Há colégios impedidos de abrir novas turmas?
Os colégios com contratos de associação estão impedidos de abrir novas turmas de início de ciclo no próximo ano lectivo? Não, só que para tal passarão a depender do rendimento das famílias e não do financiamento do Estado.
A frase
O contexto
A correcção do deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro surge após semanas de informação e debates sobre os colégios com contratos de associação, que são aqueles que têm financiamento do Estado para garantir ensino gratuito aos seus alunos, tal como acontece nas escolas públicas. Estes acordos começaram a ser celebrados nos anos 80 do século passado, numa altura em que a escolaridade obrigatória passou de seis para nove anos e em que a rede pública era deficitária em várias regiões do país. Uma carência que impedia o Estado de cumprir o preceito constitucional que determina que é sua obrigação garantir o acesso universal e que o levou a delegar no sector privado esta responsabilidade nas zonas onde ainda não existiam escolas públicas. Foi este princípio de dependência em relação à oferta pública que o Ministério da Educação (ME) veio agora evocar para cortar o financiamento a 383 turmas de início do ciclo (5.º, 7.º e 10.º ano) de 39 dos 79 estabelecimentos que actualmente têm contratos de associação.
Os factos
O Ministério da Educação informou que o corte no número de novas turmas financiadas pelo Estado teve na base quatro critérios: a existência de escolas públicas na vizinhança de colégios com contratos, a sua lotação actual, o estado de conservação destas e a disponibilidade de transportes públicos. Os serviços centrais do ministério começaram por concluir que existia “redundância” da oferta (pública e privada financiada pelo Estado) em 73% das turmas de início de ciclo que foram aprovadas em 2015. Este valor baixou depois para 57%.
Esta decisão tem motivado inúmeros protestos dos colégios, que acusam o ministério de ter passado uma “verdadeira certidão de óbito” ao sector, prognosticando o encerramento de mais de metade dos colégios financiados. Também acusam o ME de não respeitar os contratos celebrados em 2015 e que pela primeira vez deixaram de ser anuais para ter um prazo de vigência de três anos. O ME argumenta, pelo seu lado, que estes acordos só obrigam a manter a continuidade dos ciclos iniciados pelos alunos nas 656 novas turmas que garantiram financiamento em 2015. Por cada turma financiada, o Estado paga 80,5 mil euros/ano aos colégios, um valor que em 2011 rondava os 114 mil euros.
Os 39 colégios que viram o financiamento cortado vão perder 31 milhões de euros em subsídios do Estado no próximo ano lectivo. A Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (Aeep) tem afirmado que aqueles estabelecimentos perderão, devido a estes cortes, cerca de dez mil alunos já no próximo ano lectivo.
Este número radica numa expectativa que não é passível de ser desde já comprovada, ou seja, a de que em 2016/2017 o número de alunos inscritos nas turmas iniciais de ciclo nestes colégios será igual aos que se matricularam em 2015/2016. Por outro lado, os colégios afectados não perderam a sua autorização de funcionamento, pelo que têm liberdade de abrir o número de turmas que queiram desde que tenham alunos com famílias que possam pagar as propinas que cobram e que até agora eram custeadas pelo Estado.
Acresce ainda o facto de estes agregados poderem também candidatar-se aos chamados contratos simples, uma modalidade em que o financiamento é atribuído às famílias e não aos colégios, podendo cobrir cerca de metade do valor das propinas. Mas, para terem acesso a esta prestação, o agregado familiar dos alunos não poderá usufruir de um rendimento per capita superior a 541 euros. Em 2014, último ano com dados, o número de alunos com contratos simples rondava os 22 mil.
Em resumo
O deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro tem razão ao afirmar que estes colégios não estão impedidos de abrir novas turmas. A única e substancial diferença é que não terão esta possibilidade como adquirida, como sucedeu até agora apenas por uma razão: terem financiamento do Estado para propiciar ensino gratuito aos seus alunos. A partir do próximo ano lectivo, se a justiça não lhes der razão, a frequência das novas turmas de início de ciclo dependerá do rendimento disponível das famílias que pretendam ter os seus filhos no ensino particular, como, aliás, é o caso da maior parte dos colégios.
Resta ainda saber se a maioria dos agregados com filhos nos colégios com contratos de associação não tem meios para passar a pagar as propinas, como tem alegado a Aeep. Refira-se, a propósito, que em alguns dos casos mais emblemáticos de concorrência às escolas públicas, registados em Coimbra e nas Caldas da Rainha, a percentagem de alunos carenciados não ultrapassava os 35%, sendo mesmo de apenas 1,1% no Colégio Rainha Santa Isabel, localizado na cidade do Mondego.