Animação independente conquista espaço no caminho para os Óscares
A produtora de Toy Story, a Pixar, pela primeira vez nos últimos anos não surge na pré-selecção recentemente anunciada pela Academia de Holywwod.
Esta é a principal novidade na lista de 20 produções anunciada recentemente pela Academia, de onde sairão – a manter-se a tendência dos últimos três anos – os cinco nomeados para as estatuetas que serão conhecidas a 15 de Janeiro, estando a cerimónia da entrega marcada para o dia 22 de Fevereiro, no Dolby Theatre de Los Angeles.
A ausência da produtora de Toy Story 3 – vencedor do Óscar em 2011 e que se tornou no maior êxito de bilheteira de sempre no cinema de animação – decorre da inexistência de qualquer produção nova no corrente ano. Mas tal não significa que as majors americanas estejam fora da corrida aos Óscares de 2015.
A Walt Disney está representada por filmes que já correram ou estão a chegar às salas portuguesas, como Aviões – Equipa de Resgate, Sininho – Fadas e Piratas, ou Os Novos Heróis, este com estreia nacional agendada para dia 18 de Dezembro. Outros grandes estúdios confirmam a supremacia da indústria americana no sector através de produções da DreamWorks (Como Treinares o teu Dragão 2, Mr. Peabody & Sherman, ou Penguins of Madagascar – este também a estrear brevemente entre nós, a 4 de Dezembro), da Warner Brothers (O Filme Lego) ou da Twenty Century Fox (Rio 2).
Mas o que se apresenta como especialmente relevante na pré-selecção agora divulgada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood é o lugar que, lentamente, vão aí conquistando os produtores e animadores independentes. O caso mais notório, mas sem surpresa para quem acompanha a arte da animação, é a presença do realizador Bill Plympton – em cujo estúdio tem sido animada a série Os Simpsons –, que tem a particularidade de estar citado simultaneamente na pré-selecção das longas e das curtas-metragens, respectivamente com Cheatin’ (filme que teve um orçamento pouco superior a 400 mil euros, e arrecadou o Prémio Especial do Júri do último Festival de Animação de Annecy), e Footprints.
“Em ocasiões anteriores, os Óscares já mostraram, com as suas nomeações, que também valorizam os filmes realizados fora dos grandes estúdios”, disse Bill Plympton, citado pelo jornal El País, a comentar a lista da pré-selecção. O realizador de Your Face (1987) e Guard Dog (2004) já tinha, de resto, visto o seu trabalho atendido pela Academia de Hollywood com nomeações para estas suas duas curtas-metragens.
Bill Plympton visitou já diversas vezes Portugal, onde a sua obra tem vindo a ser divulgada em diferentes ecrãs: em 2010, esteve a ensinar a fazer animação low-cost no festival Monstra, em Lisboa; antes, tinha vencido, com a longa-metragem Idiots and Angels, os prémios principais no Cinanima (2008), em Espinho, e no Fantasporto (2009).
Guillermo del Toro produtor de animação
Também com sede nos Estados Unidos, neste caso no Texas, está outra produtora independente, a Reel F/X, do conhecido realizador mexicano Guillermo del Toro (O Labirinto do Fauno). Deste estúdio, que conta também com o apoio da Fox, saiu O Livro da Vida, realizado pelo seu conterrâneo Jorge Gutiérrez, e recém-estreado nas salas americanas.
Reel F/X é um estúdio especializado em efeitos especiais, mas que tem também apostado na animação digital. Falando ao El País sobre O Livro da Vida, Gutiérrez disse que, como independente, tem conseguido “manter o controlo criativo, algo que não podia fazer dentro da indústria americana”.
Outro estúdio emergente que volta ser contemplado pela Academia de Hollywood – depois da nomeação, em 2010, de Coraline - A Handmade Fairy Tale – é o Laika, de Travis Knight (filho do fundador da empresa Nike, Phil Knight). Com uma carteira que não chega ainda à dezena de produções, o Laika está agora na pré-lista dos Óscares com Os Monstros das Caixas, uma animação em 3D e stop-motion realizada por Graham Annable e Anthony Stacchi (actualmente em exibição nas salas portuguesas).
E há ainda filmes que transportam para a América imaginários de outros mundos, como a animação de contos tradicionais da Irlanda e do Japão, respectivamente com a co-produção europeia Song of the Sea, do irlandês Tomm Moore, ou The Tale of Princess Kaguya, do japonês Isao Takahata, este contando com vozes de actores americanos como James Caan, Mary Steenburgen ou a jovem “princesa” Chloë Grace Moretz (que encarnou o remake do clássico de terror, Carrie).
Para além de estéticas exteriores à produção mainstream americana, a lista agora apresentada pela Academia de Hollywood – que, tanto nas longas como nas curtas-metragens, ressalva ainda o facto de alguns dos filmes citados terem de cumprir a exigência de serem exibidos em Los Angeles até final do ano – significa também a abertura da animação contemporânea a temas e linguagens que vão para além do público infantil. E aqui a produção da Pixar, com títulos como as séries Toy Story mas também Carros ou o tão aclamado Os Super-Heróis (The Incredibles, de Brad Bird, 2004), marcou significativamente a última década e o renascimento da arte da animação de longa-metragem – que, de resto, só a partir deste século é que teve direito a uma categoria própria nos Óscares, sendo Shrek o primeiro vencedor, em 2002.
Apesar da distância a que nos encontramos, tanto das nomeações como da decisão final a 22 de Fevereiro, os media americanos começaram já a fazer as contas, e na lista de favoritos aparecem, sem surpresa, as produções das majors, com Os Novos Heróis, O Filme Lego ou Como Treinares o teu Dragão 2, logo seguidos de Os Monstros das Caixas e do irlandês Song of the Sea...
De fora desta história está, naturalmente, a animação portuguesa, cuja história conta ainda apenas um título de longa-metragem: Até ao Tecto do Mundo (2008), uma realização colectiva do Cineclube de Avanca assinada por António Costa Valente, Vítor Lopes e Carlos Silva; ou duas, se incluirmos aqui a co-produção com a Galiza Sonho de uma Noite de São João (2005), que Manolo Gómez realizou para a Dygra Filmes (Corunha) e a APPIA Filmes (Espinho).
Bem mais próximo de chegar aos Óscares esteve a animação de curta-metragem, que teve, no ano passado, um português na lista dos nomeados, Daniel Sousa, com Feral; e, em 2006, com História Trágica com Final Feliz, de Regina Pessoa, que esteve à porta de aí chegar ao integrar a shortlist de dez filmes seleccionados.