França retalia com bombardeamentos ao Estado Islâmico na Síria
As escolhas de Hollande após os atentados de Paris assemelham-se às dos EUA após o 11 de Setembro.
Dez caças franceses lançaram esta noite 20 bombas sobre Raqqa, no Norte da Síria, que o Estado Islâmico tornou na sua capital, anunciou o Ministério da Defesa de Paris, no que está a ser visto como uma resposta aos atentados de sexta-feira na capital francesa, que o Presidente François Hollande tinha classificado como “um acto de guerra, cometido por um exército terrorista.”
Durante o dia, o Presidente recebeu os líderes dos partidos políticos representados no Parlamento, em busca de uma união nacional, tentando reproduzir o clima em França após os atentados de Janeiro contra o semanário satírico Charlie Hebdo e um supermercado judaico, que fizeram 17 mortos.
Desde sexta-feira à noite que o Presidente apela à “unidade indispensável” para defender “a pátria e os valores da humanidade”. Este domingo, o primeiro-ministro, Manuel Valls, exortou os partidos a formarem “a união sagrada”, antes da sessão conjunta das duas câmaras que se realizará em Versalhes na segunda-feira. É muito raro que o Senado e a Assembleia Nacional se reúnam ao mesmo tempo – a convocatória excepcional justifica-se, afirmou Hollande, devido à necessidade de “unidade” da nação face ao desafio do terrorismo.
Mas Nicolas Sarkozy, o líder do partido de centro-direita Os Republicanos, em vez de consensos, exigiu “alterações drásticas” na política de segurança – indiciando que Hollande não conseguiria a desejada união. “Disse ao Presidente que me parecia que devíamos construir respostas adequadas, o que quer dizer fazer uma inflexão da nossa política externa, das decisões no plano europeu e efectuar modificações drásticas na nossa política de segurança”, declarou o ex- Presidente, batido nas eleições de 2012 por Hollande.
Apesar de bombardeamentos continuados, inicialmente no Iraque e depois de Setembro na Síria, a coligação internacional não está a conseguir enfraquecer o grupo jihadista Estado Islâmico. Por isso a oposição francesa está a reclamar uma acção mais ampla. Alguns, como Sarkozy, dizem que o Ocidente se devia coordenar com a Rússia e até com o Presidente sírio, Bashar al-Assad – contra o qual os sírios se levantaram inicialmente, dando origem à guerra civil.
“Temos de tirar as consequências da situação na Síria. Precisamos de toda a gente para acabar com o Daesh [a sigla em árabe do Estado Islâmico], incluindo os russos. Não pode haver duas coligações internacionais na guerra da Síria”, declarou Sarkozy.
A tentação agora será a de seguir uma política mais dura – os bombardeamentos desta noite serão prova disso. O caminho de França inicia agora poderá levá-la para o mesmo percurso que os Estados Unidos começaram a percorrer após os atentados do 11 de Setembro de 2001, com um difícil equilíbrio entre as liberdades cívicas, uma sociedade aberta e a segurança, sublinha o New York Times. “Hollande está a ser empurrado para endurecer a sua retórica”, sublinha a editorialista Françoise Fressoz no Le Monde.
O ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, solicitou a realização de conselho dos ministros do Interior da União Europeia extraordinário na próxima sexta-feira, 20 de Novembro.
Hollande manifestou ainda a intenção aos líderes dos grupos parlamentares, que recebeu este domingo, de prolongar o estado de emergência no país durante três meses, pelo menos, diz a AFP. Para além dos 12 dias, precisa da autorização de uma lei votada pelo Parlamento.
“A repetição dos acontecimentos pode provocar uma reflexão sobre as escolhas do Governo e do Presidente. De uma parte sobre a eficácia das medidas de prevenção, sobre o aspecto securitário, mas também sobre o aspecto diplomático”, dizia à AFP o politólogo Jérôme Sainte-Marie.
Por outro lado, é a primeira vez que uma alta figura do Estado europeu é ameaçada directamente num atentado jihadista – Hollande estava no Estádio de França a assistir ao jogo amigável entre as selecções francesa e alemã, no qual os terroristas tentaram entrar. Houve uma linha vermelha que foi atravessada, que obrigará as autoridades de Paris a agir de forma diferente.
Além disso, neste momento está a decorrer uma campanha eleitoral em França – as regionais disputam-se em duas voltas, a 6 e 13 de Dezembro, com uma derrota quase certa para os socialistas no poder. E as presidenciais de 2017, cujo contra-relógio começou a contar logo em 2012, após a eleição de François Hollande, estão a aproximar-se.
Pode haver “um efeito de repetição talvez muito doloroso”, diz Sainte-Marie. “A repetição dos acontecimentos pode provocar uma reflexão sobre as escolhas do Governo e do Presidente. De uma parte sobre a eficácia das medidas de prevenção, sobre o aspecto securitário, mas também sobre o aspecto diplomático.” Tudo isso pode significar que a França entrou de facto em guerra com o Estado Islâmico.