Governo confiante que já satisfez as exigências da Comissão para o OE
Foi atingido esta quinta-feira um acordo sobre o efeito de redução do défice estrutural implícito nas medidas do OE. O anúncio da decisão dos comissários em Bruxelas chega esta sexta-feira à tarde.
A um dia de a Comissão anunciar o resultado final da sua avaliação ao Orçamento português, as negociações entre o Governo e as autoridades europeias registaram, nas últimas horas, avanços significativos, com fonte governamental a afirmar ao PÚBLICO que se chegou finalmente a um entendimento entre as duas partes sobre o esforço de redução do défice estrutural conseguido e que este fica dentro da margem que tem sido exigida por Bruxelas. Falta apenas, do lado da Comissão, uma confirmação política do acordo.
Esta sexta-feira, o colégio de comissários da Comissão Europeia reúne-se para tomar a sua decisão e a expectativa do lado do Governo é que Portugal terá conseguido evitar que o seu OE seja classificado como estando em “incumprimento particularmente sério” das regras orçamentais europeias.
De acordo com a mesma fonte, foi apenas nesta quinta-feira que se conseguiu chegar a um entendimento em relação às medidas necessárias para que Portugal consiga apresentar este ano um valor para o défice estrutural que seja aceitável para Bruxelas. O Governo consegue, num número validado pelos técnicos da Comissão Europeia, apresentar uma redução do défice estrutural (o défice que retira da análise o efeito da conjuntura económica e as medidas de carácter extraordinário) situada entre 0,25 e 0,3 pontos percentuais.
Este valor não é exactamente o que a Comissão Europeia queria à partida mas é muito mais favorável do que aquele com que se iniciaram as negociações e pode cair dentro da margem aceite por Bruxelas para não declarar que o OE português está em “incumprimento particularmente sério” e poder dizer apenas que está “em risco de incumprimento”.
A diferença entre estas duas expressões vai além da simples semântica. No primeiro caso, significaria que Portugal teria que apresentar uma versão revista dos seus planos orçamentais, algo que seria inédito na UE. No segundo caso, o que aconteceria seria “apenas” a divulgação pública de uma avaliação com críticas e avisos, algo que já aconteceu com outros países no passado, incluindo Portugal.
O facto de nas previsões de Inverno divulgadas esta quinta-feira, com base nos dados apresentados pelo Governo na versão inicial do esboço do OE antes das negociações, a Comissão Europeia apontar para um agravamento do défice estrutural português de um ponto percentual mostra bem a dimensão da diferença de posições com que as duas partes partiram para a discussão.
O desejo base da Comissão era que Portugal apresentasse um OE que cumprisse estritamente a recomendação do Conselho da UE, isto é, que previsse uma redução do défice estrutural de 0,6 pontos percentuais durante este ano. Mas no esboço do OE entregue à Comissão há duas semanas, não só o Governo não apontava para uma redução do défice estrutural tão grande (previa apenas um corte de 0,2 pontos percentuais), como chegava ao seu resultado com contas que Bruxelas não aceitava, ao considerar como extraordinárias medidas no valor de 1923 milhões de euros.
De acordo com as contas da Comissão, as medidas previstas no esboço do OE português conduziriam não a uma redução do défice estrutural, mas sim a um agravamento de um ponto percentual. Deste modo, a diferença entre o que a Comissão queria (corte do défice estrutural de 0,6 pontos) e aquilo que observava na proposta portuguesa (um agravamento de um ponto) ascendia a 1,6 pontos percentuais do PIB.
Ao longo das negociações foi preciso ir reduzindo esse diferencial. Primeiro as autoridades portuguesas começaram por conseguir convencer Bruxelas a aceitar que se classificassem pelo menos uma parte das medidas como extraordinárias. Não foram todas as que o Governo queria, apenas algumas, num valor que é equivalente a 0,3 pontos percentuais, segundo fonte governamental.
Depois, seguiu-se a apresentação de medidas adicionais, a maior parte delas relacionada com um aumento de impostos sobre o consumo, com o agravamento da tributação de bens como os combustíveis e os automóveis, por exemplo.
Só no final, após discussões detalhadas sobre o impacto de cada uma das medidas, as duas partes concordaram que, com as medidas apresentadas, é possível acreditar que o défice estrutural irá registar uma descida este ano situada entre os 0,25 e os 0,3 pontos percentuais. A Comissão, que tem como meta ideal uma redução de 0,6 pontos percentuais, transmitiu sempre a ideia durante as negociações que falhar essa meta por uma margem não superior a 0,4 pontos percentuais pode ser suficiente para o país não chumbar neste exame.
Aliás, no ano passado, com a França e a Itália, foi isso que sucedeu. Os dois países não cumpriram exactamente a meta para o défice estrutural que lhes tinha sido apresentada mas ficaram próximo e isso chegou para que a avaliação da Comissão fosse apenas a de considerar que havia “riscos de incumprimento”, em vez do “incumprimento particularmente sério”. É isso que o Governo está agora confiante que aconteça no caso de Portugal, esperando a decisão final que irá ser tomada a nível político esta sexta-feira.
Do lado da Comissão Europeia, Pierre Moscovici afirmou logo de manhã, quando divulgou as previsões de Inverno da instituição, que as negociações ainda estavam a decorrer e que ainda era cedo para falar de um acordo com as autoridades portuguesas. Mas também reconheceu que as novas propostas entretanto apresentadas pelo Governo iam “na direcção certa”.
Bruxelas anunciou igualmente que o Colégio de Comissários se irá reunir às 14h de Bruxelas (13h de Lisboa) esta sexta-feira para tomar a decisão definitiva. Na Comissão, há diferentes sensibilidades sobre a forma como se deve agir perante países que não cumprem as metas orçamentais definidas. Alguns comissários, como o vice-presidente Valdis Dombrovskis e o finlandês Jyrki Katainen, são geralmente associados à linha mais dura de defesa das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Para Portugal, apesar da confiança do Governo de que conseguiu satisfazer as exigências de Bruxelas, o balanço de forças político dentro da Comissão poderá ser o factor crucial na decisão.