Todos os casos de Legionella vão parar ao 7.º andar da Alameda D. Afonso Henriques
Divisão de Estatísticas da Saúde e Monitorização acompanha o surto desde sexta-feira.
Luís Serra, da Divisão de Estatísticas da Saúde e Monitorização, é um dos técnicos da Direcção-Geral da Saúde que desde sexta-feira não têm parado de introduzir os dados reportados pelos hospitais e pelas autoridades de saúde nos computadores onde corre o programa de georreferenciação. Foram estes instrumentos e equipas da Direcção-Geral da Saúde que fizeram soar na passada sexta-feira a campainha de alerta para o anormal número de casos de Legionella reportados e começar a actuar. Quase sempre noite fora.
“A minha colega da área procurou-me pela hora de almoço de sexta-feira e disse-me que tínhamos um problema desta natureza. Imediatamente pelas 15h de sexta-feira foi formada uma task-force, foram naturalmente tomadas as medidas que seriam necessárias e nessa noite começaram os trabalhos presididos pelo Dr. Paulo Macedo”, contou o director-geral da Saúde. Francisco George já garantiu que o país tem especialistas e recursos suficientes para resolver a situação, tendo inclusivamente recusado, por duas vezes, a ajuda oferecida pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças. No entanto, deram luz-verde aos observadores do centro com sede em Estocolmo para acompanhar, no terreno, os procedimentos adoptados por Portugal.
Por cada caso confirmado de doença do legionário, é introduzida no programa uma referência associada à morada e que gera um símbolo laranja no mapa, no lugar exacto onde essa pessoa mora ou trabalha. Tudo é feito numa sala com duas secretárias e em que é preciso pedir licença à mobília para conseguir circular nos menos de seis metros quadrados. Na sala de reuniões que funciona como uma antecâmara, as cadeiras não têm chegado nos últimos dias para os epidemiologistas e outros especialistas que ajudam a tratar e validar a informação que chega à Direcção-Geral da Saúde.
“Só olhando para as moradas e para a localização das fábricas podemos logo suspeitar das três que estão muito próximas. Mas se o vento estiver de norte, então podemos eliminar logo a Solvay”, exemplifica ao PÚBLICO Luís Serra, em referência às torres de arrefecimento para as quais as conclusões preliminares sobre o foco de bactérias apontaram. O responsável mostra que o mapa destaca as três empresas daquela zona fabril de Vila Franca de Xira e que ficam mais próximas das freguesias afectadas pelo surto de Legionella.
Aliás, foi precisamente na Solvay, na Central de Cervejas e na Adubos de Portugal (ADP Fertilizantes) que as autoridades recolheram as amostras que ainda estão em análise. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera preparou um estudo sobre os ventos de Outubro e Novembro naquela zona e que poderá ajudar a contar a história de um dos três maiores surtos mundiais da doença.
Segundo o director-geral da Saúde o clima terá tido um contributo relevante. “Todos se lembram de dias de calor em Outubro com humidade, de tipo tropical. São condições ideias para favorecer a multiplicação [da Legionella] onde ela existe, na água”, salientou George. O último balanço da Direcção-Geral da Saúde, feito na quarta-feira, aponta para que já existam 302 casos e cinco mortes com relação com o surto de Vila Franca de Xira, existindo ainda mais quatro óbitos em investigação.
Apesar de os casos já terem ultrapassado as três centenas, o sistema de georreferenciação, pelas exigências de várias informações distintas, ainda só conta com 180 casos, explica Paulo Nogueira, que está à frente da Direcção de Serviços de Informação e Análise, da qual faz parte a Divisão de Estatísticas da Saúde e Monitorização. Mas integra também os casos que surgiram antes de 7 de Novembro e que poderão a ajudar a dar um princípio, um meio e um fim ao surto.
Segundo o coordenador, aplicando-se um modelo aos casos já identificados é possível antever que o surto não deverá chegar às 500 infecções. Mas Paulo Nogueira ressalva que qualquer conclusão que ainda surja das análises e estudos pode alterar o curso dos acontecimentos. “Se hoje aparecesse um caso que contrariasse a informação científica que temos, então teríamos de repensar toda a história. Mas neste momento tudo se encaminha para termos uma história plausível que encaixa a informação. Temos várias peças que se conjugam e uma história que começa a fazer bastante sentido”.
O director-geral da Saúde adiantou nesta quinta-feira que os novos casos de doença do legionário relacionados com o surto identificado no dia 7 de Novembro no concelho de Vila Franca de Xira devem deixar de aparecer daqui a uma semana, no dia 20 de Novembro. Francisco George explicou que a Legionella tem um tempo de incubação até dez dias e que na segunda-feira de manhã fecharam as últimas torres de arrefecimento do complexo fabril da zona onde se pensa estar o foco da epidemia. Em relação a conclusões finais sobre a colónia de bactérias que originou o surto, disse que os resultados podem surgir até à meia-noite.
E quando não há Legionella o que faz Luís Serra, a restante equipa e o programa de georreferenciação? “Os diferentes tipos de doenças têm diferentes distribuições geográficas, pelo que é importante estudarmos essas localizações para podermos dizer que aqui há uma determinada doença e que as pessoas devem, por exemplo, consumir menos sal”, simplifica o especialista. Na prática, é com ajuda destes programas que se identificam tendências em termos de doenças e de assimetrias geográficas que permitem “fazer campanhas de sensibilização e traçar medidas” que vão ao encontro dos programas prioritários que a Direcção-Geral da Saúde definiu e que vão de áreas como a diabetes, às doenças cerebrovasculares ou mesmo à saúde mental.