Um salmão transgénico em breve no prato dos norte-americanos
Após quase 20 anos de controvérsia, peritos consideraram que um salmão transgénico desenvolvido por uma empresa norte-americana não apresenta riscos para a saúde e que é nutricionalmente semelhante ao salmão natural.
As autoridades sanitárias dos Estados Unidos autorizaram na quinta-feira o consumo humano de um salmão geneticamente modificado – o primeiro animal transgénico a chegar ao prato dos norte-americanos –, apesar das críticas de associações de consumidores que receiam que isso seja perigoso para a saúde e o ambiente.
O salmão transgénico em questão foi desenvolvido pela empresa de biotecnologia AquaBounty Technologies, do Massachusetts. “Na base de uma análise completa dos elementos científicos” fornecidos pela empresa que o desenvolveu, o salmão AquAdvantage “preenche as condições regulamentares”, sendo “próprio para consumo humano”, estimou a agência federal norte-americana do medicamento e da alimentação (FDA).
A decisão da FDA foi anunciada após anos de controvérsia em torno deste peixe, que é um salmão do Atlântico ao qual foi injectado um gene do salmão chinook do Pacífico para o fazer crescer duas vezes mais depressa. Pode assim atingir o seu tamanho adulto em 16 a 18 meses, em vez dos 30 meses que costumam ser necessários ao salmão do Atlântico.
As autoridades sanitárias consideraram que o salmão AquAdvantage é “tão apto para consumo e tão nutritivo como os outros salmões não transgénicos do Atlântico e que não existem diferenças biológicas notáveis entre o perfil nutricional do salmão AquAdvantage e o dos outros salmões de aquacultura do Atlântico”, explicou a FDA em comunicado.
O salmão AquAdvantage só pode ser criado em terra, em tanques fechados e situados em duas instalações específicas, no Canadá e no Panamá, salienta ainda a FDA, acrescentando que, de facto, a autorização “não permite que o salmão transgénico seja concebido e criado nos EUA”.
Rotulagem não obrigatória
As associações de defesa dos consumidores tinham considerado que este salmão poderia ser perigoso para a saúde humana e que apresentaria riscos para os outros peixes se fosse libertado na natureza. Também tinham reclamado que o salmão transgénico fosse rotulado como tal.
Porém, de acordo com a lei norte-americana, o rótulo apenas é obrigatório em caso de “diferença material, tal como um perfil nutricional diferente” entre o produto transgénico e o seu homólogo natural. Ora, “no caso do salmão AquAdvantage, a FDA não encontrou qualquer diferença”, explica aquela agência federal, que no entanto publicou recomendações para quem deseje rotular voluntariamente este salmão.
Na ausência de rotulagem – e para evitar comer salmão transgénico -, os consumidores podem sempre comprar salmão que não seja de criação, sugeriu na quinta-feira um representante da FDA durante uma conferência telefónica.
Alison Van Eenennaam, especialista de genética animal da Universidade da Califórnia (EUA), saudou a decisão da FDA. “Já não era sem tempo”, disse. “Há quase 20 anos que a AquaBounty tentava obter uma autorização regulamentar”, lembrou.
Esta cientista faz parte do comité consultivo da FDA que analisou o salmão da AquaBountye – tendo solicitado, em Setembro de 2010, estudos adicionais. “Há cinco anos, os cientistas da FDA concluíram que o alimento derivado do salmão AquAdvantage era ‘próprio para consumo’ e que a proposta de confinamento físico, biológico e genético do peixe nas montanhas do Panamá reduzia para níveis mínimos os riscos ambientais”, frisou.
Segundo William Muir, professor de genética da Universidade Purdue (EUA), esta decisão “é boa para todos: para o ambiente, para os consumidores e para o processo” de avaliação, uma vez que “não existem provas credíveis de que estes peixes apresentem riscos, quer para a saúde humana quer para o ambiente”.
“É muito alentador ver que o processo de avaliação dos riscos finalmente acabou e que a utilização da genética para melhorar a criação pode avançar”, congratulou-se igualmente Helen Sang, professora de biologia do Instituto Roslin da Universidade de Edimburgo (Reino Unido).
Economistas e juristas da Universidade Duke (EUA) tinham contudo considerado demasiado estreitos, em Novembro 2010, os critérios retidos pela FDA para avaliar os méritos e os riscos deste salmão. Numa análise publicada na revista Science, perguntavam-se se não seria “mais sensato avaliar se o salmão transgénico constitui realmente uma vantagem para a sociedade no seu conjunto”.