Privatizar à pressa não dá bom resultado
Sem um consenso político mínimo, o Governo quer acelerar o calendário para vender a TAP.
Diz-se que a pressa é inimiga da perfeição. Ninguém está à espera que o processo de privatização da TAP seja uma perfeição, sem nenhuma falha. Mas a forma atabalhoada como arrancou a operação para vender a TAP não augura nada de bom. Comecemos pela pressa. Nesta privatização, ao contrário do que é habitual, o Governo vai atalhar caminho e vai prescindir da fase de ofertas preliminares, passando a operação a ter uma única fase de entrega de propostas vinculativas.
O Governo sabe que em ano de eleições, se o processo se arrastar, o fecho da operação poderá cair na próxima legislatura. E nesse cenário, o comprador não terá garantias que o próximo Governo, qualquer que ele seja, queira concretizar a venda da companhia aérea. Mas este é um problema e um risco que o Governo assumiu ao avançar para a privatização sem tentar um mínimo de consenso político. A TAP não é propriedade de um governo e a sua venda deveria ser secundada por um consenso político e social mínimo. Coisa que hoje não existe.
E talvez por causa da pressa, o processo de venda começou da pior forma. Tal como o PÚBLICO noticiou esta quinta-feira em primeira-mão, o caderno de encargos da privatização da TAP irá ter uma cláusula que impede que o comprador possa fazer despedimentos colectivos enquanto o Estado for accionista, ou seja, durante um período de dois anos.
O problema é que o secretário de Estado dos Transportes veio dizer no briefing após o Conselho de Ministros que essa impossibilidade de haver despedimentos abrangia apenas os associados dos nove sindicatos que chegaram a acordo com o Governo. O que é uma aberração jurídica, já que não faz sentido nenhum que a segurança no emprego de um trabalhador esteja dependente da sua filiação sindical. Mas não só Sérgio Monteiro estava convencido que tal era possível, como o próprio ministro Pires de Lima deu um entrevista esta quinta-feira à TVI24 onde reafirmou a tese: “Não podemos estender esse acordo a sindicatos que não se quiseram sentar connosco à mesa e que não assinaram o acordo de paz social relativo a esta privatização.”
É grave e até assustador que Pires de Lima e o seu secretário de Estado tenham chegado a ponderar e achar que tal discriminação seria possível. Chegámos ao ridículo de ter tido trabalhadores da TAP a correr para se filiarem nos sindicados que se sentaram à mesa com o Governo ou a mudarem de sindicatos, não fosse o ministro da Economia ter razão. E Pires de Lima causou um enorme embaraço político ao primeiro-ministro que se viu obrigado a ter de corrigir as palavras do ministro da Economia em pleno debate quinzenal.
Partir para uma privatização desta dimensão sem acautelar o mínimo consenso político e social é grave. Mais grave é quando os principais responsáveis por conduzir essa privatização passam uma imagem de amadorismo. E pior ainda; com um espírito de retaliação para com os sindicados que discordam da privatização e que recusaram desconvocar a greve do final do ano.