Os alunos progridem mais numa escola que é quase da família

Na Póvoa de Lanhoso, muitos dos professores já tinham dado aulas aos pais dos actuais alunos. Estabilidade do corpo docente apontada como fundamental nas secundárias onde mais se progride todos os anos.

Foto
Na secundária de Póvoa de Lanhoso a atenção aos alunos é quase personalizada PÚBLICO

Dina Rei está com quatro alunos numa das salas do bloco C da Escola Secundária de Póvoa de Lanhoso. “Não devias estar na sala de estudo?”, pergunta, descontraído, o director José Ramos. A sala de estudo fica num outro bloco, no topo do estabelecimento de ensino. Era o antigo refeitório, que foi transformado num espaço onde os estudantes podem usar os tempos livres para tirar dúvidas às várias disciplinas. Um espaço que é um dos motivos de entusiasmo do director quando apresenta as estratégias que colocaram esta escola do distrito de Braga entre uma “elite” que, sistematicamente, tem feito os seus alunos progredir mais do que a média nacional ao longo do ensino secundário.

Na porta da sala de estudo há um horário afixado que dá a conhecer os professores e as matérias disponíveis a cada hora do dia. Era ali que Dina Rei devia estar, juntamente com duas colegas de Inglês. “Prefiro vir para esta sala porque tenho quadro se for preciso escrever alguma coisa”, justifica a professora de Matemática – “uma das mais exigentes” da escola, garantem os colegas.

A mudança de local decidida pela docente não preocupa o director. Para ele, é a possibilidade de os estudantes poderem ter um professor disponível para rever matéria ou resolver um problema em que tenham maiores dificuldades que importa, mais do que o local em que isso acontece.

Mas José Ramos entusiasma-se com a sala de estudo. Tal como se entusiasma quando apresenta os restantes elementos da direcção da escola. São eles que “lêem todas as actas” dos conselhos de turma e “estão atentos” aos primeiros sinais de que pode ser preciso reforçar as aprendizagens a uma ou outra disciplina. No ano passado, a escola de Póvoa de Lanhoso pediu um professor de apoio a Matemática com os créditos horários que lhe foram atribuídos pelo Ministério da Educação como “prémio” por se distinguir em termos de eficácia educativa. Este ano, pondera fazer o mesmo com o Português. “Vamos fazendo o diagnóstico a cada passo e criando as respostas mais adequadas em cada momento”, explica o director.

É esta atenção quase personalizada aos problemas de cada uma das turmas que parece estar na base do sucesso desta escola do Minho que, nos últimos quatro anos lectivos, esteve sempre entre as 25% que fizeram os seus alunos progredir mais entre o 9.º e o 12.º ano (ver texto sobre o novo Indicador da progressão dos resultados).

O estabelecimento de ensino não é pequeno, há 810 estudantes no ensino secundário, mas tem um certo ambiente familiar que facilita o contacto mais diferenciado com os alunos. Enquanto percorre a escola, José Ramos aborda os alunos no recreio – “não há aulas?”; nas escadas – “então como correu o teste?”; ou no bar.

Ter um corpo docente estável conta...

A Escola Secundária Daniel Faria, em Baltar, no concelho de Paredes, está no extremo oposto daquele em que se encontra a da Póvoa de Lanhoso: os seus alunos estão sistematicamente entre os que menos progridem a Português e Matemática entre o 9.º e o 12.º ano. O director, António Aguiar, reconhece que a escola “não tem uma imagem positiva”: “Quem vir os rankings nos últimos anos, percebe que a escola não tem tido bons resultados.” Tem estado sempre no último terço da tabela – no ano passado estava em 561.º, este ano subiu ligeiramente para 501.º em quase 600 escolas onde se realizaram pelo menos 50 provas de exame. É preciso “fazer um esforço para que os alunos fiquem na escola”, reconhece.

Esse trabalho também é necessário para manter por perto os professores do quadro: a proximidade do Porto faz com que muitos docentes tentem uma colocação numa das escolas da segunda cidade do país, tornando o corpo docente algo instável.

A estabilidade dos professores é, precisamente, um dos factores apontados para o sucesso neste novo indicador do trabalho das escolas por dois dos estabelecimentos públicos que mostram maior capacidade de fazer progredir os seus alunos. “Dos 137 docentes que temos, apenas 11 são contratados”, valoriza o director da Secundária de Ponte da Barca, Carlos Louro.

O mesmo acontece na escola de Póvoa de Lanhoso. Foi criada há 25 anos e quase dois terços do corpo docente estão ali a dar aulas desde esse tempo. Muitos foram já professores dos pais daqueles que são agora seus alunos, uma circunstância que reforça o vínculo entre a comunidade local e o estabelecimento de ensino. “Isto também nos ajuda a ter sucesso”, reforça Ramos. Além disso, a estratégia da escola é manter o mesmo professor com a turma ao longo dos três anos do secundário, garantindo a permanência de algumas “cumplicidades”.

... conhecer bem os alunos também

Há alturas em que as diferenças entre o ensino público e privado se esbatem na hora de analisar as causas dos bons resultados. Tal como na secundária da Póvoa de Lanhoso, o Colégio S. Tomás, em Lisboa, está também entre as seis escolas que garantem maiores progressões aos seus alunos durante o secundário. Aqui, há uma “aliança com os pais” que ajuda muito “à confiança das famílias” no trabalho que é feito no colégio. Essa relação permite que muitos dos 180 alunos desta escola particular façam quase toda a sua formação criando um “embalo de qualidade”. “Os melhores alunos em geral são os que estão connosco há mais tempo”, destaca Isabel Almeida e Brito, directora do colégio criado há 12 anos e que apenas há sete tem ensino secundário.

Esta continuidade permite também aos professores do secundário terem conhecimento mais profundo sobre o que foi o percurso dos alunos no 3.º ciclo. Numa escola pública, pelo contrário, ter essa noção “não é fácil”, queixa-se Mário Moreira, coordenador do ensino básico no agrupamento de escolas de Póvoa de Lanhoso. Além dos alunos que terminam o básico na escola, a secundária da vila minhota recebe também os estudantes da outra escola do 3.º ciclo do concelho. Apesar de conhecer as médias das notas no 9.º ano, porque os dados são públicos, é pouca a informação que recebem quando os alunos chegam ao início do ensino secundário. “Normalmente o 1.º período serve para vermos em que águas navegamos”, ilustra.

Recolher esta informação é importante para perceber rapidamente com que alunos a escola vai ter de lidar. E isso é especialmente relevante para escolas que, como as duas públicas que conseguem destacar-se neste indicador, estão em regiões desfavorecidas. Na Secundária de Ponte da Barca, mais de metade dos alunos são provenientes de famílias que têm rendimentos tão baixos que estão abrangidos pelos apoios estatais da Acção Social Escolar e os únicos transportes públicos que circulam no território são os escolares. Na Póvoa de Lanhoso é a emigração que pesa: o agrupamento, criado há três anos, tinha 1700 alunos, neste momento são menos 300. Numa das escolas do 1.º ciclo, havia 200 alunos em 2012, hoje são apenas oito, no pré-escolar. O director José Ramos desabafa: “Se for a Zurique, se calhar tem mais alunos de cá do que aqui na escola.”

Sugerir correcção
Comentar