações de custos controlados. No primeiro recenseamento, o PER permitiu identificar mais de 48 mil famílias com necessidades de realojamento, mais de 33 mil delas na área metropolitana de Lisboa (AML) e 15 mil na área Metropolitana do Porto (AMP).

No âmbito dos 20 anos de funcionamento do PER, que se assinalaram em Maio de 2013, o Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) estimou que a taxa de execução do programa se situava entre os 92% e os 95% e que existiam ainda mais de três mil agregados por realojar nas duas áreas metropolitanas - 2500 em Lisboa, 800 no Porto.

Nessa altura, o presidente do IHRU, Vítor Reis, afirmou que o programa estava "num processo encaminhado para se encerrar a curto prazo", considerando que isso deveria acontecer em menos de cinco anos.