O rei Ronaldo enfrenta o desafio do príncipe Bale

Portugal e País de Gales decidem quem estará na final de Paris, mas as grandes estrelas das duas equipas têm um confronto privado em Lyon, que pode ser crucial para a atribuição da Bola de Ouro.

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Bale e Ronaldo, as estrelas do País de Gales e Portugal AFP

A meia-final de Lyon, entre Portugal e o País de Gales, não se resume a uma partida entre duas selecções que sonham marcar presença na final de Paris e conquistar o maior troféu dos seus anais. Será também um duelo entre os dois mais caros jogadores de sempre do futebol mundial que, juntos, levaram o Real Madrid a investir quase 200 milhões de euros nas suas contratações. Um embate entre duas estrelas que transcendem as próprias nações que representam. Um frente-a-frente entre duas personalidades fortes, com caracteres diferentes, que coexistem no mesmo clube e que lutam pela glória e por um lugar na história. E, finalmente, mas não menos importante, poderá ser um capítulo determinante para a atribuição da Bola de Ouro de 2016, que premeia o melhor jogador do mundo.

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A história está repleta de grandes futebolistas de classe mundial que falharam os grandes torneios internacionais porque as suas selecções não eram suficientemente fortes. Não foi o caso de Gareth Bale. O atacante, de 26 anos, alcançou o sucesso que falhou a lendas galesas como Ian Rush, Ryan Giggs, Gary Speed ou Mark Hughes. Depois de 58 anos sem marcar presença em nenhum palco das grandes competições, a mais pobre e menor nação britânica (três milhões de habitantes) conseguiu um inédito apuramento para o Euro 2016 e Bale foi determinante para este marco.

Esteve envolvido em nove dos 11 golos da campanha de qualificação do País de Gales, marcando sete e somando duas assistências. Em França, contagiou toda a equipa para um glorioso percurso que culmina nesta meia-final, depois de ter vulgarizado a poderosa Bélgica, candidata ao título, nos quartos-de-final (3-1). Aconteça o que acontecer em Lyon, já gravou o seu nome neste Europeu.

Mais discreto, até ao momento, foi o papel de Cristiano Ronaldo no torneio. O que não quer dizer que não tenha sido fulcral para Portugal estar ainda em prova. Os seus dois golos e uma assistência frente à Hungria, na última partida da fase de grupos, salvaram a selecção do abismo e da vergonha. A sua acção no lance que originou o golo do triunfo frente à Croácia, nos oitavos-de-final, voltou a permitir ao país sonhar. Mas, já na qualificação, o madeirense deixara bem nítida a sua marca, assinando cinco dos 11 golos, que valeram nove dos 21 pontos conquistados.

Mas o estatuto global de CR7, que chegou a França como a grande figura da competição, centrando todas as expectativas, exige sempre mais. Se no Real Madrid já conquistou a imortalidade e não tem nada a provar, na selecção ainda não construiu uma história compatível com o peso do seu nome. Falta-lhe um título com a camisola portuguesa. Em sete presenças acumuladas em fases finais (entre Europeus e Mundiais), foi na sua estreia, no Euro português de 2004, que esteve mais próximo de alcançar esta meta, acabando por perder a final para uma surpreendente Grécia. Oito anos depois, no Euro 2012, voltou a cheirar a glória, mas a equipa sucumbiria nas meias-finais, frente à Espanha, que se sagraria bicampeã.

“Sonho de criança”

Já para Gareth Bale, à frente de uma selecção sem tradição nos grandes eventos mundiais, o Euro 2016 surge como uma oportunidade única para si e para o seu país. Ele próprio o assume: “Este é o ponto mais alto da minha carreira. Era o meu sonho de criança jogar num torneio destes com a camisola do meu país”, admitiu, com um inconfundível brilho nos olhos, instantes depois de o País de Gales ter garantindo a qualificação. E deixou uma promessa, que soa agora como premonição: “Isto não acaba aqui, temos coisas para fazer em França.”
A sua dedicação e entrega à selecção são desmedidas. Disponibilizou-se sempre para jogar os encontros particulares, por mais insignificantes que fossem, para construir um grupo sólido, coeso, fraterno. Uma equipa que logrou alcançar equilíbrio e, ao mesmo tempo, potenciar e ampliar o impacto da sua grande estrela no conjunto.

É também o que Portugal tem procurado neste Europeu, nem sempre com o sucesso desejável. Mas a selecção de Fernando Santos tem outros argumentos no plantel, com jogadores tecnicamente evoluídos, capazes de compensar o colectivo quando a sua maior referência atacante não está no pico da inspiração. Maiores dificuldades terá, teoricamente, o País de Gales em encontrar alternativas às suas grandes individualidades, como será o caso do médio do Arsenal Aaron Ramsey, que está castigado e não irá alinhar em Lyon.
Ronaldo mais desgastado

Um outro factor que tem pesado na comparação entre as prestações de Ronaldo e Bale neste Europeu é físico. O galês chegou a França muito menos desgastado do que o seu colega do Real Madrid. Ao longo desta temporada alinhou “apenas” em 31 partidas (19 golos) pelo seu clube, antes de iniciar a preparação para o torneio, devido a uma lesão. Já o português terminou a época em Espanha com 48 jogos acumulados (51 golos). E mesmo nas cinco partidas já disputadas em França, o madeirense conta mais 67 minutos nas pernas do que o seu rival, que nunca teve de enfrentar um prolongamento.

Muito estará em jogo para estes dois enormes futebolistas, que não têm exactamente uma relação de amizade no clube que ambos representam. Robson-Kanu, companheiro de selecção de Bale, expressou a sua opinião sobre o estatuto das duas vedetas no “gigante” espanhol: “Ronaldo é considerado como o principal homem no Real Madrid neste momento, mas eu acho que está na hora de ele passar esse manto a Gareth, que está pronto para assumir o estatuto.”

É também uma questão de hierarquia real que estará em jogo esta noite, em Lyon: o rei Ronaldo enfrenta o desafio lançado pelo príncipe Bale.

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