Media iranianos renovam fatwa contra Salman Rushdie
Quem assassinar o autor de Versículos Satânicos recebe uma recompensa suplementar de mais de 500 mil euros oferecida por meios de comunicação social ligados ao regime de Teerão.
Quarenta meios de comunicação estatais ou semi-estatais iranianos ofereceram uma recompensa conjunta de 600 mil dólares (cerca de 544 mil euros) a quem executar a fatwa contra o escritor Salman Rushdie lançada pelo ayatollah Khomeini em 1989, após a publicação do romance Versículos Satânicos.
A notícia foi avançada pela agência Fars, fortemente conotada com o regime, que doou ela própria mil milhões de riais (mais ou menos 27 mil euros) para este fundo, criado a pretexto do aniversário da fatwa original, que o fundador da revolução islâmica anunciou na rádio no dia 14 de Fevereiro de 1989.
Não é a primeira vez que é aumentado o prémio pecuniário prometido a quem execute a sentença de morte imposta ao escritor – em 1997, a fundação 15 de Khordad (o nome alude à data das grandes manifestações de 1963 contra a prisão de Khomeini pelo regime de Reza Pahlevi) já tinha subido a parada de dois para 2,5 milhões de dólares –, mas a circunstância de esta nova recompensa envolver dezenas de órgãos de comunicação social torna-a particularmente ameaçadora.
Há muito radicado no Reino Unido, mas nascido na Índia e descendente de uma família muçulmana, Rushdie foi acusado de blasfémia por Khomeini, que estendeu a sua sentença a todos os envolvidos na publicação de Versículos Satânicos.
O romancista viveu longos anos escondido e sob protecção policial do governo britânico, e teve ainda assim melhor sorte do que os seus tradutores japonês e italiano: Hitoshi Igarashi foi mortalmente apunhalado e Ettore Capriolo, também esfaqueado, acabaria por sobreviver. E julga-se que o atentado de 1993 contra o editor norueguês de Rushdie, William Nygaard, baleado com três tiros nas costas, esteja igualmente relacionado com a fatwa proclamada em 1989.
O gesto de Khomeini levou o Reino Unido a quebrar as suas relações diplomáticas com o Irão, e foi justamente para conseguir reatá-las que, em 1998, o governo iraniano, então liderado por Mohammad Khatami, assegurou publicamente que não promoveria ou apoiaria operações destinadas a assassinar Salman Rushdie.
Mas a ordem de 1989 nunca foi oficialmente abolida e, em 2005, o sucessor de Khomeini, o ayatollah Ali Khamenei, afirmou que a fatwa continuava em vigor. A mesma posição foi também já assumida pela Guarda Revolucionária, e o regime tem argumentado que a fatwa só pode ser retirada pelo seu autor, ou seja, Khomeini, que morreu em Junho de 1989, poucos meses após a ter lançado.