PSD e CDS sequestrados
O sonho de regresso rápido ao poder enfraquece os dois partidos.
Como será o CDS sem Paulo Portas? Há quem fale do risco de balcanização, outros preferem sublinhar o período de relativo apagamento do partido que se seguirá à saída de um líder tão carismático. Uma liderança de 16 anos é muito tempo e o CDS deve-lhe a ressurreição depois de ter mergulhado num destino que parecia irremediavelmente apostado em conduzi-lo à exiguidade e à irrelevância política. Moldou-o depois à sua imagem e semelhança numa fusão tão perfeita como perigosa nas suas incoerências e nos seus excessos. Olhando para trás, hoje já é possível perceber que Portas foi sentindo necessidade crescente de dar palco a outros protagonistas, talvez preparando esta saída tão inesperada e, no entanto, tão previsível. Mas se nas fileiras partidárias se vive um sentimento natural de orfandade, é inevitável que o tempo acabe por estender essa sensação de vazio a toda a direita, cuja falta de rumo só não se torna mais evidente porque há uma campanha presidencial em curso e porque Passos Coelho tem tentado aqui e ali ocupar esse lugar inóspito que é o espaço do PSD-CDS, despido agora de poder.
Sem Paulo Portas, esse bloco a várias cambiantes que é hoje a direita portuguesa perde massa crítica, agilidade e uma imensa experiência política, mas fica também mais gelatinoso do ponto de vista doutrinário. Sem Portas, a direita social corre o risco de se evaporar de vez e talvez esse seja um dos aspectos mais trágicos da herança dos anos da troika em Portugal.
Começa agora a discussão sobre o futuro do CDS. Não se vislumbra grande rasgo nesse debate, pois não é previsível que a ideologia desça ao terreiro do próximo congresso. O momento é de pragmatismo e talvez tudo se decida apenas na base de quem é a figura capaz de garantir a proximidade do CDS ao actual líder do PSD. Três meses depois do 4 de Outubro, Passos continua sem conseguir fazer uma leitura desapaixonada dos resultados das eleições, mantendo a direita suspensa da ilusão de que é possível erguer a PaF dos escombros e voltar a governar o país. Essa ilusão de um regresso rápido ao poder está a sequestrar os dois partidos e até a impor soluções. O PSD mostra-se irreconhecível no esplendor do seu ruidoso silêncio. Há uma situação política inteiramente nova e capaz de abalar o sistema político tal como se conhece e o partido que até teve mais votos nas eleições não debate, nem tem projecto, nem ideias. O CDS, por seu lado, vira-se para dentro por imposição da saída de Portas, que por si só já é a confissão de que a PaF foi um tempo que passou.
Tudo indica que Assunção Cristas será a próxima líder do CDS. Uma mulher conservadora, católica, com carreira profissional, mãe de quatro filhos, por quem Passos Coelho nutre uma enorme simpatia. Ainda não tem uma década de militância no partido, mas Nuno Melo, o rei do aparelho, garante-lhe o apoio da máquina. A balcanização do partido, temida por Melo, não é para já. Mas começa agora.