Perguntas e respostas sobre a crise grega e seus impactos

Dúvidas e cenários para Atenas, Portugal e a Europa.

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Nuno Ferreira Santos

O que pode acontecer esta segunda-feira?
Tudo depende da forma como o Banco Central Europeu (BCE), que tem marcada uma reunião do seu conselho de governadores para este domingo, irá agir. Neste momento, há duas grandes hipóteses em cima da mesa: prolongar e aumentar a linha financeira de emergência que tem assegurado a liquidez aos bancos gregos, e que tem sido crucial para dar fôlego ao sistema financeiro devido aos levantamentos de dinheiro; ou interromper esse apoio, uma vez que o programa de ajustamento da Europa e do FMI deixa de estar em vigor. Há ainda um “misto”, podendo o BCE prolongar a linha por dois dias, até o actual programa de ajustamento expirar, fechando depois “a torneira”. Neste último caso, a Grécia ver-se-á obrigada a impor o controlo de capitais, com limites aos levantamentos, tal como já aconteceu em Chipre, para impedir a drenagem de dinheiro do país. Os responsáveis do Eurogrupo destacaram este sábado que o fim do programa de ajustamento, sem a perspectiva de um novo acordo, obriga a “medidas por parte das autoridades gregas, com a assistência técnica das instituições, de modo a salvaguardar a estabilidade do sistema financeiro grego”. Há também a hipótese de decretar o encerramento das instituições financeiras, e que, no caso de Chipre, chegou a vigorar por 13 dias (permitindo levantamentos em ATM). Para já, espera-se que mais pessoas e empresas tentem levantar dinheiro dos bancos, e adiem pagamentos. O Financial Times recordava este sábado que os depósitos estão no nível mais baixo dos últimos dez anos e que mais de cem mil milhões de euros já tinham sido levantados desde 2010 (os mais ricos, diz o FT há muito que tiraram o seu dinheiro). As imagens de gregos a tentar ter acesso ao seu dinheiro, por si só, já vão provocar um ambiente sombrio numa zona euro que está a dar pequenos passos na recuperação económica, e que precisa de tudo menos de desconfiança nas instituições.

Ainda é possível um novo acordo?
Nada é impossível, mas depois das posições extremadas a que se assistiu este sábado, e do impasse das últimas semanas, é difícil imaginar um entendimento entre os restantes Estados-membros e FMI com o governo de Atenas liderado pelo Syriza, isto sem que haja grandes cedências. O referendo seria uma forma de desbloquear a situação, mas é uma estratégia muito arriscada, porque este pode ser visto como um referendo sobre a permanência do país no euro. 

E se a Grécia não pagar ao FMI?
Se Atenas não pagar ao FMI a tranche que vence esta terça-feira, no valor de cerca de 1500 milhões, isso é mau, mas não é extremamente grave, porque provavelmente haveria margem para ser visto como um pagamento atrasado, e não um incumprimento imediato. Isso daria espaço, para resolver a questão do pagamento fora do prazo. Agora, o mais importante é que nesse dia acaba o programa de ajustamento que está em vigor, e o país fica impedido de receber os cerca de sete mil milhões de euros que estavam negociados, os quais necessita para fazer face às despesas do Estado. Entre elas está precisamente o pagamento aos credores, seja o FMI, seja o BCE, a quem Atenas tem de pagar, a 20 de Julho, 3500 milhões de euros.

A Grécia fica fora do euro?
Para já, não. O Eurogrupo mantém que quer a Grécia no euro. Mas se o referendo de dia 5 se realizar, e a maioria rejeitar um acordo com os credores, essa hipótese torna-se mais real. Não se sabe se seria mesmo assim, e como tal aconteceria, mas em última instância seria sempre um país a deixar o euro (e provavelmente da UE, já que a moeda única faz parte intrínseca do modelo europeu) para poder imprimir dinheiro, e não a zona euro a expulsar abertamente um país. Embora seja complicado do ponto de vista jurídico, uma vez que os tratados europeus não prevêem esse cenário, há sempre uma primeira vez para tudo. Até para a Grécia ficar numa espécie de limbo.

Se sair do euro, afinal isso é bom ou mau para a Grécia?
Diferentes pessoas iriam responder de formas variadas. O cenário mais provável é que o país voltaria a ter a sua própria moeda, o dracma, e esta iria desvalorizar de forma acentuada face ao euro. Isso faria com que as exportações ficassem mais baratas, mas iria ter muitos problemas para importar os produtos de que necessita (como medicamentos), além de que provavelmente os fornecedores iriam exigir pagamentos a pronto. A inflação iria disparar, e o sistema financeiro entraria em colapso, precisando de intervenção estatal. A isto junte-se o facto de que o país dificilmente iria pagar aos seus credores, entrando em incumprimento. Neste caso, dificilmente iria conseguir voltar a financiar-se nos mercados internacionais a médio prazo. Assim, o mais certo é o país sofrer um enorme choque no imediato, desafiando a ideia de que não é possível ficar ainda pior do que está. No longo prazo, dependeria do que fizessem os governantes gregos. 

Quais os impactos para Portugal e para a Europa?
A saída da Grécia do euro seria abrir uma caixa de Pandora, e ninguém sabe ao certo o que aconteceria. É certo que hoje zona euro e a União Europeia estão mais fortalecidas do que há uns anos, mas a partir do momento em que ficar provado que um país pode sair do euro, com imagens de Atenas a percorrer o mundo, ainda por cima no meio de questões políticas, ficam abertas brechas que representam um desafio tanto para os investidores como para os especuladores. Os casos são distintos, mas Portugal seria rapidamente visto como um potencial caso de saída do euro. Isso faria com que muitos se desfizessem das suas posições de dívida soberana portuguesa, e que outros apostassem mesmo contra a permanência do país no euro. Com as taxas a disparar, e esgotando-se a almofada financeira, Portugal poderia ter de pedir novas ajudas à Europa e ao BCE. Com os apoios, viriam sempre imposições de novas medidas a implementar (leia-se: austeridade, principalmente do ponto de vista da despesa), seja qual for o Governo que esteja em S. Bento. Isto numa altura em que, com olhos postos nas legislativas deste ano, tanto o PSD/CDS como o PS apostam no fim da austeridade, com medidas como a devolução dos cortes dos salários dos funcionários públicos e o fim da sobretaxa de IRS. No futuro, o país estaria sempre menos seguro a financiar-se exclusivamente nos mercados. Este preço é muito superior ao dinheiro que Portugal emprestou à Grécia, e que iria receber ao longo de vários anos. Quanto à Europa, esta seria vista como parte envolvida num projecto falhado, e teria de mobilizar todos os seus recursos para tentar passar a ideia de que a Grécia surge como “caso único”. No entanto, como afirmou recentemente em entrevista ao PÚBLICO o editor associado e colunista do Financial Times, Martin Wolf,  “a zona euro passaria a ser uma instituição completamente diferente de uma verdadeira união monetária”. Isso significaria que “no futuro, se passaria a assistir a muito mais crises na zona euro”.

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