Descoberta, no céu austral, uma série de galáxias anãs a orbitar a Via Láctea

Este tipo de galáxias, muito pouco luminosas, poderá ser a chave para perceber o que é a misteriosa matéria escura e como se formam as galáxias.

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A sul do plano da Via Láctea, as estrelas vermelhas assinalam as novas descobertas (entres elas, as duas Nuvens de Magalhães) S. Koposov e V. Belokurov/Instituto de Astronomia, Cambridge

As galáxias anãs são as galáxias mais pequenas que se conhecem. Normalmente, orbitam galáxias de maiores dimensões – e podem conter apenas uns milhares de estrelas, ao passo que uma galáxia média como nossa Via Láctea contém… centenas de milhares de milhões de estrelas, explica a Universidade de Cambridge em comunicado.

Os modelos cosmológicos convencionais prevêem a existência de centenas de galáxias anãs à volta da Via Láctea, mas o problema é que elas são quase impossíveis de detectar devido ao seu diminuto tamanho e fraca luminosidade.

Uma característica particularmente interessante das galáxias anãs é que elas contêm apenas 1% de matéria visível e 99% de “matéria escura” – que, como o seu nome indica, é invisível e só pode ser detectada através da gravidade que exerce sobre outros corpos. Ora a matéria escura, cuja natureza permanece misteriosa, representa, também segundo os modelos cosmológicos actuais, cerca de 25% de toda a matéria e energia do Universo. Daí que o estudo das galáxias anãs possa permitir confirmar a existência da matéria escura, lê-se no mesmo comunicado.

“As galáxias anãs são a derradeira fronteira para testarmos as nossas teorias da matéria escura”, diz Vasili Belokurov, um dos co-autores da equipa de Cambridge. “Precisamos de as encontrar para determinar se a nossa visão do cosmos faz sentido.”

Estes cientistas utilizaram no seu trabalho os dados recolhidos no âmbito do Levantamento da Energia Escura (Dark Energy Survey ou DES) – um projecto de cinco anos que começou há um ano e cujo objectivo é fotografar uma grande fatia do céu austral da Terra com um nível de pormenor sem precedentes, explica pelo seu lado um comunicado do Fermilab, nos EUA, ao qual pertence a segunda equipa a apresentar agora os seus resultados. “A grande quantidade de matéria escura nas galáxias-satélite da Via Láctea representa um resultado significativo tanto para a astronomia como para a física”, frisa Alex Drlica-Wagner, do Fermilab, que liderou naquele laboratório a análise dos resultados deste primeiro ano de funcionamento do DES.

Olho de lince
A ferramenta principal do DES, cujas observações estão disponíveis publicamente, é a chamada Câmara de Energia Escura. Com uma resolução de 570 megapíxeis, é a máquina fotográfica “mais potente do mundo, capaz de ver galáxias situadas a até 8000 milhões de anos-luz da Terra”. Construída e testada no Fermilab, possui cinco lentes de formas muito precisas (a maior das quais com quase um metro de diâmetro) que foram concebidas e fabricadas no University College de Londres. E encontra-se actualmente instalada num telescópio de quatro metros do Observatório Inter-Americano de Cerro Tololo, nos Andes chilenos.

Até aqui, várias dezenas de galáxias anãs tinham sido descobertas no céu do Hemisfério Norte em 2005 e 2006. E desde então – mais nada. Agora, a descoberta aconteceu no Hemisfério Sul, numa região situada entre a Grande Nuvem e a Pequena Nuvem de Magalhães, as duas maiores e mais célebres galáxias anãs que orbitam a Via Láctea.

Os objectos agora descobertos são mil milhões de vezes menos luminosos do que a nossa galáxia e possuem um milionésimo da massa da Via Láctea.

“O facto de termos encontrado um grupo tão grande de galáxias-satélite numa área tão pequena do céu foi completamente inesperado”, diz Sergei Koposov, que liderou o estudo britânico. “Não conseguia acreditar no que estava a ver”.

“Estudos anteriores do céu austral não tinham detectado grande coisa, portanto não estávamos à espera de dar com este tesouro”, salienta por seu lado Belokurov.

A mais próxima das galáxias anãs agora descobertas encontra-se a 97.000 anos-luz de nós – isto é, a meio-caminho entre a Terra e as Nuvens de Magalhães –, na direcção da constelação do Retículo (a Rede). A mais longínqua e luminosa situa-se a 1,2 milhões de anos-luz, na direcção da constelação de Erídano (o Rio). E segundo a equipa de Cambridge, está a ser “sugada” pela nossa galáxia.

“Estes resultados são muito enigmáticos”, acrescenta o co-autor Wyn Evans, de Cambridge. “Talvez tenham começado por ser satélites das Nuvens de Magalhães que a seguir foram ejectados pela interacção entre a Grande Nuvem e a Pequena Nuvem. Ou talvez tenham pertencido a um gigantesco grupo de galáxias que – ao mesmo tempo que as Nuvens de Magalhães – tem estado a cair para dentro da nossa Via Láctea.”

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