Portugal iniciou o encontro estruturado em 4x1x3x2. Bruno Alves substituiu Pepe, aposta inteligente de Fernando Santos porque permitiu controlar o jogo aéreo e aguentar o choque nos duelos directos. No entanto, o central procurou excessivamente as bola directas, o que facilitou o trabalho defensivo dos oponentes, que viam o jogo cair na sua “idealização estratégica” previamente elaborada.

A falta de confiança de Danilo no início de construção, não auxiliando a linha defensiva, (centrais desconfortáveis com bola e laterais bem vigiados) foi também uma das razões para a recorrência dessas ligações directas. João Mário relacionou melhor faixas com zonas interiores do que em anteriores encontros. Adrien e Renato Sanches conseguiram representar papéis distintos no "miolo". O médio do Sporting actuou claramente no corredor central, veio buscar jogo atrás para transportar e entregar com qualidade. Renato teve liberdade para a sua condução veloz e agressiva com remate, caindo também na ala para cruzar (já se verificaram dinâmicas sistemáticas que permitem identificar alguma recorrência de movimentos).

Nani e Ronaldo ficaram algo isolados na frente, desapoiados e sem auxílio por parte dos médios. Fernando Santos não está a conseguir extrair o melhor da sua principal figura. Cristiano Ronaldo desequilibra sempre que vem da faixa para o meio (apesar do cansaço e desinspiração notória do capitão, é incompreensível o desprezo destas movimentações por parte do técnico, também culpado no seu sub-rendimento).

O País de Gales apresentou-se num bloco baixo em 3x5x2, com os centrais Chester e Collins muito abertos e excelentes a sair com bola. Williams “em cima” de Nani, Collins pendurado literalmente em Ronaldo e Chester nas dobras.

Joe Allen, responsável pela ligação de sectores, foi muito bem condicionado pela marcação individual de Adrien (novamente destacado para perseguir e “deter”), inviabilizando a ligação com os restantes médios interiores, King e Ledley. Os alas, Taylor e Gunter, estavam preocupados com as acções de condicionamento e não conseguiram projecções ofensivas. A mobilidade de Kanu (centro-faixa) está eximiamente harmonizada com as deambulações supersónicas de Bale, sempre com o esférico colado ao pé (faixa-centro).

Os golos da selecção logo no início da segunda parte arrumaram com o jogo. Primeiro num canto, Ronaldo ganha a Chester e cabeceia para dentro (porque não ficou Collins que tinha ganho todas as bolas pelo ar?). O segundo nasce de uma subida do lateral esquerdo Raphaël, que centra para Ronaldo ganhar a segunda bola e rematar mal. Renato na linha da bola é inteligente na simulação e deixa Nani isolado para finalizar “deitado”.

Portugal chega ao final sem jogar a alto nível. Mas conseguiu algo mais relevante: desmistificar o “fado lusitano” da eterna injustiça das magníficas exibições não premiadas. “Chega de Saudade” da heroicidade não ungida com troféus, chega de lamentar a falta de “identidade” que não vence. Na final temos oportunidade para matar o determinismo fatalista do desencontro com a história; que esse encontro seja consumado com uma indefinição identitária, provando que o destino não estava traçado. Esta caminhada poderá fazer-nos finalmente repensar a pátria sem o enquadramento epopeico que a enforma. Que a nossa “caravela lá chegue”, mas por “rotas nunca antes navegadas”. Analista de futebol