Banco de Portugal falha venda do Novo Banco antes das eleições
Carlos Costa admite voltar a colocar o segundo maior banco no mercado já nos próximos meses e abre as portas a alienação parcial.
Este era o desfecho esperado depois de nos últimos dias terem saído notícias a dar conta de um recuo na venda do segundo maior banco privado. Um processo negocial que revelou possíveis erros de organização e de liderança a vários níveis. O Fundo de Resolução não conseguiu justificar perante os potenciais compradores a avaliação feita ao Novo Banco, de 4900 milhões, o equivalente aos fundos injectados na instituição, que garantia fechar o dossier sem perdas. E 13 meses depois da intervenção, Stock da Cunha continua sem publicar na íntegra as contas do banco o que não contribuiu para dar credibilidade ao negócio. Apenas foram divulgados os números parciais a 31 de Agosto, ou seja, em cima da fase final da negociação.
Ao aceitar condicionar o timing da venda do Novo Banco - inicialmente prevista para 2016, com possibilidade do prazo derrapar por mais três anos _ à agenda política do Governo, que quis acelerar o processo para evitar semelhanças com a resolução do BPN (que se prolongou por quase três anos), o concurso público antecipou-se aos testes de stress europeus (o Novo Banco tinha sido isentado de realizar o último). Agendados para Novembro, os exames do BCE vão fixar as novas necessidades de capital da instituição. A ausência de informação constituiu um obstáculo à venda. Admite-se que o Novo Banco necessite de nova recapitalização entre 2000 e 3000 milhões que terá de estar finalizada nos nove meses seguintes à divulgação dos exames europeus. Daí que no final da nota emitida nesta terça-feira ao mercado, o BdP reconheça um novo aumento de capital com recurso a privados. Só não explica em que moldes.
Outra crítica feita à organização do processo negocial prende-se com a decisão do Fundo de Resolução de não destacar do balanço do Novo Banco activos problemáticos, nomeadamente imobiliários. Outro obstáculo importante está relacionado com as crescentes contingências que rodeiam a operação com dois vectores: o tema dos lesados do GES/BES e o processo judicial movido contra o Novo Banco pela Goldman Sachs que reclama 800 milhões de euros, um tema a ser resolvido pelos tribunais de Londres.
O concurso público para a alienação do Novo Banco foi anunciado no final de 2014 com garantias por parte do primeiro-ministro Passos Coelho, da ministra das Finanças Maria Luis Albuquerque e do governador Carlos Costa de que seria conduzido de forma exemplar. Carlos Costa foi mesmo buscar para equipa de negociadores do BdP, José Brito Antunes, o seu braço-direito no Banco Europeu de Investimento (BEI) quando ocupou uma das vice-presidências do banco com sede no Luxemburgo. Brito exerce ainda as funções de adjunto do gabinete jurídico do BdP, apesar de continuar a ser quadro do BEI.
Quando arrancou o processo de negociação o Governo e o BdP congratularam-se por terem aparecido 17 interessados, alimentando assim a expectativa de que a venda seria um sucesso. Contudo, apenas três chegariam à fase final, a Anbang, a Fosun e a Apollo, mas com ofertas muito inferiores aos 4900 milhões “pedidos” pelo Fundo de Resolução. O cancelamento da operação e a percepção de que o banco não atraiu interessados para aquele preço tem consequências imediatas: gera a sensação de que BdP e Governo fracassaram no seu intuito e que serão apuradas perdas elevadas. A venda do Novo Banco abaixo dos 4900 milhões que foram injectados traduzir-se-á em prejuízos para o sistema financeiro, o “dono” do Fundo de Resolução (o valor estimado da perda será de quase 3000 milhões). Mas o efeito sistémico dependerá do montante do prejuízo e da forma como for reportado ao mercado pelas instituições, assim como das condições e prazo de pagamento do empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução. Matérias ainda por clarificar.
Nas últimas semanas o Governo apareceu a distanciar-se do dossier Novo Banco, alegando que é matéria exclusiva do BdP. Mas por volta das 14h00 desta terça-feira, os sites noticiosos veiculavam declarações de Passos Coelho a afirmar que respeitava a decisão do Banco de Portugal: “Esperar a melhor oportunidade para não causar esse prejuízo é realizar a venda do banco depois dos stress tests”. A intervenção surpreendeu por ter antecipado em várias horas a comunicação do BdP ao mercado. Eram 17h00 quando Carlos Costa emitiu uma nota onde refere que não foi possível chegar a acordo com nenhum dos três candidatos o que levou a abortar a transacção.
O BdP justificou-se alegando o baixo preço oferecido pela Anbang, Fosun e Apollo e fonte próxima do processo garantiu que a operação será retomada “no final do ano ou no início de 2016”, quando estiverem ultrapassadas algumas das incertezas que ainda pairam sobre o futuro. O perímetro dos activos à venda volta a ser descongelado e a equipa de Stock da Cunha terá agora maior liberdade para gerir o banco. Foi ainda pedido à actual gestão que apresentasse um plano estratégico para valorizar a instituição com vista a retomar a venda.
Carlos Costa deu liberdade ao Novo Banco para se desfazer de activos (operações de Londres e França ou parte da carteira de imobiliário) para melhorar os rácios de capital e aligeirar o processo de alienação, pois o banco tornar-se-á mais pequeno. Uma redução de dimensão também facilita o exame dos testes de resistência do BCE. O supervisor afiança ainda que a estabilização dos mercados ajudará a criar melhores condições de venda do Novo Banco que se admite poder ter um novo desenho. Poderá passar pela alienação parcial do capital a um único candidato ou pela entrada de mais do que um accionista. Ou até pela dispersão de parte das acções em bolsa. A única garantia é que a nova instituição terá de contar com um investidor “estável”.