Duas omissões e uma surpresa

Silêncio sobre o PS e a Grécia e a inesperada referência a uma “guerra sem quartel às desigualdades”

Num ensaio para o debate sobre o Estado da Nação que hoje se realiza, o primeiro-ministro apresentou-se ontem nas jornadas parlamentares da maioria com um discurso curioso. Com a crise grega a dominar todas as atenções cá dentro e lá fora, nunca falou directamente da Grécia, embora seja cada vez mais notório que Portugal é um dos países mais afectados pelos acontecimentos naquele país. O resultado do referendo grego também não deve ser alheio à súbita opção de Pedro Passos Coelho pelo low profile num tema sobre o qual tantas vezes opinou, quase sempre numa linha de intransigência negocial com as autoridades de Atenas.

A pouco mais de dois meses do início da campanha eleitoral, também nunca se referiu directamente ao principal partido da oposição. E, no entanto, quer a Grécia, quer o PS foram alvo de muitas referências subliminares, que o chefe do Governo procurou interligar numa simbiose forçada, cujo objectivo parece ser a construção de um discurso do medo, esse, sim, claramente de campanha. Um exemplo: “Os portugueses não aceitariam que se pusesse o seu futuro em risco. Se quisermos baralhar e dar de novo, com novas regras, provavelmente muito do que conquistámos vai-se perder”. Numa alusão apontada ao programa eleitoral dos socialistas, avisou directamente os eleitores contra qualquer medida tendente a estimular o consumo, ameaçando os prevaricadores com penas tremendas. Assim: “Se se gasta o que não se tem, isso vai ser pago com mais dor para o futuro”.

Mas talvez o ponto mais surpreendente do discurso do primeiro-ministro tenha sido uma espécie de constatação de que falta travar “uma guerra sem quartel às desigualdades”. Ele não disse que o vai fazer, nem se pretende apresentar qualquer plano no programa político que a coligação vai levar às eleições e, muito menos, se tenciona assumir as suas responsabilidades na quota-parte que lhe cabe no aprofundamento das desigualdades em Portugal. Ficar-lhe-ia bem.

   

 

   

 

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