Venda de 30% do Finibanco Angola obriga Montepio a dar explicações diferentes

Instituição financeira portuguesa reduz para 51% capital no banco angolano e Mário Palhares sobe para 49%. Negócio não é alheio às várias inspecções e investigações em curso e segue as recomendações do Banco de Portugal de limitação da exposição ao risco angolano.

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Banco mutualista registou imparidades de 258 milhões de euros no ano passado Público/arquivo

O acordo de venda de 30% do Finibanco Angola a Mário Palhares, o actual presidente e principal accionista do banco BNI (presente em Portugal), e um dos sócios do veículo Pivot que a semana passada adquiriu o Banco Efisa (ex-BPN), foi fechado nos últimos dias em Luanda. A decisão de baixar a posição acima de mais 80% para 51% foi tomada a 18 de Março em reunião da administração do Montepio Holding (a casa-mãe do grupo), liderada por Tomás Correia.

Na tarde desta terça-feira, 4 de Agosto, ao ser confrontado pelo PÚBLICO sobre a venda das acções do Finibanco Angola a Mário Palhares, o porta-voz oficial do grupo mutualista, António Cunha Vaz, pediu tempo para consultar a gestão do Montepio e, horas depois, ao início da noite do mesmo dia, era prestada a seguinte versão: “O grupo Montepio não está vendedor de acções e mantém há cerca de ano e meio 51% do capital do Finibanco Angola, em linha aliás com o que estão a fazer os restantes bancos portugueses em Angola”. E deu como exemplo o BPI, que baixou, há vários anos, a posição no BFA para 51%.

Esta quarta-feira, na sequência de nova conversa, o mesmo responsável justificou a discrepância das informações com um argumento: “O negócio estava apalavrado há cerca de ano e meio mas só foi aprovado a 18 de Março”. Mais tarde, um seu colaborador dava nova explicação: “O Grupo Montepio detém desde o início da operação 60% do Finibanco Angola” adquiridos na OPA ao Finibanco e, em 2013, é concretizado um aumento de capital onde o Montepio sobe a sua participação “para mais de 80%, face ao não acompanhamento pelos accionistas minoritários”.

Depois, explica, “na impossibilidade de os minoritários angolanos acompanharem o aumento de capital, é acordado que este incremento de posição do Montepio seria mais tarde reduzido para uma participação alinhada com o que o resto da banca portuguesa detém em Angola”. “É este entendimento que ganha forma em 2015, pelo qual o Montepio Holding se propõe reduzir a sua participação para 51%, por um preço superior a 15 euros por acção”, conclui.

Esta quarta-feira, na sua página online, o Montepio Holding (a cabeça do grupo) refere expressamente que possui 87,7% do Finibanco Angola (o que é consistente com o relatório de Dezembro de 2014 da Caixa Económica Montepio Geral, CEMG, que refere o mesmo valor), enquanto o Finibanco Angola informa, na mesma altura, que era detido pelo Montepio por uma percentagem inferior, de 81,57%, esta contabilizada a 29,8 milhões de euros.

E, ao início da noite de hoje, Tomás Correia avançou à agência Lusa que o encaixe da transacção foi de 26 milhões de euros, tendo a operação sido firmada a 15 euros por acção (muito acima dos 6,48 valor inscritos no balanço). No entanto, inquirido pelo PÚBLICO sobre se os 15 euros exprimem uma entrada de dinheiro no grupo ou se incluem outras componentes, o Montepio não respondeu. 

O porta-voz do grupo admitiu ao PÚBLICO que Mário Palhares pode ter também negócio verbalizado com Jorge Armindo para comprar cerca de 2% do Finibanco Angola. No final, o banqueiro ficará com 49% da instituição africana. De fora ficam actuais pequenos accionistas, de acordo com o relatório e contas do banco, como João Avelino Manuel, Francisco Simão Júnior e Dumilde Rangel.

Ao contrário de Mário Palhares (que antes de fundar o BNI foi presidente de outro banco angolano, o BAI) e de Jorge Armindo (ex-presidente da Portucel e da Amorim Turismo), ambos fundadores do Finibanco Angola, o Montepio só assumiu o controlo em 2010, quando comprou o grupo Finibanco a Álvaro Costa Leite.

Na origem, em 2007, para além do banco de Costa Leite, com 60%, a empresa teve outro accionista relevante, este com 30%, o Iberpartners – Gestão e Reestruturação de Empresas, onde pontuavam investidores luso-angolanos, entre os quais Jorge Armindo e Palhares. Uma das unidades de negócio desta sociedade (a Iberpartners Cafés) conta com o Montepio como accionista (29%). 

Nos anos seguintes, já num quadro de crise financeira e de acentuada recessão económica em Portugal, Tomás Correia foi aumentando os investimentos no Finibanco Angola, assumindo os 30% da Iberpartners até perfazer 87% do capital, uma evolução que agora desfaz.

Nos últimos anos, o Montepio Geral foi alvo de várias inspecções por parte do Banco de Portugal e, mais recentemente, do regulador do mercado de capitais (CMVM), que detectaram, entre outros pontos, possíveis irregularidades nos movimentos financeiros entre bancos (CEMG e Finibanco Angola) que indiciam branqueamento de capitais, o que já está a ser analisado pelo Ministério Público. As várias averiguações ganharam visibilidade com as lutas de poder internas e vieram colocar os holofotes no grupo mutualista, com uma gestão concentrada em Tomás Correia, que vinha acumulando a liderança do Montepio SGPS, da CEMG e do Finibanco Angola. O quadro obrigou a que se iniciasse um processo de redução da exposição ao risco de Angola, não só por pressão dos supervisores, mas também por força das grandes necessidades de capital da AM e da CEMG.

Um dos negócios que não terá ajudado a aliviar o banco mutualista foi a OPA lançada há cinco anos sobre o Finibanco, onde a CEMG investiu 250 milhões de euros. Uma operação contestada internamente, quer por quadros de topo, quer por associados da Associação Mutualista (que totalizam 650 mil), por estar em causa um banco historicamente deficitário.

Depois de ter tido consistentemente prejuízos (206 mil euros em 2009), nos primeiros seis meses de 2010, que antecederam a venda ao Montepio, o Finibanco apresentou-se com um lucro consolidado de 1,3 milhões de euros, beneficiando do impacto positivo da operação angolana — passou de 300 mil euros para 2,6 milhões.  

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