O aniversário de Julia Margaret Cameron só podia ser uma festa para a fotografia
O Victoria & Albert é um dos museus que festejam os 200 anos do nascimento de um dos maiores nomes da fotografia. A sua primeira exposição foi há 150 anos.
Recebeu a sua primeira câmara fotográfica quando já tinha quase 50 anos – a filha Julia e o genro, Charles Norman, queriam que ela arranjasse um hobby para se distrair da ausência do marido, sempre ocupado com as plantações de café que a família tinha no Ceilão (actual Sri Lanka), e ofereceram-lhe uma no Natal. Na casa da ilha, onde recebia os amigos, muitos deles figuras de relevo nas artes e nas ciências, como o naturalista Charles Darwin ou o poeta Alfred Tennyson, Cameron (1815-1879) estava habituada a fazer de conta – vestia os seus modelos e rodeava-os de adereços para que recriassem personagens bíblicas, históricas ou alegóricas. É por isso que, nas suas fotografias, é comum ver crianças transformadas em anjos, jovens mulheres como Virgens ou deusas, e homens convertidos em cavaleiros arturianos.
Numa das principais exposições já agendadas – a do Victoria & Albert (V&A) – estarão mais de 100 fotografias da extensa colecção que o museu londrino tem no acervo, muitas delas doadas pela própria Cameron quando o V&A ainda se chamava South Kensington Museum. Nelas se reconhecem muitos dos elementos que distinguem o seu trabalho, em parte mal recebido pela crítica do seu tempo e hoje amplamente elogiado. Estão lá as imagens intencionalmente desfocadas, com riscos e manchas deixadas pelos morosos processos que no século XIX o acto de fotografar implicava. As mesmas imagens que mostram a sua relação muito directa à pintura - sobretudo à dos pré-rafaelitas e ao seu universo de fábula e melancolia - e uma convicção forte de que a fotografia era, ela mesma, uma forma de arte que não devia ser menorizada perante as restantes.
A retrospectiva Julia Margaret Cameron, que é inaugurada no V&A a 28 de Novembro, celebrando também os 150 anos da sua primeira exposição (e única em vida), vai organizar-se à volta de quatro cartas que enviou ao fundador e então director deste museu de Londres, Henry Cole, um amigo. Lê-las permite ao visitante perceber como evoluiu o trabalho desta mulher que nunca deixou de se preocupar com os aspectos técnicos e artísticos, procurando aperfeiçoar-se cada vez mais, investindo em composições cuidadas e tornando-se uma das mais originais retratistas da história da fotografia.
Escrevendo ao astrónomo John Herschel em Dezembro de 1864, o primeiro a falar-lhe de fotografia, muito antes de Cameron receber a sua primeira câmara, reconhece que tudo o que deseja é que o seu trabalho seja visto como arte, “combinando o real e o ideal e não sacrificando nada da verdade mesmo que tão dedicado quanto possível à poesia e à beleza”. Se os seus retratos são arte ou não, pouco importa, é discussão estéril. O que interessa é que ficaram e que merecem sempre um regresso.