A Mercedes e os outros

A total supremacia da escuderia alemã em 2014 reduz a margem de manobra da concorrência para o novo Mundial de Fórmula 1. A Ferrari e a McLaren estão ainda em fase de reconstrução.

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Cristina Quicler/AFP

As expectativas antes do tiro de partida estão longe de ser um indicador perfeito para o futuro próximo, mas ajudam, pelo menos, a perceber quão cautelosos são os principais adversários da Mercedes. Palavra a Jenson Button (McLaren): “O carro é uma base sólida de partida e estou confiante de que vamos chegar onde queremos, só precisamos de paciência”. Agora Daniel Ricciardo (Red Bull): “Tivemos alguns problemas de fiabilidade, mas fizemos muitos quilómetros e aprendemos muito. Ainda temos caminho a percorrer”. É a vez de Felipe Massa (Williams): “Todo o trabalho árduo durante o Inverno tem aqui a sua primeira recompensa, mas também pode ser um sinal do quanto precisamos de melhorar”. E finalmente Sergio Marchionne, presidente da Ferrari: “O pior já ficou para trás. Eu estou optimista. Seremos campeões em 2018, quem sabe um pouco antes”, afirmou recentemente, na Suíça.

É difícil passar ao lado do favoritismo da Mercedes, se tivermos em conta que a equipa segurou os dois primeiros classificados da época passada (o campeão mundial Lewis Hamilton e o alemão Nico Rosberg) e que, acima de tudo, beneficia de uma estabilização dos regulamentos no que às especificações das unidades de potência diz respeito, depois do salto de 2014 dos “clássicos” V8 para os V6 turbo híbridos. É certo que, a pedido de várias “famílias”, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) permitiu, para esta época, o desenvolvimento dos motores (tendo por base a unidade homologada em 2014), mas essa premissa é válida para todas as escuderias.

Ora, neste cenário, pesam muito as 16 vitórias, as 18 pole positions, as 11 “dobradinhas” e os 30 pódios obtidos pela Mercedes na temporada passada, números que resultaram nos títulos mundiais de pilotos e de construtores. Ainda assim, Toto Wolff, director da escuderia germânica, põe alguma água na fervura: “Fazer previsões nesta fase é como tentar ler uma bola de cristal. A bala está prestes a sair do cano da arma e vamos descobrir em breve em que patamar estamos”, sublinhou, em declarações ao site oficial da F1.

Elencos de luxo
Do outro lado da barricada, o dos “predadores”, a principal preocupação da Ferrari e da McLaren foi ensaiar uma espécie de reinvenção, tendo por base dois pilotos de créditos firmados: os italianos contrataram o tetracampeão Sebastian Vettel (que se junta a outro campeão do mundo, Kimi Raikkonen), os britânicos apostaram no bicampeão Fernando Alonso (que fará dupla com Jenson Button, vencedor em 2009). O espanhol, porém, vai ficar de fora em Melbourne, a recuperar do acidente sofrido na pré-temporada e a ver como responde em pista o piloto de reserva da equipa, Kevin Magnussen.

Mas o elenco não é o único argumento de peso que a McLaren transporta para dentro de pista. A reedição da histórica parceria com a Honda, que coincidiu com os dias de glória dos finais da década de 1980 e inícios da de 1990, acarreta novas responsabilidades para o MP4-30. “O Inverno soube a pouco e não tivemos tempo para testar na totalidade como o nosso novo motor vai adaptar-se. Porém, temos vindo a evoluir”, vincou um cauteloso Yasuhisa Arai, director da empresa nipónica.

Mas há pelo menos mais dois intrusos à espreita, para além dos dois gigantes da Fórmula 1. A Red Bull de Daniel Ricciardo, um dos pilotos-sensação de 2014, promete continuar a fazer sombra na frente do pelotão, depois do segundo lugar no ranking dos construtores. E a Williams, que a dada altura mordeu os calcanhares à Mercedes — as seis presenças de Valtteri Bottas no pódio no Mundial do ano passado são um bom indicador — e que será, em teoria, o rival que mais estragos poderá causar.

“Com base no que fizemos durante os testes de Inverno, em que atingimos todos os nossos objectivos, partimos para este Grande Prémio com uma aura positiva. Temos rodado em circuitos que não capitalizam inteiramente as forças do FW37, por isso estamos ansiosos por competir em pistas que se adaptem melhor às nossas características”, explica Rob Smedley, engenheiro da Williams.

O rookie dos rookies
Não é só no topo da pirâmide que o novo Mundial encerra focos de interesse. Junto à base, em particular na Toro Rosso, há um nome que se destaca acima dos demais: Max Verstappen. Quando entrar em pista, no domingo, o holandês que na época passada terminou em terceiro o campeonato de Fórmula 3 tornar-se-á no mais jovem piloto de sempre a participar num Grande Prémio, aos 17 anos (fará 18 em Setembro).

“Nesta altura, não sei bem como irei sentir-me, mas quando as luzes acenderem ficarei muito entusiasmado”, vincou o filho de Jos Verstappen (piloto de Fórmula 1 entre 1994 e 2003) e Sophie Kumpen (antiga piloto de karts), cujo destino profissional não fugiu à linhagem familiar.

Abaixo da Toro Rosso nas bolsas de apostas estará seguramente a Manor, um “convidado” de última hora que só na terça-feira fechou a sua dupla de pilotos, com a contratação do espanhol Roberto Merhi. Renascida das cinzas da Marussia, que entrou em administração judicial no final de 2014, só no final de Fevereiro é que a escuderia britânica confirmou um lugar na grelha, numa renhida luta contra o tempo. O que poderá fazer neste campeonato? Pouco mais do que ganhar experiência.

O que muda? As principais mexidas nos regulamentos

Nariz mais conservador
Para evitar soluções menos tradicionais e pouco elegantes como o nariz bifurcado do monolugar da Lotus, em 2014, a FIA reviu em baixa a altura do chassis (525mm) e do nariz do carro (185mm). Em prol da segurança e do design.

Um safety car virtual
Sempre que um troço da pista for sinalizado com bandeiras amarelas — indicando perigo para os pilotos —, os monolugares terão de reduzir a velocidade até um limite estipulado pela FIA para cada segmento do circuito. Desta forma, será possível controlar a corrida sem ser necessário recorrer ao habitual safety car. 

Fim dos pontos a dobrar
O Grande Prémio de Abu Dhabi de 2014 foi o primeiro e, até ver, o último em que a pontuação foi contabilizada a duplicar. A ideia era atribuir interesse acrescido à derradeira corrida do Mundial, mas não convenceu nem os adeptos nem os pilotos.

Cockpit mais protegido
Os painéis de protecção, feitos de zylon — um material altamente resistente —, cresceram ligeiramente em redor do cockpit, conferindo maior segurança aos pilotos.

Um capacete por época
Convidar os pilotos a serem menos extravagantes no que respeita ao número de capacetes que usam ao longo da temporada é o objectivo da FIA. A ideia é tornar os condutores mais facilmente reconhecíveis para os fãs.

Corte nos testes
Foi imposta uma redução, de quatro para dois, nos testes permitidos durante a temporada. Esses ensaios terão lugar nos dias seguintes aos Grandes Prémios de Espanha e Áustria. N.S.

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